Valor Econômico, n. 5228, 14/04/2021. Política, p. A7

 

Maioria de integrantes de CPI deve ser desfavorável ao governo
Renan Truffi
Marcelo Ribeiro
14/04/2021

 

 

 

Por determinação do Supremo Tribunal Federal (STF), o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), leu ontem em plenário o requerimento que cria a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da pandemia. Pressionado, Pacheco unificou os dois pedidos de CPIs que tramitavam na Casa. As investigações não ficarão restritas ao governo federal, mas governadores e prefeitos só serão investigados no uso de verbas federais.

Ao deliberar sobre o assunto, Pacheco anunciou o apensamento dos dois requerimentos de CPIs sobre a pandemia que disputavam a preferência dos parlamentares. O primeiro era o do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que se restringe às responsabilidades da União. O segundo foi elaborado pelo senador Eduardo Girão (Podemos-CE), numa reação do Executivo, e buscava ampliar o escopo das investigações para cima das unidades da federação. O presidente do Senado decidiu limitar, no entanto, o foco do requerimento apresentado por Girão.

Em sua justificativa, Pacheco argumentou que o regimento interno do Senado impede que o Congresso apure matérias de competência constitucional dos Estados, Distrito Federal e municípios. “A comissão terá como objeto o constante do requerimento do senador Randolfe Rodrigues, acrescido do objeto do requerimento do senador Eduardo Girão, limitado apenas quanto à fiscalização dos recursos da União repassados aos demais entes federados”, explicou.

As primeiras indicações partidárias para a composição da CPI mostram um cenário desfavorável ao governo, mesmo que o Planalto consiga colocar um nome simpático no comando da comissão. Entre todas as indicações feitas pelos blocos até o momento apenas 4, de um total de 11, têm alguma identificação mais nítida com o governo. São eles Ciro Nogueira (PP-PI), Marcos Rogério (DEM-RO), Eduardo Girão e um senador do bloco Vanguarda, que ainda não definiu se irá indicar Jorginho Mello (PL-SC) ou Zequinha Marinho (PSC-PA). Os dois, no entanto, são vistos como governistas no Congresso.

Os outros sete nomes estão no campo da oposição ou se declaram como independentes. No caso da esquerda, são dois indicados: Humberto Costa (PT-PE) e Randolfe Rodrigues (Rede-AP). O PSDB e PSD também sugeriram nomes de senadores que rechaçam Bolsonaro, como Tasso Jereissati (PSDB-CE) e Otto Alencar (PSD-BA).

“São dois anos fazendo oposição a Bolsonaro. Discordo [dele] tanto na questão de políticas quanto nas pautas de costumes. Não tenho compromisso com erro, errou terá que pagar”, comentou o baiano.

Desta forma, o foco principal do colegiado continuará sendo possíveis omissões do governo Bolsonaro no enfrentamento à crise. A base do governo já começou a trabalhar para postergar e tumultuar as atividades da CPI. Ontem mesmo o líder do governo no Congresso Nacional, Eduardo Gomes (MDB-TO), apresentou uma questão de ordem para que o colegiado só possa funcionar quando seus integrantes estiverem vacinados contra a covid-19.

A regra valeria tanto para os senadores titulares e suplentes, como para servidores e depoentes. Na prática, a proposta empurra a abertura da CPI apenas para quando houver vacinação em massa no Brasil, algo que está previsto para acontecer próximo ao fim do ano. Pacheco não respondeu à questão de ordem.

Questionado, Gomes disse que formulou a sugestão “como senador” e não por interesse do Palácio do Planalto. A proposta do emedebista vai de encontro ao encaminhamento que deve ser dado hoje pelo STF, quando o plenário se reunirá para discutir a decisão monocrática do ministro Luís Roberto Barroso.

Como adiantou o Valor, o julgamento servirá para que magistrados possam “modular” a determinação feita ao Senado. Barroso não deve ser desautorizado.

Outra ofensiva do governo é em relação à presidência da CPI, que está sendo cobiçada pelo MDB. A legenda indicou os senadores Renan Calheiros (MDB-AL) e Eduardo Braga (MDB-AM) para ocupar as cadeiras da sigla e insiste no critério de proporcionalidade, que dá ao maior partido do Senado o direito de requisitar a presidência do colegiado.

Tanto Renan como Braga são considerados desafetos do governo federal. Renan é tratado como adversário desde o início do governo, quando postulou a presidência do Senado, e Braga passou a adotar uma postura mais crítica desde o recrudescimento da crise no Amazonas, seu berço eleitoral.

Por conta disso, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), tem atuado como “braço direito” da ministra da Secretaria de Governo Flávia Arruda (PL-DF), na articulação para esvaziar as chances de Calheiros assumir a presidência ou a relatoria da CPI. Lira e Renan são rivais políticos em Alagoas, curral de ambos.