Título: Acordo mantém Mesa no poder
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Fonte: Jornal do Brasil, 09/03/2005, Internacional, p. A7

Antes da votação que rejeitou a renúncia do presidente, forças políticas se reuniram para costurar pacto de governabilidade

AFP Partidários do presidente boliviano se manifestam em La Paz, em frente ao Congresso, que deve rejeitar a renúncia de Mesa

LA PAZ - O Congresso da Bolívia rejeitou ontem à noite, por unanimidade, a renúncia apresentada pelo presidente Carlos Mesa na segunda-feira. O pedido foi negado sem debate e em duas instâncias, por aclamação e voto aberto, depois de longas horas de gestões políticas e acordos de bastidores. Em menos de cinco minutos de votação, os 157 parlamentares presentes ratificaram Mesa no comando da Bolívia. Tudo graças a um acordo de governabilidade assinado entre o presidente e a maioria das bancadas parlamentares. Após a votação, o presidente do Congresso boliviano, Hormando Vaca Diez, convidou Mesa, que se encontrava no Palácio Quemado, para comparecer ao Parlamento, onde proferiu um discurso.

¿ Continuarei a trabalhar com o Congresso. Quero que os bolivianos apóiem seu presidente ¿ disse Mesa.

Pouco antes, em reunião de três horas, o presidente chegara a um pré-acordo com as forças políticas representadas no Congresso para a implementação de um pacto social que alivie a crise na qual o país está atolado.

Mesa tem à frente quase dois anos de mandato. Nas imediações do Banco Central, onde ocorreu o encontro, assim como às portas do Congresso, milhares de pessoas se concentraram para manifestar apoio ao governante.

Político que não pertence a nenhum partido, Mesa havia entregue carta de renúncia declarando-se ¿no limite¿ de sua resistência ante uma onda de protestos sociais que pediam reforma na lei petrolífera, com altos impostos, e a convocação de uma assembléia constituinte, além do referendo sobre autonomias regionais.

Participaram da reunião antes da votação da renúncia no Congresso representantes do Movimento ao Socialismo (MAS), comandado pelo líder cocaleiro Evo Morales, o principal organizador dos protestos.

A notícia foi divulgada após uma reunião de três horas, que atrasou o início da sessão no Parlamento, convocada para debater a renúncia de Mesa.

Dirigentes indígenas também pediram que Mesa reavaliasse a decisão de deixar a presidência, por sentir-se frustrado pelas manifestações de rua e pelos bloqueios às estradas, organizados para pressionar a aprovação da Lei de Hidrocarbonetos e a convocação de uma Assembléia Constituinte.

¿ A presidência de Mesa é um mal necessário ¿ afirmou Roberto de la Cruz, um líder político local. ¿ Se ele renunciasse, seria desastroso para nossos movimentos sociais.

¿ Ele tem que continuar no governo, para cumprir as promessas que fez ¿ declarou Evo Morales, que é deputado.

Hormando Vaca Diez, presidente do Senado e eventual sucessor do presidente, dizia de manhã que ¿Carlos Mesa será líder até 2007¿. À tarde, antes da sessão parlamentar, Diez se reuniu com o presidente da Câmaras de Deputados e com os chefes de grupos parlamentares, para avaliar o pacto social que garantiria a governabilidade.

Na segunda-feira, Diez havia se encontrado com o ministro da Presidência e revelou a existência de ¿uma tendência a repelir a renúncia¿.

Todas as reuniões serviram ainda para analisar o apoio que Mesa pode receber a sua gestão e, em particular, ao projeto de Lei de Hidrocarbonetos. A legislação foi apresentada ao Congresso, mas a Câmara dos Deputados enviou emendas contrárias à posição governamental.

Pelo menos 26 empresas estrangeiras, entre elas a Petrobras, Total, British Gas, Exxon Mobil e Repsol podem ter os contratos na Bolívia cancelados se a nova lei, defendida pela oposição, for aprovada.

O chefe do Movimento da Esquerda Revolucionária (partido MIR, de centro-direita) o ex-presidente Jaime Paz Zamora, confirmou que o debate sobre a relação com o capital estrangeiro era importante na decisão de Mesa de continuar no governo.

¿ Se quisermos chegar a um acordo, temos que analisar um só tema: que tratamento os bolivianos darão ao investimento estrangeiro? ¿ perguntou.