Título: O 'tsunami' amigo
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Fonte: Jornal do Brasil, 15/03/2005, País, p. A3

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva lamentava, há um mês, a derrota na eleição para a Mesa Diretora da Câmara. Aturdidos, os governistas viram o deputado Severino Cavalcanti (PP-PE) discursar na abertura dos trabalhos do Congresso, prometendo mais independência em relação ao Executivo. Trinta dias depois, o tsunami que deu um caldo no Planalto mostrou que não é tão perigoso assim. Severino pôs em votação a Lei de Biossegurança no formato que o Planalto negociou no Senado, pautou a emenda paralela da Previdência e marchou ao lado d e Lula na defesa de que a reforma tributária não pode ser fatiada.

Do ponto de vista político, apesar dos arroubos em discursos feitos em diversos pontos do país, Severino ajudou o Planalto a enterrar a representação feita pelo PSDB contra Lula, quando do discurso a respeito das privatizações do governo Fernando Henrique. E acabou tendo que curtir uma derrota pessoal, ao não aprovar o aumento salarial de R$ 12.720 para R$ 21.500, prometido aos parlamentares.

Severino deu um novo ritmo aos trabalhos legislativos. Os últimos 30 dias foram de surpresa até mesmo para os parlamentares. O presidente da Casa, com sua língua afiada, já disparou petardos para todos os lados. Chamou Lula de Dutra, discursou em defesa de conterrâneos flagrados em situações constrangedoras, deu uma descompostura no líder do PSDB, Alberto Goldman (SP), em plenário, após arquivar a representação do PSDB.

Para o líder do PFL na Câmara, Rodrigo Maia (RJ), não há como desconsiderar o novo ritmo de trabalhos na Câmara.

- Só de votarmos, nestes 30 dias, a Lei de Biossegurança e iniciado a discussão da emenda paralela da Previdência, já é um sinal de que este presidente tem compromisso com a Casa, não com o Planalto - avaliou Maia.

Uma semana após ser eleito presidente, a primeira confusão estava instalada. Carimbando a promessa de campanha, a Mesa Diretora apresentou dois projetos de resolução, propondo o aumento dos salários dos deputados de R$ 12.780 para R$ 21.500 e as verbas de gabinete, de R$ 35 mil para algo em torno de R$ 48 mil. Começava uma guerra parlamentar. Como as duas propostas precisavam ser aprovadas em plenário, sete partidos - incluindo aqueles que ajudaram na vitória de Severino - resolveram boicotar a proposta, pressionados pela opinião pública.

O presidente da Câmara só desistiu quando o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) colocou-se contrário à proposta. Esperneou, criticou Renan, mas acabou aceitando o resultado.

- Foi um mês muito difícil para todos nós. O desgaste aumentou com este debate corporativo, fisiológico - lamentou o líder do PSB na Câmara, Renato Casagrande (ES).

Para o deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), Severino tem sido correto na condução dos trabalhos da Casa, abrindo um espaço democrático para os líderes discutirem as pautas que entrarão na chamada Ordem do Dia.

- Não o vejo também com o ânimo de prejudicar o governo - definiu Chinaglia.