Título: Oposição radicaliza protestos
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Fonte: Jornal do Brasil, 10/03/2005, Internacional, p. A7

Sem dar trégua a Mesa, líderes firmam pacto contra o governo e fecham estradas que unem o país ao Chile e ao Peru

LA PAZ - Um dia depois de o presidente boliviano, Carlos Mesa, ser ratificado no poder pelo Congresso, organizações campesinas e cultivadores de coca radicalizaram os protestos, fechando as estradas que ligam a Bolívia ao Peru e ao Chile, assim como a principal rodovia do país. A ação foi resultado de um pacto da oposição firmado ontem entre Felipe Quispe, da Confederação Sindical Única de Trabalhadores Campesinos da Bolívia, o deputado cocalero Evo Morales, chefe do Movimiento ao Socialismo e o líder sindical Jaime Solares, da Central Trabalhista Boliviana.

O pacto, intitulado ''Pela Aliança Nacional'', é uma resposta ao acordo para manter Mesa no cargo e tem como meta combater ''a oligarquia e as transnacionais que o presidente representa''. Mesa promete manter os contratos com as empresas estrangeiras com a nova lei para os hidrocarbonetos (petróleo e gás).

O grupo - do qual fazem parte índios aymara, trabalhadores e camponeses sem-terra - reivindica uma lei que recupere a propriedade estatal sobre os hidrocarbonetos. Além disso, defende o aumento dos royalties que o Estado recebe pela produção petrolífera, de 18% para 50%, e a saída da empresa francesa Suez, que administra a distribuidora de água de El Alto, Aguas del Illimani.

Os dirigentes se declararam ''em pé de guerra'' com o governo de La Paz até que tenham as principais reivindicações atendidas.

- O presidente mentiu para o povo boliviano. As barricadas não são o problema, mas a lei petrolífera que Mesa quer nos impor em favor das multinacionais. É por isso que nos chantageou com o pedido de renúncia - atacou Morales.

O líder cocalero, Solares e Quispe promoveram a rebelião popular que levou à queda do então presidente Gonzalo Sánchez de Lozada, em outubro de 2003.

Na noite de terça-feira, após ser ratificado no poder, Mesa convocou a população a se concentrar hoje, ao meio-dia, nas praças das principais cidades do país para expressar oposição ao bloqueio de estradas.

- Não estou pedindo uma marcha nem uma concentração de apoio ao presidente Carlos Mesa, estou pedindo que se reúnam em suas cidades para dizer não ao bloqueio na Bolívia - afirmou, na sacada do Palácio Quemado, sede do governo.

O presidente ainda se dirigiu especificamente a Morales e fez um pedido de diálogo:

- Quero convocar o honorável deputado dom Evo Morales Ayma a se somar a este esforço nacional - disse. - Quero exortá-lo porque sei que tem uma raiz patriótica e de compromisso com a Bolívia.

A população concentrada na Praça Murillo - onde se situam o Congresso e o Palácio Quemado - pediu ao governante que atuasse com ''mão dura'' contra os que fazem barricadas nas estradas do país, mas Mesa respondeu ser um homem pacífico que tem na ''força moral'' sua melhor arma.

- A força moral se constrói sendo consistente nas palavras e nas ações. Demonstremos que somos capazes de tê-la. Nosso espírito é maior que qualquer pedra que queira bloquear este país - destacou, sendo ovacionado pelo público.

No entanto, ontem a polícia foi instruída a ativar dispositivos de segurança, prevenção e dissuasão nos perímetros da estrada que une La Paz e El Alto - centro econômico do país - além de em outros pontos estratégicos da capital.

A medida não foi suficiente para evitar a ação dos opositores. As estradas da localidade comercial de Desaguadero, na fronteira com o Peru, e para o importante posto alfandegário de Tambo Quemado, na divisa com o Chile, foram bloqueadas com pedras e pedaços de madeira.

Além disso, cultivadores de coca multiplicaram os pontos de bloqueio na principal rodovia do país e por onde transita a maior parte do comércio nacional.

Outros bloqueios foram formados na estrada que liga as cidades de La Paz e Oruro, assim como a que une Oruro e Cochabamba, nos Andes bolivianos, impedindo que centenas de pessoas seguissem viagem.