Título: Calamidade no Souza Aguiar
Autor: Gustavo de Almeida e Waleska Borges
Fonte: Jornal do Brasil, 05/02/2005, Rio, p. A12

Depois de sair de uma ambulância, um doente com o corpo queimado é levado por vigilantes numa maca sem colchão. Pacientes com fratura são recusados, mandados para outros hospitais. As cenas se repetem. Bastaram poucas horas na emergência do Hospital Souza Aguiar, na manhã de ontem, para uma vistoria constatar a situação calamitosa da unidade. Nas vésperas do carnaval, no hospital referência do Sambódromo, ainda faltam medicamentos básicos, entre eles analgésico e antiinflamatórios. Preocupados com os atendimentos durante o feriado, quando a procura nas emergências aumenta em 40%, representantes da classe médica vistoriaram o Souza Aguiar. A visita surpreendeu: faltam roupas de cama, seringas, medicamentos, sondas, fraldas geriátricas. E havia equipamentos quebrados e salas superlotadas.

- Na sala de emergência para os homens há 56 pessoas, quando a capacidade é de 17. No CTI dos adultos, os casacos dos médicos servem como lençol - relata o deputado Paulo Pinheiro (PT), da Comissão de Saúde da Alerj.

Na vistoria, os representantes também constataram a precariedade dos equipamentos. No setor de hemodiálise, o ar-condicionado não funciona. Na UTI infantil, um dos dois leitos está interditado por vazamento. Foram encontradas receitas médicas prescritas em papel de pão.

Antes de iniciar a vistoria, Paulo Pinheiro foi procurado por um pai aflito. O ambulante Michel Santana queria socorro para a filha Ana, de 7 anos. A menina machucou o braço com um ferro. Na portaria do hospital, Michel foi informado de que o raio X não funcionava. Houve interferência, a criança foi atendida, mas não fez o exame nem recebeu os remédios.

A menina foi levada por um carro da Alerj para o Hospital dos Servidores, onde fez a radiografia. Na madrugada, vítimas de acidentes nas proximidades do Souza Aguiar foram levadas para o Miguel Couto. Segundo bombeiros que transportavam doentes na manhã de ontem, a orientação era encaminhar pessoas com fraturas para o Miguel Couto.

Segundo Paulo Pinheiro, apesar de a direção do hospital garantir que dois raios X estavam funcionando, até as 14h os aparelhos não eram usados.

A Secretaria Municipal de Saúde informa, entretanto, que os aparelhos estavam atendendo os pacientes internados. O relatório com as constatações da vistoria foi enviado ao Ministério Público. O coordenador do 6º Centro de Apoio Operacional de Tutela Coletiva, Luciano Mattos, prometeu notificar, ainda ontem, o Souza Aguiar e o secretário de Saúde, Ronaldo Cezar Coelho. Eles poderão responder civil e criminalmente, caso ocorra alguma irregularidade no carnaval.

- Isso é tudo politicagem. Quem vai procurar o Ministério Público não pergunta pelos hospitais estaduais, não pergunta pelos hospitais federais que foram fechados. Esta responsabilização é uma letra morta. Nós fomos responsáveis no réveillon, seremos no carnaval - rebateu Ronaldo Cezar.