Valor Econômico, n. 5236, 27/04/2021. Política, p. A12

 

Ministros do TCU rejeitam ‘café’ com presidente e forçam recuo do Planalto

Murillo Camarotto

Fabio Murakaw

27/04/2021

 

 

Diante de um iminente fiasco na organização de um café da manhã com ministros do Tribunal de Contas da União (TCU), que estava programado para hoje, o Palácio do Planalto decidiu cancelar o evento e realizar uma simples videoconferência.

A mudança aconteceu após a maioria dos convidados sinalizar que não compareceria ao encontro, promovido para tentar “aproximar” o presidente Jair Bolsonaro dos ministros, em uma estratégia para blindar o governo de condenações no TCU.

A iniciativa não pegou bem no tribunal, de onde saíram muitas críticas e ironias à estratégia do governo, classificada de “uma trapalhada”. Pelo menos cinco dos nove ministros do TCU - Ana Arraes, Bruno Dantas, Vital do Rêgo, Aroldo Cedraz e Benjamin Zymler - disseram que não iriam comparecer e o evento acabou ficando muito esvaziado.

Apesar do desconforto com os objetivos da reunião, alguns ministros alegaram que não iriam ao café para evitar exposição em tempos de pandemia. Com o novo formato de videoconferência, o comparecimento deve ser um pouco maior, mas não total.

Havia também uma desconfiança de que o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello fosse convidado, a fim de constranger os ministros que pretendem investigá-lo. A proposta de fiscalização foi interrompida há duas semanas após pedidos de vistas de aliados de Bolsonaro.

Durante a apresentação de um relatório de avaliação sobre as ações da pasta, o ministro Benjamin Zymler afirmou que o número de mortes no país “pode ser um indicador da ausência de planejamento” do Ministério da Saúde. Ele também apontou indícios de conduta omissiva por parte dos gestores e propôs ao plenário a abertura de processos de responsabilização contra eles.

A apresentação foi seguida de duras críticas ao governo, vindas de Dantas e Vital. “Nos envergonha a gestão que o Ministério da Saúde vem realizando com relação a esse quadro tenebroso da crise da covid-19”, afirmou Dantas, que chegou a sugerir a aplicação imediata de penas aos gestores, entre os quais Pazuello.

“Depois de três ministros da Saúde, temos que ter uma posição mais clara sobre essa desobediência absurda”, afirmou Vital sobre o descumprimento, por parte do governo, de determinações feitas pelo TCU desde o começo da pandemia. Assim como Dantas, ele também defendia a aplicação imediata de multas, mas aceitou acompanhar o pedido do relator pela abertura dos processos de investigação.

O governo está preocupado com investigações em andamento no TCU, tanto na área da saúde quanto no das contas públicas. Recentemente, o tribunal fez circular alguns alertas de que a sanção integral do Orçamento de 2021 poderia resultar na rejeição das contas de Bolsonaro.

Atento a esses riscos, o Planalto acionou ministros aliados dentro da Corte - Jorge Oliveira e Augusto Nardes - para tentar uma aproximação. Outro ministro simpático ao bolsonarismo é o decano, Walton Alencar.

Uma embaixada no exterior chegou a ser oferecida ao ministro Raimundo Carreiro, a fim de abrir uma vaga no TCU que seria preenchida com mais um aliado do governo. Carreiro se interessou, mas a manobra fracassou após outro iminente fracasso, desta vez no Senado, que, sinalizou, não aprovaria a indicação.

Além do presidente Bolsonaro, devem participar da videoconferência sete ministros do governo, além do presidente do BNDES, Gustavo Montezano.