Valor Econômico, n. 5232, 20/04/2021. Política, p. A10

 

Bolsonaristas vão à Justiça para impedir Renan na CPI

Renan Truffi

Marcelo Ribeiro

20/04/2021

 

 

Governistas reagem à escolha de emedebista para relatoria

Apesar das pressões do governo Jair Bolsonaro por uma interferência nos rumos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Pandemia, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), decidiu manter-se afastado da disputa. Segundo interlocutores, Pacheco já deixou claro que não pretende colocar sua governabilidade em risco para que o Executivo possa ditar o ritmo das investigações. Diante disso, a base bolsonarista reagiu: vai recorrer ao Judiciário como forma de impedir que o senador Renan Calheiros (MDB-AL) assuma a relatoria da comissão.

Além dele, a CPI deve ter o senador Omar Aziz (PSD-AM) como presidente. O parlamentar do PSD não é exatamente um aliado do governo, mas o emedebista é adversário de longa data.

A decisão de Pacheco de se manter alheio à batalha entre governo e oposição no âmbito da comissão de inquérito frustrou as expectativas tanto de governistas do Congresso como da Esplanada dos Ministérios. Em contraste com a atuação do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que tem se mostrado um aliado do governo de primeira hora, Pacheco “saiu de cena” logo após o Supremo Tribunal Federal (STF) determinar que ele cumprisse trâmites necessários para a abertura da CPI.

Segundo fontes próximas, Pacheco entendeu que não era seu papel defender os interesses do presidente no colegiado. Isso porque o senador do DEM foi ungido à condição de comandante do Senado com votos tanto da situação quanto da oposição, incluindo partidos como PT, PDT e Rede. Na avaliação do entorno do presidente do Senado, ele perderia condição de liderar as pautas econômicas se ficasse constatado que estaria usando o cargo para favorecer um lado ou outro no contenda.

Além disso, nas palavras de uma fonte próxima, o senador mineiro sabe que não se deve apartar briga de foice. Esse recado foi dado pelo próprio Pacheco durante entrevista coletiva na sexta-feira. “[Estou] cumprindo a minha parte de garantir a sessão de instalação da forma adequada, não mais interferirei nas questões da CPI. Eu não posso dizer qual será a escolha dos membros da comissão em relação ao presidente ou quem será o relator”, afirmou.

Pacheco também tem repetido que o presidente do Senado nada pode fazer em relação à formação de uma CPI. Isso porque é o colegiado quem escolhe seu presidente e este, por sua vez, define o relator. Neste caso, tudo indica que os senadores Omar Aziz (PSD-AM) e Renan Calheiros ficarão com os respectivos cargos. “CPI tem vida própria”, emendou um aliado. “Foram os próprios líderes que definiram o comando da comissão”, concluiu a fonte.

Em retaliação, a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP) anunciou ontem que irá acionar o Judiciário para impedir a escolha do emedebista. “Acabamos de ingressar com ação na Justiça para barrar Renan Calheiros na relatoria da CPI. A presença de alguém com 43 processos e 6 inquéritos no STF evidentemente fere o princípio da moralidade administrativa”, escreveu a aliada do presidente Jair Bolsonaro. Segundo ela, “outros parlamentares também ingressarão com ações” parecidas.

Na peça jurídica, os advogados de Carla Zambelli colocam em questão a “imparcialidade” do senador de Alagoas. “A mácula em sua personalidade resta evidenciada inconteste, autorizando o questionamento de seu caráter e o compromisso de imparcialidade que se pretende de um relator, mormente na situação catastrófica pela qual vem passando o país, tanto na área sanitária como no setor econômico, criando um círculo viciosa capaz de levar toda uma nação à ruína”, diz o texto. “A hipótese mais clara e evidente é que essa CPI tenderá a criar um ambiente hostil ao presidente.”

Apesar das ofensivas, Renan Calheiros já tratou de se vacinar de qualquer questionamento neste sentido. Ele anunciou no domingo que, caso seja mesmo selecionado como relator, irá criar sub-relatorias, que seriam distribuídas a membros da comissão. A ideia dele é evitar “decisões monocráticas” e, assim, ter respaldo do colegiado.

“Sobre as prioridades que defenderei na CPI da covid: isenção, celeridade e respostas sobre os responsáveis pelas milhares de vidas perdidas. Também disse que não vou me intimidar com ataques digitais de quem quer que seja. A CPI fará o seu trabalho”, disse.