Título: ONU conta 180 mil mortos em Darfur
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Fonte: Jornal do Brasil, 15/03/2005, Internacional, p. A14

Número não inclui vítimas da violência, mas somente casos de doença e má nutrição nos últimos 2 anos

AFP Parentes velam o corpo de uma criança de um ano, no campo de refugiados de El Geneina em Darfur

NOVA YORK - O conflito em Darfur, no Sudão, provocou pelo menos 180 mil mortos nos últimos 18 meses. A conclusão é do secretário-geral adjunto da ONU para Assuntos Humanitários, Jan Egeland, que divulgou ontem o número, bem mais alto que os 70 mil que as Nações Unidas consideravam anteriormente.

Egeland afirmou que a estimativa diz respeito às vítimas de doença e má nutrição e exclui as mortes causadas pela violência na região.

As milícias árabes locais, apoiadas pelo governo sudanês - que as utilizaram no passado contra uma rebelião na área - são acusadas de assassinar camponeses e de provocar o deslocamento de 2 milhões de pessoas.

- Pode muito bem ser mais de 200 mil em 18 meses. Mas acho que uma média de 10 mil pessoas por mês já é considerável - afirmou Egeland.

No ano passado, a Organização Mundial de Saúde afirmou que 10 mil pessoas morriam por mês em Darfur somente por causa de doenças. A maior parte dos 2 milhões de deslocados, desde que começou a violência na região, no início de 2003, busca abrigo nos campos de refugiados ao redor das cidades. Mais de 200 mil atravessaram a fronteira com o Chade.

Um relatório anterior e recente da ONU afirmou que - apesar de não se tratar de uma situação de genocídio - assassinatos, tortura, desaparecimentos e violência sexual são práticas correntes e sistemáticas em Darfur e são passíveis de caracterizar o problema como um de ''crime contra a humanidade''.

Segundo agências humanitárias que atuam na região, a milícia Janjaweed continua a atacar civis apesar de Cartum ter se comprometido na ONU em desarmar e demobilizar o agrupamento árabe.

A Janjaweed ataca camponeses, campos de refugiados e incendeia casas abandonadas, com o objetivo de desencorajar a volta dos deslocados.

Na verdade, analistas estimam que o número de mortes no conflito pode chegar a quase 400 mil, nos últimos 18 meses. Um problema na hora de contabilizar as vítimas é exatamente o fato de que o governo sudanês e a aliada milícia árabe Janjaweed são os principais acusados de causar a violência e, portanto, têm pouco interesse em contabilizar as agressões.

Ao mesmo tempo, o Conselho de Segurança já fez três declarações inoperantes sobre a questão e os países-membros permanecem incapazes de fechar um acordo com relação à imposição de sanções contra Cartum.

Além disso, a pequena força da União Africana na região, enviada para monitorar o cessar-fogo assinado entre o Sul e o Norte do país, no último mês de janeiro, é incapaz de dar conta da milícia árabe.

A missão recente da ONU que esteve no Sudão catalogou centenas de incidentes violentos contra civis. O relatório produzido usou o termo ''violações graves dos direitos humanos'' e passou a exigir a criação de um tribunal de guerra para o conflito.

Em meio ao problema, especialistas tentam calcular quantas pessoas já morreram, em quase dois anos de guerra, com base em depoimentos de testemunhas.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) pretende divulgar um novo relatório sobre a região ainda este mês.

- Números são sempre difíceis, mas o incomum nesta situação é que há um interesse e uma pressão intensa para que haja uma estimativa - disse David Nabarro, da OMS, à rede BBC.

A Anistia Internacional afirma que a melhor estimativa sobre quantos foram mortos somente por causa da violência desde o início do conflito é a de 50 mil pessoas. O especialista e professor americano Eric Reeves calcula, no total, 340 mil mortes, em 24 meses, na região.