O Globo, n. 32046, 03/05/2021, Sociedade, p. 9

 

Mais próximo do fim

Evelin Azevedo

Renato ​Grandelle

03/05/2021

 

 

 Recorte capturado

Entrega das doses permite ao país antecipar meta de imunização

Com 11 milhões de doses adicionais da vacina covid-19 sendo distribuídas aos estados, o Brasil deve aumentar o número de pessoas imunizadas por dia de 816 mil para 1,5 milhão. Se conseguir manter o ritmo de vacinação, especialistas projetam que o país vai antecipar para junho a proteção dos 80,5 milhões de brasileiros dos grupos prioritários, um passo importante no controle da pandemia, por meio do desarmamento do sistema de saúde.

A OBrasil abre a semana com aproximadamente 11 milhões de novas vacinas contra o coronavírus disponíveis. Cerca de 7 milhões chegaram na sexta-feira, produzidos na Fiocruz e no Instituto Butantan. Outro lote, de 4 milhões, desembarcou no país no final de semana, enviado pelo Consórcio Global Covax Falicity.

As novas remessas que chegaram permitem que o governo federal entre em ritmo considerado ideal pelos pesquisadores - nos cálculos deles, o país precisaria de 1,5 milhão de doses aplicadas por dia para completar a proteção dos grupos prioritários, formados por 80,5 milhões de pessoas, mais tarde neste semestre.

No entanto, o embarque atual dura apenas dez dias, sendo necessários outros igualmente expressivos para que o país mantenha o ritmo ideal de campanha de imunização.

Ontem, seis capitais brasileiras (Aracaju, Fortaleza, Porto Alegre, Porto Velho, Recife e Rio de Janeiro) anunciaram a suspensão da aplicação da segunda dose do CoronaVac por falta de vacinas. A carência pode ser corrigida já nesta semana: segundo o colunista do Globo Lauro Jardim, o Instituto Butantan prometeu entregar 1 milhão de doses na próxima quinta-feira.

PESQUISA POR NOVAS MARCAS

Cerca de 31 milhões de pessoas já receberam pelo menos uma dose do imunizador covid-19, o equivalente a 15% da população. Em abril, foram aplicadas em média 816 mil doses diárias. Até o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, admitiu que, mantida neste mês de março, a vacinação dos grupos prioritários seria concluída apenas em setembro. O atraso no cronograma foi atribuído a problemas nos embarques de insumos, que ainda não são fabricados no Brasil.

Das vacinas integradas ao sistema de saúde neste final de semana, 10,5 milhões são da AstraZeneca - 6,5 milhões foram produzidas na Fiocruz, parceira brasileira da farmacêutica, e 4 milhões são da Covax Facility. Outras 420 mil doses são do CoronaVac, fabricado pelo Instituto Butantan.

Tolberto Chebabo, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia, acredita que remessas em doses semelhantes não vão erradicar a pandemia, mas seriam suficientes para "sentir a diferença" no serviço público de saúde.

- Vacinamos menos de 1 milhão, e o ideal seria no mínimo 1,5 milhão (por dia) - descreve. - É difícil saber se teremos outros embarques com o mesmo tamanho nos próximos meses. E muitas pessoas que receberam uma dose ainda não estão devidamente protegidas, porque a imunidade é adquirida apenas um mês depois.

Para o infectologista, o governo deve acelerar a busca por novas marcas, além de AstraZeneca e CoronaVac, para garantir outros embarques expressivos de vacinas. A Pfizer, por exemplo, enviou ao país apenas 1 milhão das 100 milhões de doses adquiridas e sua distribuição ficará restrita aos grandes centros.

Outro negócio promissor, segundo Chebabo, seria a aplicação da vacina de Janssen, que ocorre em dose única e, portanto, aceleraria o processo de imunização. Seu uso emergencial foi aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária, mas seria necessário antecipar a entrega das doses, procedimento que, de acordo com o cronograma, terá início apenas no terceiro trimestre.

Segundo João Viola, presidente do Comitê Científico da Sociedade Brasileira de Imunologia, as novas leva vão fazer o número de vacinados passar de 15% para 20% da população. É, segundo ele, uma evolução, mas ainda está longe do "marco satisfatório", que seria ter 60% das pessoas imunizadas.

Outros países, como Reino Unido, Israel e Estados Unidos, contra a Chebabo, começaram a apresentar queda nas mortes e casos quando atingiam cerca de 40% a 50% da população acima de 18 anos vacinada. Masele pondera que os imunizantes usados ​​nesses países têm uma eficácia maior do que o CoronaVac, que representa a maioria das vacinas aplicadas até agora no Brasil.

- É um ganho para os idosos, profissionais de saúde, pessoas com comorbidades e professores, cuja inclusão no grupo prioritário foi fundamental para um possível retorno gradativo à Rede de Ensino - elogia Viola. - Se conseguirmos manter o recebimento das vacinas nesse ritmo satisfatório, talvez essas categorias estejam totalmente vacinadas ainda neste semestre, o que desalojará nosso sistema de saúde.

O restante da população poderá atingir a segunda dose de imunização até setembro, calcula Viola, se o país explorar seu potencial de produção e distribuição de vacinas. Caso contrário, a quantidade necessária de imunizados para manter a taxa de transmissão do coronavírus sob controle só seria atingida no final do ano.

- O Brasil tem capacidade comprovada de vacinar 2 milhões de pessoas por dia. Faltam imunizantes por diversos motivos, como dependência de importação de insumos farmacêuticos ativos

(IFAs), que são contestadas por vários países, e a falta de tecnologia para produzir uma vacina nacional, adequada às características da epidemia em nossa população - explica.

MEDIDAS PROTETORAS

Outro obstáculo para a imunização em massa, segundo Viola, é a falta de conhecimento sobre o tempo de proteção do vírus proporcionado pela vacina. É, portanto, mais um motivo para que os cuidados básicos com a Covid-19 sejam mantidos: o uso de máscaras, higienização com álcool gel e distanciamento social, que deve perdurar até que a taxa de mortalidade da pandemia diminua significativamente.

Renato Kfouri, diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações, acredita que a primeira dose da vacinação de idosos pode ser concluída neste semestre. Como o intervalo entre as doses do AstraZeneca é de três meses, é possível que algumas pessoas em que foi aplicado só estejam com a carteira de vacinação no dia seguinte a julho.

- A cobertura vacinal não chega a 100% porque algumas pessoas não voltam para receber a segunda dose. Então, vamos chamar outras pessoas de —tick. - O próximo passo é levar a campanha de vacinação às pessoas com doenças crônicas.

Kfouri, porém, ressalta que a vacinação não será por si só a responsável pela redução da transmissão do coronavírus.

- O objetivo da vacinação é reduzir os casos graves, não acaba com a infecção - destaca. - O Chile, por exemplo, imunizou quase 40% da população e atualmente tem uma das maiores taxas de transmissão do vírus. A verdadeira vacina é o distanciamento social.

Na avaliação de Kfouri, ainda é cedo para afirmar qual porcentagem da população precisa ser vacinada contra a Covid-19 para dar ao Brasil uma margem de segurança sobre a doença. Isso porque ainda não está claro por quanto tempo os imunizantes garantem a proteção, se haverá necessidade de revacinar os grupos e se as vacinas existentes serão eficazes contra as novas variantes ou se será necessário fazer adaptações para garantir a proteção contra as novas. cepas do coronavírus.