Título: ''Lula se ilude com as pesquisas''
Autor: Daniel Pereira e Sérgio Prado
Fonte: Jornal do Brasil, 14/03/2005, País, p. A3

Peça importante na articulação do PSDB para a próxima campanha presidencial, o líder do partido no Senado, Arthur Virgílio, está certo de que os tucanos derrotarão o presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2006. Para ele, as pesquisas que apontam a vitória de Lula no primeiro turno, em diferentes cenários, refletem apenas a excessiva exposição do chefe do Executivo nos meios de comunicação. ¿ O Lula é uma figura completamente iludida com essas pesquisas.

O senador afirma que a gestão petista não resiste a uma comparação ostensiva, em época de campanha eleitoral, com a do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Os tucanos teriam, por exemplo, resultados administrativos a apresentar, como o trabalho de Aécio Neves em Minas Gerais e de Geraldo Alckmin em São Paulo. Além disso, seriam capazes de aproveitar melhor a janela que a conjuntura internacional abriu para a retomada do crescimento econômico brasileiro. Virgílio condenou o que considera excesso de conservadorismo na condução da política econômica.

¿ Vamos pensar num outro cenário: uma pessoa como o Fernando Henrique, uma equipe como a do Malan, o que não faria o Armínio Fraga na cabeça do Banco Central? Imagina o baile que iam dar no Maracanã se tivessem pego pela frente uma conjuntura econômica que lhes permitisse crescer 2,5% no primeiro ano. Eles (os petistas) cresceram 0,5% (em 2003) ¿ diz Virgílio. Outra estratégia para 2006 é o que Virgílio chama de desmistificar Lula. Os tucanos querem convencer a opinião pública de que a história de vida do presidente da República não pode servir de desculpa para sua suposta inépcia e falta de preparo para governar o país. Virgílio declara ainda que a reforma ministerial ¿amesquinhará¿ de vez a atual gestão e faz críticas pesadas ao chefe da Casa Civil, ministro José Dirceu, tratado como ¿aquela figura truculenta¿.

- Qual a opinião do senhor sobre a reforma ministerial?

- Qualquer prefeito de interior, quando faz uma reforma no secretariado, pensa em vender para o público a idéia de que está se aperfeiçoando, se estiver bem, ou recomeçando, se estiver mal. O único governo que não transmite mensagem nova é o governo Lula. Jamais vi alguém amesquinhar tanto a idéia da reforma ministerial. O jogo ficou restrito a cota de partidos.

- Isso visa à eleição de 2006?

- Será que esse é o melhor caminho para o presidente chegar à reeleição? Será que não é o caminho mais fácil para ele se banalizar, para ser visto como mais um politiqueiro?

- A reforma seria eleitoreira?

- Acho que corresponde a um governo desorientado. A reforma teria que obedecer a dois pressupostos. O primeiro é enxugar a máquina. O segundo é mostrar uma cara fazedora, executiva. Pra isso ele teria que ter um ministério lastreado em probidade, competência e pessoas ilustres e especializadas. Onde está o Evandro Lins e Silva do governo Lula? Você não pode nomear logo de cara o cabeça-de-bagre, começar com um time ruim. O presidente Lula, que tanto deplorou, às vezes com exageros, a taxa de fisiologia, que sempre foi muito alta na política, agora virou um escravo no império da fisiologia.

- Qual a marca do novo ministério?

- Prevejo um ministério com uma estampa medíocre, sem novidades, que amanhecerá mais velho no momento em que ele anunciar o último ministro dessa sua lamentável reforma. Um dado só para encerrar: lamento muito a forma desleal como estão tratando o ministro Aldo Rebelo, que é um homem de bem, decente, sério. É uma pessoa que tem serviços inestimáveis prestados a este governo. Trocar isso por aquela figura truculenta, que não se explica no caso do Waldomiro Diniz, uma figura completamente incompetente que não tem capacidade de se relacionar com as pessoas... (Dirceu) É um homem do tempo do onça, stanilista até hoje.

