O Estado de São Paulo, n. 46465, 04/01/2021. Economia, p. B1

 

Com juros baixos e oferta de crédito, setor imobiliário fecha 2020 em alta

Douglas Gavras 

04/01/2021

 

 

Casa própria. Apesar da crise econômica, as operações de financiamento fechadas entre janeiro e novembro com recursos da poupança somaram R$ 106,5 bi, o melhor resultado desde 2014; só na cidade de São Paulo, a venda de imóveis novos registrou aumento de 13,1%

O ano que mudou padrões de consumo, fez o desemprego bater recorde e colocou a maior parte dos setores da economia em suspenso terminou melhor do que o esperado para o mercado imobiliário. Após um segundo trimestre de fortes incertezas, cancelamento de lançamentos e expectativa de queda nas vendas, o segmento chegou ao final de 2020 com números surpreendentes. De janeiro a novembro, as operações de financiamento contratadas com recursos da caderneta de poupança somaram R$ 106,5 bilhões. O valor mostra um aumento de 52% em relação ao mesmo período do ano anterior e é o melhor resultado desde 2014.

Na cidade de São Paulo, as vendas de imóveis novos no acumulado em 12 meses até outubro chegaram a 51,2 mil unidades, um crescimento de 13,1% em relação ao mesmo período de 2019. A expectativa inicial do Secovi-sp, o sindicato da habitação, era fechar o ano inteiro com uma venda de pelo menos 50 mil unidades, o que repetiria o resultado de 2019.

Os juros em um patamar historicamente baixo – o que se reflete em taxas de financiamento mais atrativas e estimula mais brasileiros a se voltarem para os imóveis como opção de investimento – e os recordes de captação na poupança durante a pandemia (irrigando a maior fonte de recursos para os bancos financiarem a casa própria) foram fatores que ajudaram a segurar o fôlego do setor no segundo semestre, apesar da crise.

Foi uma surpresa positiva, dado o cenário difícil do ano passado, avalia a presidente da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), Cristiane Portella. "Os juros estão em um patamar que nunca estiveram, em torno de 6,9% para o financiamento. Em 2017, a média era de 11,4%, em um contrato de 35 anos. A prestação chegou a se reduzir em 30% e muito mais gente ficou elegível para comprar um imóvel. Novas formas de indexação do financiamento, como as taxas prefixadas, trouxeram um leque maior para o consumidor", afirma Cristiane.

Segundo ela, quem não foi diretamente impactado pela pandemia manteve os planos, parou de gastar em outras coisas e passou a valorizar o estar em casa, seja para trabalhar ou lazer. "Em 2020, a gente viu uma valorização do espaço e do ambiente em que se mora", diz.

Fonte de recursos. Com as medidas de compensação de perda de renda durante a pandemia e a chamada poupança por precaução, a captação líquida da caderneta de poupança inundou a principal fonte de recursos para financiamento para a classe média, pelo Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE). De janeiro a novembro, a captação da poupança somou R$ 109,4 bilhões – volume recorde desde o Plano Real e que, desde a pandemia, só ficou negativo em novembro, quando saíram mais recursos do que entraram.

A perspectiva para 2021, no entanto, é que a captação caia, conforme a economia ainda demore a engrenar e os brasileiros gastem os recursos poupados durante o pior da crise.

Mas, ainda que o Banco Central entre em um novo ciclo de alta dos juros neste ano, não são esperados aumentos prejudiciais para o setor, diz o presidente do Secovi-sp, Basílio Jafet. "Há um ano, os juros estavam em cerca de 4,5% ao ano, caíram para 2%, mas a queda do juro do financiamento foi menor. A expectativa é que o crédito imobiliário se mantenha em 2021."

Negócio fechado

13,1%

é o porcentual de aumento nas vendas de imóveis novos só na cidade de São Paulo no acumulado dos últimos 12 meses até outubro, na comparação com o mesmo período de 2019. Pelos dados compilados pelo Secovi, foram negociadas 51,2 mil unidades    

PARA LEMBRAR

Os cancelamentos de vendas de imóveis negociados na planta – os chamados distratos – oscilaram pouco ao longo de 2020, apesar da crise econômica provocada pela pandemia. As rescisões representaram 14,8% das vendas no primeiro trimestre e chegaram ao pico de 18,3% no segundo trimestre, auge da quarentena. Depois disso, recuaram para 16,4%, no terceiro período, e caíram para 13,7% em outubro. Os números apontam para um mercado praticamente estável na comparação com 2019, quando os distratos ficaram entre 14% e 17% das vendas totais.