O Globo, n. 32040, 27/04/2021, Rio, p. 13

 

Câmara abre processo de cassação de Dr. Jairinho
Gilberto Porcidonio
Paolla Serra
27/04/2021

 

 

 

Os sete integrantes do Conselho de Ética da Câmara Municipal decidiram ontem, por unanimidade, pela representação que pode levar à cassação do mandato do Dr. Jairinho (sem partido), preso sob a acusação de ter matado seu enteado, Henry Borel, de 4 anos. O processo deve ser concluído em 70 dias.

— Nós analisamos os autos e chegamos a uma conclusão de forma unânime de que o conselho deve representar contra o vereador, obviamente respeitando todos os ritos, a ampla defesa e o contraditório — disse o vereador Luiz Ramos Filho (PMN), que tomou posse no conselho justamente no lugar deixado por Dr. Jairinho.

Presidente do conselho, o vereador Alexandre Isquierdo (DEM) destacou que o trecho do inquérito recebido pelo grupo, ainda não concluído pela polícia, já permite que seja formulada uma denúncia por quebra de decoro parlamentar.

—Nós estamos nos baseando na perícia, nas testemunhas e na própria atitude do vereador em tentar manipular algumas testemunhas. Tudo isso baseado nos autos. Isso já é suficiente para iniciarmos o processo de cassação —explicou Isquierdo.

PRAZOS SERÃO CUMPRIDOS

O vereador Chico Alencar (PSOL) afirmou que o processo vai seguir os prazos legais “com a firmeza que o respeito à representação popular exige”:

— Nós não vamos praticar corporativismo, protecionismo, protelação, nenhuma forma contemporização com essa situação dramática, terrível e  inaceitável para o Legislativo carioca.

Após analisar parte do inquérito, os vereadores do Conselho de Ética avaliaram que o decoro parlamentar foi quebrado, inclusive, por abuso de poder e tráfico de influência. Agora, a Mesa Diretora da Câmara terá três dias úteis para analisar o parecer da comissão, que depois será enviado para a Comissão de Justiça e Redação dar sua posição em cinco dias. Em seguida, o processo voltará para o Conselho de Ética, que vai ouvir o vereador e testemunhas. Em 45 dias, deve ser levado à votação pelo plenário. Dr. Jairinho só perderá o mandato se a cassação tiver dois terços do total de votos.

A Polícia Civil informou que vai indiciar o vereador e a companheira dele, Monique Medeiros da Costa e Silva, mãe de Henry, por homicídio duplamente qualificado. Os dois estão presos desde 8 de abril.

‘PEÇA DE FICÇÃO’

No domingo, o Fantástico, da TV Globo, mostrou uma carta de 29 páginas escrita por Monique, em que ela muda a versão apresentada à polícia. A mãe do menino afirmou que foi Jairinho quem encontrou Henry caído no chão do quarto na madrugada em que ele morreu, e não ela. A defesa da professora pediu ontem à polícia que a carta seja incluída no inquérito.

O advogado Braz Sant’Anna, que representa o médico e vereador, classificou a carta como “peça de ficção”. Ela também afirmou ter sido orientada a mentir sobre a morte do filho. Nas folhas, a professora descreveu uma rotina de agressões, humilhações e crises de ciúmes por parte do parlamentar.

—A carta é uma peça de ficção, que não encontra apoio algum nos elementos de prova carreados aos autos. Não há realidade no relato dela — afirmou o advogado.

Sant’Anna assumiu a defesa de Jairinho no último dia 19, depois de o advogado André França Barreto deixar o caso alegando querer evitar “conflito de interesse”. Ele representava os dois acusados desde o primeiro depoimento que prestaram, em 18 de março, mas Monique contratou o escritório de Thiago Minagé, Hugo Novais e Thaise Assad quatro dias após ser presa. A equipe pediu à polícia que Monique seja ouvida novamente pela 16ª DP (Barra), que ainda não informou se haverá outro depoimento. Os advogados dizem que a mãe de Henry escreveu a carta na última sexta-feira, no Hospital Penitenciário Hamilton Agostinho, no Complexo Penitenciário de Gericinó, onde recebe tratamento contra a Covid-19.