- Como é o relacionamento com Dirceu?

- Não tenho um pingo de confiança nele. Acho ele uma figura de temperamento mesquinho, pequeno. Só estou dizendo que não azeita a relação com a oposição essa figura do Dirceu (na Coordenação Política). Estou vendo uma opção pela fisiologia e pelo endurecimento petista.

- A reforma ministerial facilita o projeto do PT para as eleições de 2006?

- O Lula é uma figura completamente iludida com essas pesquisas e com o aulicismo. Compará-lo com quem se só ele está na mídia? Quer fazer uma pesquisa honesta, faz Lula, Nazaré e Maria do Carmo ( da novela Senhora do Destino. Vão ver desses três quem vai para o segundo turno. Eu sou mais Maria do Carmo e a Nazaré. E voto na Maria do Carmo.

- Mas como elas não são políticas...

- Tem uma brutal malícia dos institutos de pesquisa de querer agradar ao chefe. O Lula precisaria esperar mesmo o eclodir da campanha eleitoral para vermos se o governo dele resiste a uma campanha. Na minha cabeça, não resiste. Ele perde da Maria do Carmo.

Quando o PSDB vai definir o candidato?

- O partido tem quatro nomes. Eu pego de início o Fernando Henrique. Se ele quisesse ser, todo mundo abriria mão pra ele. Ele não quer ser. Geraldo Alckmin, governador de São Paulo, é um nome extremamente forte, até pelo peso que tem no Sudeste. Uma aliança dele com alguém do Nordeste seria muito forte. O Aécio Neves é outro nome, pelo governão que vem fazendo, pela pujança do Estado dele. E Tasso Jereissatti, governador três vezes do Ceará, um senador de primeiro nível e uma referência para a sociedade brasileira.

Qual é a estratégia do PSDB?

- Na minha cabeça, é mostrar o nosso candidato, o Mister X, que não diz bobagem. O candidato deles, o Mister L, diz. O nosso candidato tem um álbum administrativo para mostrar. O Mister L não. O nosso candidato tem absoluto compromisso e respeito à opinião pública. O outro não. O Lula não é preparado. O nosso candidato será uma pessoa necessariamente preparada intelectualmente. Eu queria aproveitar para dizer: vamos desmistificar o Lula, acabar com essa história de passado bonito de uma vez por todas. O passado dele é bonito, como o do Severino é, e ninguém endeusa o Severino pelo passado dele. Teria muito mais respeito pelo presidente Lula se ele tivesse aproveitado esses 30 anos que vive como classe média A, para fazer os cursos que não fez, ler os livros que não leu, adquirir o preparo intelectual que não adquiriu. Quando olho para o Lula e vejo ele falando bobagens, não fico derretido como um certo segmento da nossa opinião pública que se derrete. É quase que um complexo de culpa, aquele que faz você dar esmola para uma pessoa pobre sem se preocupar com o problema dela.

- A falta desse lustro faz dele um mau presidente?

- Acho que sim. Teve tempo demais para se preparar. Ele é inconveniente, fala tolice na frente do Tony Blair. Quero um presidente que você jogue duro com ele, como jogava com o Fernando Henrique. E você da imprensa pega leve com o Lula. Tem a ver com esse complexo de culpa de todos nós que somos de classe média. Só que não estamos lembrando que ele não estudou porque não quis. Acho que a gente precisa ter um presidente que volte a perturbar a Bolsa. A coisa mais normal era o Fernando Henrique um dia dar uma declaração qualquer, mal interpretada, ou infeliz, e a bolsa se agitar. O Lula pode falar o que quiser que a Bolsa não liga. O Palocci vem e conserta. Temos um presidente que assume, meio docemente constrangido, uma certa menoridade intelectual, que não é boa.

- O PT é acusado de seguir a mesma política econômica do governo anterior. O PSDB perdeu uma bandeira para as eleições?

