O Globo, n. 32030, 17/04/2021, País, p. 6

 

Base bolsonarista intensifica ataques contra governadores

Marlen Couto

17/04/2021

 

 

Em meio ao crescente embate entre o presidente Jair Bolsonaro e governadores, por discordâncias no enfrentamento à pandemia e em relação à atuação da CPI recém-instalada no Senado, a base de apoio ao governo nas redes sociais intensificou os ataques contra os gestores estaduais em plataformas como o YouTube e o Telegram.
Em março, canais bolsonaristas no YouTube publicaram 528 vídeos citando ou atacando governadores, o maior número desde o início da crise sanitária — o volume é 48% superior ao de abril de 2020, mês que tinha o recorde anterior. De acordo o levantamento da Novelo Data, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), adversário de Bolsonaro, foi o principal alvo.
— Sempre que a curva de infecções cresce, a máquina bolsonarista vira o canhão para os governadores. Uma das estratégias mais repetidas é a falsa afirmação de que Bolsonaro foi proibido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de agir — explica Guilherme Felitti, fundador da Novelo Data, em referência à decisão em que a Corte determinou que União, estados e municípios têm atribuição de impor medidas para controlar a pandemia.
Na última semana, o presidente Jair Bolsonaro pressionou senadores a incluir no âmbito da CPI a atuação de governadores e prefeitos. Como o Senado não pode investigar o Executivo estadual e municipal, seus aliados na Casa conseguiram apenas que os repasses do governo federal aos governos locais entrassem no foco da CPI.
O laboratório NetLab, vinculado à UFRJ, identificou, em março e abril, aumento de mensagens sobre os governadores em 1.200 grupos no Telegram. Entre março e dezembro de 2020, foram 24 mil mensagens com menções a eles. Só entre 1º de janeiro e a última terça-feira, foram 73 mil. Os grupos não incluem apenas bolsonaristas, e os dados podem indicar circulação de mensagens para além da bolha de apoio ao presidente. No WhatsApp, o compartilhamento de ataques a governadores foi ligeiramente maior nos últimos meses. Uma mensagem entre as mais difundidas reproduz a publicação em que Bolsonaro tratou de repasses federais a estados e municípios, inflando os números — gastos relativos ao enfrentamento à Covid-19 foram misturados com transferências constitucionais obrigatórias.
— Boa parte das mensagens com links nesses grupos direcionam para sites de desinformação e canais bolsonaristas no YouTube. É uma forma importante de financiamento para esses sites — pontua Rose Marie Santini, coordenadora do NetLab.
Nas últimas semanas, o Fato ou Fake, serviço de checagem do Grupo Globo, identificou 13 boatos sobre governadores. Um deles afirma que uma lei sancionada por Bolsonaro permite processar governadores e prefeitos por medidas de restrição contra a Covid-19 — a legislação, no entanto, trata da criminalização do stalking, a perseguição obsessiva.
Para Flávio Dino, governador do Maranhão, o objetivo é debilitar os governadores.
— Quanto mais o Bolsonaro se enfraquece, mais usa fake news. Todos os governadores são alvos. Uma resposta coletiva é mais eficaz, também no que se refere a ações judiciais.