Título: O debate sobre o teto
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 07/03/2005, Opinião, p. A10

O próprio presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Nelson Jobim, reconhece ter ficado desgastado por participar de reuniões com líderes políticos do Congresso, nas residências dos presidentes da Câmara e do Senado, a fim de tratar do subsídio de seus pares. O vencimento dos ministros do STF é uma referência constitucional - como teto salarial de todos os servidores e agentes públicos - para qualquer eventual nivelamento dos subsídios dos parlamentares ao dos integrantes da Corte Suprema. A versão corrente foi a de que o ministro Jobim - refletindo a vontade de seus colegas do Judiciário - estaria buscando uma ''fórmula'' para viabilizar, juridicamente, a promessa de campanha do presidente da Câmara, deputado Severino Cavalcanti (PP-PE), de promover um aumento imediato de 67% da remuneração dos congressistas, em boa hora abortada pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).

No mínimo, o presidente do STF, ex-parlamentar e constituinte de 1987-88, acabou por deixar-se enredar na teia da judicialização da política, tão combatida por ele mesmo e outras altas vozes do Judiciário.

Mas há males que vêm para bem, e o episódio pode servir para que aconteça, afinal, uma discussão séria sobre a adoção e o cumprimento do teto constitucional, adiado desde a promulgação da Emenda Constitucional nº 19/98.

Em sentido figurado, a palavra teto tem como sinônimo limite máximo. Mas quando se trata de salário, vencimento, subsídio, provento ou remuneração de servidores públicos, o substantivo passa a ter, no país em que a União é apelidada de ''Viúva'', a conotação de piso.

A Constituição determina que ''a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos integrantes de qualquer dos Poderes da União, dos estados, do Distrito Federal, dos municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos ministros do Supremo Tribunal Federal''.

Ou seja, os congressistas, como constituintes derivados, fixaram um teto - e não um piso - para os ganhos totais de qualquer servidor público.

O presidente do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim, enviou ao Congresso, em dezembro, dentro de sua competência, projeto de lei fixando em R$ 21.500 o vencimento máximo de ministro da mais alta corte do país (atualmente de R$ 19.115). E este é o teto - e não o piso - para todos os servidores de todos os Poderes e demais agentes políticos. Vale dizer, para congressistas, ministros de Estado e o próprio presidente da República.

O deputado Severino Cavalcanti prometera aumentar os vencimentos de seus colegas, invocando um decreto legislativo de 2002, de constitucionalidade duvidosa, segundo o qual até que seja fixado em lei o teto do funcionalismo público, ''a remuneração dos integrantes do Congresso corresponderá à maior remuneração recebida a qualquer título por ministro do STF''.

O que o Congresso tem de fazer é aprovar, rejeitar ou emendar o projeto de lei que fixa o teto constitucional, e que está lá desde dezembro. Se a maioria das duas Casas achar que o teto é muito alto, que diminua o seu valor. Se considerar que um ministro do Supremo deve receber, todo mês, R$ 21.500, tudo bem. O que não quer dizer que os parlamentares passem automaticamente a receber igual remuneração.

E os congressistas não podem deixar de reler o parágrafo 4º do artigo 39 da Carta Magna, que é bem claro: ''O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os ministros de Estado, e os secretários estaduais e municipais serão remunerados, exclusivamente, por subsídio fixo em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória.''