O Globo, n. 32047, 04/05/2021, País, p. 9

 

Após sangramento, Covas é transferido para UTI

Caetano Guilherme

Cleide â€‹Carvalho

04/05/2021

 

 

Prefeito de São Paulo passou por endoscopia para estancar ferida no estômago, que provocou anemia e está localizada no mesmo lugar de um dos tumores. Tratamento de câncer está suspenso até que quadro clínico melhore

A descoberta de um sangramento no estômago levou o prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), a ser intubado e transferido para a unidade de terapia intensiva (UTI) do Hospital Sírio-Libanês, na capital paulista, ontem. Covas havia dado entrada na unidade de saúde no domingo, após se queixar de fraqueza e dores. Exames detectaram que ele estava com anemia.

Covas foi sedado e se submeteu a uma endoscopia, por meio da qual os médicos localizaram uma úlcera gástrica, na mesma região de um dos tumores, que provocara o sangramento. O ferimento foi estancado, o prefeito recebeu transfusão de sangue e, de acordo com a equipe médica, foi colocado na UTI para se recuperar. Segundo os profissionais, o prefeito deixou a respiração artificial no fim da tarde, mas continuou na UTI.

Inicialmente, estavam previstas sessões conjuntas de quimioterapia e imunoterapia para ontem, mas o tratamento contra o câncer está suspenso até que Covas apresente melhoras. “O prefeito submeteu-se a intubação orotraqueal e recebeu as medidas adequadas de suporte clínico”, informou boletim divulgado ontem à tarde e assinado pelos médicos Fernando Ganem e Angelo Fernandez.

Também ontem, Covas apresentou oficialmente seu pedido de 30 dias de licença da prefeitura de São Paulo. Como já havia informado no dia anterior, ele pretende usar o afastamento para se dedicar ao tratamento do câncer. O vice prefeito, Ricardo Nunes (MDB), assumiu temporariamente. Ao acompanhar a entrega de 40 leitos de UTI para pacientes com Covid-19 em um hospital municipal, Nunes afirmou que recebeu a orientação de Covas para seguir o cronograma de ações da gestão

MAIS COMUM EM IDOSOS

Diagnosticado em outubro de 2019, Covas vem tratando do câncer desde então. A última internação demorou 15 dias e foi alongada após a descoberta de novos tumores no fígado e nos ossos da coluna e da bacia e depois que os médicos relataram acúmulo de líquidos na caixa torácica.

O tumor que atinge o prefeito de São Paulo é mais comum em idosos e costuma ser silencioso. Por ser assintomático, na maioria das vezes, acaba sendo descobertos em exames feitos por outros motivos ou em investigações associadas a refluxo gástrico, esofagite ou a sintomas provocados por metástase em outros órgãos do corpo. Foi num exame de rotina para verificar uma ferida na pele que Covas descobriu que tinha um câncer na cárdia, válvula entre o esôfago e o estômago.

—São tumores que demoram a dar sinais, e o tratamento depende do estágio da doença, do quão avançada ela está. Se houver metástase, ele é sistêmico e tem que tratar a doença não apenas nos pontos visíveis, mas o organismo como um todo — afirma Fernanda Capareli, do Centro de Oncologia do Hospital Sírio-Libanês, que, apesar de trabalhar no mesmo hospital, não integra a equipe que atende o prefeito de São Paulo.

Especialista em tumores gastrointestinais. Fernanda diz que cirurgia só é indicada em casos muito iniciais da doença. Os protocolos de tratamento são combinações de substâncias quimioterápicas, radioterapia, anticorpos monoclonais e combinações de quimioterapia com imunoterapia.

— Quanto a doença está localizada, o tratamento todo é curativo. Quando há metástase, falamos em controlar a doença. Não temos nenhum tratamento que consiga falar em cura, e o objetivo é cronificar a doença —explica a médica.

Fernanda afirma que as estatísticas publicadas em estudos direcionam os tratamentos, mas que cada doença é única e de comportamento biológico distinto. Segundo ela, em menos de 10% dos tumores se consegue identificar predisposição genética. Na maioria dos casos, o principal é a mutação celular do próprio corpo associada a fatores de risco, como tabagismo, refluxo, obesidade e a presença da bactéria H. pylori, causadora de úlceras e gastrite.

A oncologista Renata D'Alpino, do Grupo Oncoclínicas, que também não atua no caso, afirma que o tipo de tumor de Covas não está entre os cinco com maior número de ocorrências no Brasil, mas não é raro. Segundo ela, alguns tumores são refratários aos tratamentos, o que torna mais difíceis as chances de sucesso da terapia.

— O tratamento com quimioterapia prejudica a replicação das células cancerígenas e a imunoterapia acelera o sistema imune do paciente, mas nem todo tumor responde —afirma.