Título: Brasil ignora riscos
Autor: Marcelo Ambrosio
Fonte: Jornal do Brasil, 13/03/2005, Internacional, p. A12

Quando o alerta do biólogo Ricardo Vargas foi publicado em 2000, o JB procurou os setores responsáveis no governo federal para saber se haveria algum tipo de preocupação ou acompanhamento técnico a respeito da poluição com químicos transportada pelos rios Putumayo (que no Brasil chama-se Icá) e Caquetá (que muda para Japurá depois da fronteira). Na época, a resposta foi a de que a denúncia seria investigada por órgãos especializados.

Cinco anos mais tarde, as conclusões obtidas pelo relatório produzido no Equador e a possibilidade que os peruanos atestem a mesma coisa foram apresentadas ao governo, mas não encontraram eco nos corredores do Ministério da Saúde, em Brasília.

Procurado pela reportagem, o órgão acionou especialistas oficiais de vários setores e, dias depois, retornou com a informação de que continua não havendo controle ou acompanhamento específico do nível de contaminação das águas dos dois rios e dos outros que chegam da Colômbia.

O caso do transporte do Glifosato pelas águas dos rios é um tanto polêmico. Lançado em sua forma original, de acordo com o professor peruano Salomon Helffgott, o produto é absorvido pelo solo, não sendo carreado para os cursos d'água. A questão é que o combate à coca, segundo o médico Adolfo Maldonado, emprega um tipo de Roundup (ultra), não vendido comercialmente, mais potente pela associação com os surfactantes. Na concentração em que é lançado, o produto acabou tendo suas características alteradas.

A dissolução em água, por exemplo é de 0,54 microgramas/litro a 25 graus Celsius, índice considerado anormal, tanto que os testes no Equador revelaram que a concentração estava 500% acima do tolerável. A contaminação foi detectada a até 1 metro de profundidade. Ainda segundo o estudo, a permanência no solo, nessas condições, oscila entre 60 dias e 3 anos. No meio aquático, varia de 120 dias a um ano.

O estudo equatoriano continua, com uma avaliação mais detalhada do impacto genético e uma abordagem epidemiológica dos casos de câncer e malformações ao longo da fronteira.

O problema de Tocache, no Peru, também mereceu alerta recente do International Crisis Group, instituto de análises de conflitos, que joga outra sombra sobre a fronteira brasileira: a maciça campanha de fumigação colombiana (a área plantada caiu de 163 mil hectares em 2000 para menos de 86 mil em 2003) está empurrando as plantações para a selva peruana. Ali, o programa dos EUA contra drogas já gerou aumento das fumigações com Glifosato e a tendência é que cresçam na mesma proporção das lavouras.