O Globo, n. 32029, 16/04/2021, País, p. 4

 

De volta ao páreo

André de Souza

Renata Mariz

16/04/2021

 

 

Por oito votos a três, o Supremo Tribunal Federal (STF) decretou ontem a anulação das condenações do ex-presidente Lula na Lava-Jato, confirmando decisão do ministro Edson Fachin, para quem a 13ª Vara Federal de Curitiba não tinha competência para julgar quatro processos em que o petista é alvo. A maioria entendeu que as ações penais não têm relação com os desvios da Petrobras, foco da operação. A anulação das condenações de Lula permite que ele se candidate nas eleições de 2022.

A Corte analisa na próxima semana mais dois temas pendentes sobre o caso. Os ministros decidirão se os processos vão para a Justiça Federal de Brasília, como definiu Fachin, ou se o foro adequado é em São Paulo, como sugeriu ontem o ministro Alexandre de Moraes. E o principal debate será sobre a manutenção ou não da decisão da Segunda Turma que considerou o ex-juiz Sergio Moro parcial no caso do tríplex do Guarujá (SP), o que faria com que essa ação começasse do zero, sema possibilidade de o futuro juiz aproveitar partes da investigação feita em Curitiba, algo que Fachin permitia em sua decisão.

O julgamento tem como base recurso da Procuradoria Geralda República contra a anulação das condenações determinada por Fachin. Em seu voto, o relator rejeitou o questionamento da PGR destacando que, desde o início da Lava-Jato, o STF foi definindo parâmetros sobre a competência da 13ª Vara Federal.

Em 2015, ficou decidido, como frisou Fachin, que “nenhum órgão jurisdicional pode se arvorar de juízo universal de todo e qualquer crime relacionado a desvio de verbas para fins político-partidários, à revelia das regras de competência”, com a realização dos primeiros deslocamentos de casos para outros estados. Restringiu-se, então, para a 13ª Vara Federal, apenas os casos “relacionados a ilícitos praticados em detrimento da Petrobras”

— A denúncia não atribui específica e expressamente ao paciente (Lula) uma relação de causa e efeito entre a sua atuação como presidente da República e determinada contratação realizada pelo Grupo OAS com a Petrobras, em decorrência da qual se tenha acertado o pagamento da vantagem indevida —destacou Fachin.

Ele sustenta que a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba deve ser estendida, conforme sua decisão, aos outros três processos lá julgados, além do tríplex do Guarujá: o do do sítio de Atibaia e duas ações relacionadas ao Instituto Lula, devido às semelhanças entre eles. O ministro Kassio Nunes Marques abriu a divergência.

Ele elencou uma série dedados da denúncia que relataram atos de corrupção confessados por empreiteiros, sobre tudo Leo Pinheiro, da OAS, dos quais teriam saído os recursos para pagar vantagens indevidas a Lula. Um dos contratos fraudados, frisou o ministro, foi firmado na região metropolitana de Curitiba: do consórcio Conpar, para obras de construção da refinaria Presidente Getulio Vargas.

Nunes criticou a anulação integral do processo, “após mais de cinco anos de seu início” eque“já foi julgado em várias instâncias”, inclusive pelo próprio STF. Para ele, a decisão dá ao caso “uma dimensão jamais vista em âmbito jurisprudencial”.

— A preservação dos atos decisórios ou no mínimo das provas produzidas seria o razoável ase fazerem caso de ser adotada tal solução — disse Nunes.

DIVERGÊNCIA SOBRE O FORO

Alexandre Moraes concordou com Fachin que os processos não devem ficar em Curitiba por não haver relação com os desvios na Petrobras. Mas discordou demandá-los para Brasília. Segundo ele, são fatos ocorridos em São Paulo.

— O que se colocou em todas as denúncias é que várias empresas, notadamente Petrobras, mas também OAS, Odebrecht tinham caixinha para corrupção. Algo genérico, sem ligação acasos específicos, se denunciou o ex presidente—disse Moraes.

Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia acompanharam Fachin quanto à incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba, mas pretendem debater qual destino o processo deve ter. Já a ministra Rosa Weber acompanhou Fachin integralmente, assim como Luís Roberto Barroso.

Último a votar, Fux tentou refutara preocupação de que a decisão pode ter reflexo em outros processos da Lava-Jato. Barroso também opinou que era uma questão pontual.

—Essa decisão não derruba a Operação Lava-Jato. É uma decisão específica sobre os casos a que ela se refere —disse Fux.

Após o julgamento, a defesa de Lula informou, em nota, que a decisão “restabelece a segurança jurídica e a credibilidade do sistema de Justiça do nosso país”. O ex juiz Sergio Moro e os integrantes da antiga força-tarefa da Lava-Jato de Curitiba não se pronunciaram.