- Os resultados macroeconômicos se esgotam neles próprios se você não tiver aplicação de excedentes econômicos em políticas públicas que promovam resultados benfazejos para a saúde social da população. É claro que foi uma surpresa agradável no começo o ministro Palocci, sem experiência aparente de política econômica, ter reunido uma equipe de pessoas competentes e ter dado continuidade ao que ele havia herdado. Hoje já vejo diferença. Você tem juros excessivamente altos.

- No governo anterior, chegou a mais de 45% ao ano.

- Aquilo correspondeu a um choque em que caíram dois presidentes do Banco Central, a uma crise internacional violenta, que colocou em xeque o exagero que estava sendo praticado na política cambial brasileira. Estávamos equivocados naquilo. Aquele choque de juros feito pelo Armínio Fraga, de 45%, foi para 17% em seis meses, menos do que esse que está aí (18,75%). Falta audácia na hora de baixar os juros o máximo que podem, são conservadores ao extremo, talvez em função ainda do passado deles. Ao mesmo tempo, estão desesperadamente se debatendo contra essa tendência internacional de queda do dólar, mas com o agravante de o Real ser uma das moedas que mais se apreciam em relação ao dólar. Você tem o governo não aproveitando as chances até pelo conservadorismo da equipe econômica, e crescendo menos que os emergentes, perdendo uma oportunidade fantástica.

- No fim do governo Fernando Henrique, o país não estava crescendo. No ano passado, cresceu 5,2%.

- A virada foi dada no governo passado e com o câmbio de R$ 2,20. Eles não tiveram uma só crise internacional. Nós enfrentamos sete crises internacionais, uma das quais com culpa nossa no meio. O cachorro está correndo atrás do rabo, porque eles, ao mesmo tempo em que aumentam os juros sem necessidade, se queixam dos dólares fartos, especulativos, que entram e forçam uma queda do dólar superior à tendência internacional.

- Essa é a principal crítica à política econômica...

- Conosco isso não aconteceria. Vamos pensar num outro cenário: uma pessoa como Fernando Henrique, uma equipe como a do Malan, o que não faria o Armínio Fraga na cabeça do Banco Central? Imagina o baile que iam dar no Maracanã se tivessem pego pela frente uma conjuntura econômica que lhes permitisse crescer 2,5% no primeiro ano. Eles cresceram 0,5% (em 2003). Cresceram 5,2% em 2004 em relação a nada. Resultado: você soma 0,5% com 5,2% dá 5,7%. Dividido por dois, você tem, por enquanto, 2,85% ao ano, que é o que o Brasil chafurdou ao longo desses anos por mil razões que às vezes independem de governos. Quero saber se esses 5,2% chegaram às pessoas lá fora, o que representaram do ponto de vista da distribuição da riqueza.

- Apesar das críticas, a popularidade do presidente continua alta.

- Ele não vai desfilar com as arquibancadas do Jóquei Clube levantando para saudar o campeão. Vai ter luta pela frente. Vai ter contra ele os servidores públicos, que se sentem traídos. Vai ter contra os servidores públicos das agências de excelência como a Embrapa e o Itamaraty, que se sentem menosprezados pela estultice administrativa. Vai ter contra o agronegócio, que não confia nele. Enfim, os compromissos de campanha, todos, não são cumpridos. Por enquanto, ele tem pesquisas favoráveis contra qualquer um, mas nenhum é candidato.

- Apesar das diferenças, há quem aposte em PT e PSDB marchando juntos no futuro.

- Nascemos de uma certa classe média, representando a elite triunfal de um país infelizmente elitizado. Eles com a matriz sindical forte. Isso estabeleceu as diferenças, porque nós entendemos que era preciso quebrar monopólios antes deles. Agora, acho que eles estão em marcha para se assumirem como social-democratas. Ou seja, está muito raro encontrar PT de boina.

- Então há uma convergência aqui...

- Como na Europa, há muita divergência nos detalhes, e os detalhes significam o êxito ou o fracasso de uma nação. O governo não sabe resolver a questão da reforma agrária nem administrar o agronegócio. Não sabe tocar nada. Está desmontando tudo.