Valor Econômico, n. 5230, 16/04/2021. Brasil, p. A2

 

Inflação em alta “alivia” Orçamento de 2022 e amplia teto em R$ 106 bi
Fabio Graner
Edna Simão
Mariana Ribeiro
16/04/2021

 

 

 

Enquanto corrói o poder de compra das famílias, a inflação elevada vai dar uma ajuda relevante para o governo poder gastar mais em pleno ano eleitoral. Segundo as projeções divulgadas ontem pelo governo no projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2022, o teto de gastos crescerá R$ 106,1 bilhões, mais que a soma do reajuste no limite constitucional de despesas feito nos últimos dois anos.

Isso ocorre porque o IPCA, índice de inflação que referencia a correção do teto, está projetado em 7,14% para os 12 meses a serem encerrados em junho deste ano, conforme a regra do teto.

Mesmo assim, a equipe econômica avalia que em relação ao tamanho da economia brasileira, o total de despesas (incluindo aquelas que podem ficar de fora do teto) vai cair, de 19,7% do PIB neste ano para 18,2% do PIB em 2022. Isso reflete um cenário de crescimento econômico de 3,2% para 2021 e 2,5% no próximo ano, conforme já estava indicado nas contas do Ministério da Economia divulgadas em março.

O PLDO é o texto que o governo é obrigado a enviar ao Congresso para subsidiar a elaboração do Orçamento, que tem que ser enviado até o fim de agosto de cada ano. Para tanto, pela lei essa proposta formalizada sempre no dia 15 de abril precisa ser aprovada até o recesso parlamentar de julho, o que com frequência não tem ocorrido.

O principal indicador do projeto é a meta de resultado primário. Conforme o Valor antecipou no início da semana, o objetivo para o ano eleitoral é um déficit primário de R$ 170,5 bilhões, uma significativa queda ante a estimativa de saldo negativo de R$ 247,1 bilhões para este ano, e que ainda corre risco de aumentar por causa de medidas para o combate à segunda onda da pandemia.

Esse alvo estabelecido para 2022 considera um volume de receita líquida (após a transferência a Estados e municípios) de R$ 1,45 trilhão, com alta de 7,8% sobre a atual projeção para os ingressos nos cofres federais em 2021. Esse desempenho mostra que a inflação mais alta também está favorecendo as contas públicas pelo lado da receita, já que o crescimento da economia não é tão intenso.

O PLDO também trouxe mudanças para evitar problemas na chamada “antevigência” do Orçamento, como está ocorrendo neste ano no qual a peça até agora não foi aprovada. A ideia é permitir a realização de mais gastos no início do ano eleitoral, inclusive em obras e nas estatais (ver mais na reportagem abaixo).

Mesmo com espaço maior de gastos em termos gerais, o orçamento livre para o governo alocar onde bem entende continua apertado. A estimativa para 2022 é de R$ 96,7 bilhões nas chamadas despesas discricionárias, praticamente o mesmo volume do projetado para este ano no relatório bimestral. Mas ao projetado para o ano que vem podem se somar outros R$ 16,9 bilhões de emendas parlamentares, que no PLDO entram como despesas obrigatórias, mas durante a execução passam a ser tratadas como discricionárias, conforme explicou o secretário de Orçamento Federal, George Soares.

O montante de despesas obrigatórias projetadas no PLDO é de 1,52 trilhão, o equivalente a 94% da despesa total estimada. Esse parâmetro é importante porque, acima de 95%, os gatilhos de contenção de despesas são acionados para o Executivo.

Dentro das despesas obrigatórias, o principal gasto é o com benefícios previdenciários, que estão calculados em R$ 762,9 bilhões para o ano que vem. “A despesa previdenciária parece superestimada para 2022 no PLDO”, apontou o diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI), Felipe Salto. “A projeção da IFI é R$ 741,8 bilhões. A inflação mais alta prevista para o INPC, no PLDO, em relação à projeção da IFI, explica apenas uma pequena parte da diferença. Dificilmente a Previdência ficará em valor tão elevado”, comentou.

Um dos motivos para o impasse no Orçamento, que até agora não foi sancionado, foi o que o governo chamou de subestimação de despesas obrigatórias, principalmente Previdência, pelo relator-geral da peça orçamentária de 2021, senador Marcio Bittar (MDB-AC). O secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues, que não permitiu perguntas sobre a crise do Orçamento de 2021, defendeu a projeção de despesas previdenciárias da LDO, dizendo que o governo age com conservadorismo e transparência em suas contas.

Waldery afirmou que o projeto encaminhando ontem demonstra o compromisso do governo com o processo de consolidação, embora ele mesmo tenha reconhecido que o país só deve voltar a ter superávits primários entre 2026 e 2027, um horizonte distante que ele disse que pode ser antecipado com medidas para “aumentar receita sem aumentar a carga tributária”, e outras iniciativas.