Título: Obra sob suspeita em Cabo Frio
Autor: Paulo Celso Pereira
Fonte: Jornal do Brasil, 05/02/2005, País, p. A5

Ministério Público descobre 70 pessoas em condições análogas à escravidão e interrompe construção do Fórum da cidade A obra do novo Fórum da comarca de Cabo Frio, que começou no ano passado e estava prevista para terminar ainda este ano, vinha sendo feita por 70 trabalhadores em condições análogas à escravidão. O Ministério Público descobriu a irregularidade depois de uma denúncia da Delegacia Regional do Trabalho, que investigava o caso desde dezembro.

Na terça-feira, a procuradora do Ministério Público do Trabalho Guadalupe Louro Couto foi ao local da obra e constatou várias irregularidades. Segundo a promotora, os funcionários, que haviam sido contratados na Bahia, em Minas Gerais e em São Paulo, estavam em condições degradantes.

- Eles ficavam em um cubículo sem ventilação. Usavam um banheiro, com apenas três vasos e dois chuveiros para 70 homens. Além disso, não tinham água potável. Por isso nós interditamos - explicou a procuradora.

A obra foi contratada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro à empresa Politec Construções, que subcontratou o serviço à Avelino Construções, responsável pelas supostas irregularidades.

Após a interdição de terça-feira, a Avelino assinou um termo de compromisso de ajustamento de conduta no qual se comprometeu a pagar salários, verbas rescisórias e passagens de volta de 36 trabalhadores, numa soma de R$ 139 mil. Pagaria também os salários dos outros 34 que haviam decidido ficar, e os colocaria em pousadas até que fossem providenciados locais adequados.

Apesar disso, o procurador do MP Fábio Luís Vianna Mendes voltou ontem ao local e as regras não haviam sido cumpridas. Segundo ele, os trabalhadores foram transferidos de pousadas para uma casa em condições piores às do alojamento. As irregularidades eram ainda maiores:

- Eles trabalhavam das 8h às 3h e dormiam em condições precárias. O acordo previa multa R$ 5 mil a cada infração contra cada trabalhador. Agora vamos tentar resolver o problema do alojamento e terei de entrar com uma ação de execução para cobrar esses valores, para que se sintam coagidos e parem de cometer as infrações.

Por meio da assessoria, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro informou que o juiz auxiliar da presidência, André Uchôa, já tomou conhecimento do caso e foi duas vezes a Cabo Frio acompanhado de uma comissão do tribunal. Notificou a empresa e exigiu que ela cumprisse a legislação vigente.

- A empresa ganhou a concorrência e, até o momento, vinha fazendo o trabalho atendendo a todas as exigências. A obra vai ficar parada até que sejam apuradas as irregularidades. Se forem constatadas, a empresa será afastada imediatamente e será aberta outra licitação - explicou a assessoria do tribunal.

Guadalupe Louro afirma que o Tribunal de Justiça deveria ter fiscalizado a situação da obra.

- O TJ tem culpa na vigilância do contrato. Eles não fiscalizaram o pagamento do salário e o depósito do FGTS, por isso, são responsabilizados subsidiariamente. Se nem a Avelino nem a Paulitec pagarem, é o TJ que terá de pagar. Acredito, no entanto, que isso não ocorra porque as contas correntes das duas empresas já estão bloqueadas e só serão desbloqueadas após o pagamento.

O Jornal do Brasil procurou representantes da Paulitec e da Avelino. Em ambas, foi informado de que os responsáveis não estavam presentes, mas retornariam a ligação. Até a noite de ontem, nenhum deles havia entrado em contato.