Correio Braziliense, n. 21.143, 14/04/2021. Cidades, p. 15

 

Cuidados pós-vacina evitam mais contágio

Pedro Marra

14/04/2021

 

 

CORONAVÍRUS » Imunizantes disponíveis no país impedem que população atendida desenvolva quadro grave da covid-19 caso contraia o vírus. Para prevenir mais infecções e proteger quem não recebeu as duas doses, especialistas reforçam necessidade de seguir orientações

Mesmo com quase 333 mil pessoas que receberam a primeira dose das vacinas contra a covid-19, e 109 mil que tomaram o reforço, o Distrito Federal continua a acumular casos e mortes pela doença. No entanto, sem os imunizantes, a situação seria ainda mais grave. Os tipos disponíveis no Brasil têm efeitos diferentes quanto à proteção do organismo (leia CoronaVac x Covishield). Em geral, as pessoas que receberam as duas doses podem até contrair o novo coronavírus — e, consequentemente, transmiti-lo —, mas não desenvolvem quadro grave da doença. Para evitar que mais indivíduos se infectem e, eventualmente, passem o vírus para os demais, especialistas em saúde reforçam que, mesmo após a vacinação, a população não deve se descuidar das medidas de segurança.

O epidemiologista Mauro Sánchez, da Universidade de Brasília (UnB), comenta o efeito dominó que pessoas vacinadas podem causar se relaxarem com relação às orientações contra a covid-19. "Elas têm de continuar a se cuidar, mesmo depois de vacinadas com a primeira ou segunda dose. Depois da vacina, a pessoa usa máscara mais para proteger os outros do que ela mesma, pois tem chance praticamente nula de desenvolver uma forma grave da doença", explica. "Há chance para uma forma leve ou assintomática. Por isso, uma pessoa vacinada que não toma as precauções recomendadas pode transmitir, eventualmente, para uma pessoa não vacinada e que não está protegida contra formas graves da doença", alerta.

Técnica de enfermagem do Hospital Regional da Asa Norte (Hran), Janine Araújo Montefusco Vale, 41 anos, é chefe do Núcleo de Segurança e atua no setor de terapia intensiva (UTI) da unidade. Lá, tem contato direto com pacientes infectados pelo novo coronavírus. Em 26 de janeiro, Janine tomou a primeira dose e, em 12 de fevereiro, a segunda. Contudo, no último dia 26, ela teve de pedir licença do trabalho, após apresentar sintomas da covid-19.

Janine teve dores de cabeça, coriza e congestão nasal. "Fiz o exame RT-PCR (com coleta de amostra das vias aéreas) quando comecei a sentir os sintomas. No sábado e no domingo, tive febre, calafrios, mal-estar e dor no corpo. O resultado positivo saiu no domingo. Como senti muita dor nas pernas, o médico até suspeitou de trombose. Fiz um exame de imagem, mas não havia nada de anormal. Precisei usar anticoagulante na quarentena e tive muita dor nas costas, além de perda do olfato e do paladar", relata a moradora do Riacho Fundo 1. "Por isso, é importante ter acompanhamento médico, para não sair tomando qualquer coisa. As pessoas te ligam e falam para tomam isso ou aquilo. Imagina quem não tem informação e não consegue se tratar", completa.

Sem sintomas
Outra pessoa que passou por situação semelhante foi Rosulina da Silva Ramalho, 55. Técnica de enfermagem no Hran há 21 anos e enfermeira na Unidade Básica de Saúde (UBS) nº 1 da Asa Sul, ela tomou as doses da vacina em 19 de janeiro e em 9 de fevereiro. Em 5 de março, após fazer um teste RT-PCR, recebeu resultado negativo. Uma semana depois, descobriu que havia se infectado, mas não havia apresentado qualquer sinal. "Eu só soube (do resultado positivo) no fim do mês, mas tinha passado 14 dias em quarentena, porque estava de férias. Eu não estava com sintoma algum. Não fui afastada do trabalho e não precisei de medicamentos. Fiquei sabendo porque me ligaram de um projeto que fiz em parceria com a UnB (Universidade de Brasília). Era preciso fazer exame para participar, e eles me informaram que testei positivo", conta.

A enfermeira Ana Paula Sathler Bueno, 34, trabalha há um ano na emergência do Hospital Sírio-Libanês e também tomou as duas doses da vacina. Porém, contraiu a covid-19 do marido, que havia viajado para Goiânia. "Ele veio para Brasília e começou a sentir sintomas por dois dias. Ficou com moleza no corpo e indisposição. Fiz o RT-PCR e recebi o resultado positivo dois dias depois. Por cinco dias, perdi o olfato, tive dor de cabeça e tosse. Mas me recuperei", relata.

O caso de Severino José dos Santos, 81, morador de Valparaíso (GO), foi mais grave. Ele havia tomado a primeira dose, mas, devido a visitas a hospitais para consultas de rotina, acabou infectado antes de tomar a segunda dose. Em 21 de fevereiro, ele morreu por causa da covid-19. Neta dele, a recepcionista Hevylaine Conde, 31, conta que o avô passou a semana bem, mas piorou nos dias seguintes à infecção. "Ele começou a ter sintomas gripais, coriza e espirro. No fim da tarde, deu febre. Depois, ele teve uma febre muito alta", conta.

A família chegou a pensar que os sintomas fossem efeitos da primeira dose da vacina. No entanto, a equipe de saúde do Centro de Atendimento Integrado à Saúde (Cais) de Valparaíso 2, para onde Severino José foi levado, descartou possibilidade de reação ao imunizante. O paciente foi transferido para o Hospital Regional de Santa Maria (HRSM), mas recebeu resultado positivo para covid-19. Severino não resistiu ao quadro infeccioso e morreu.

Questionada pela reportagem sobre quantas pessoas vacinadas se infectaram com a covid-19 no Distrito Federal e quantas precisaram ser hospitalizadas, a Secretaria de Saúde (SES-DF) informou que não dispõe desse levantamento.

» Colaboraram Ana Isabel Mansur e Samara Schwingel