O Globo, n. 32050, 07/05/2021. País, p.6

 

 

Após adiar ida à CPI, Pazuello recebe Onyx

 

Ex-ministro alegou contato com militares infectados com coronavirus para postergar depoimento aos senadores

 

Dois dias depois de informar a CPI da Covid que não poderia comparecer ao Senado por ter entrado em contato com dois militares infectados com coronavírus, o que o obrigaria a uma quarentena, o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello recebeu, ontem, a visita do ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Onyx Lorenzoni. O depoimento do ex-titular da pasta aos senadores estava marcado para quarta-feira e foi reagendado.

A informação sobre o encontro foi revelada pelo jornal “O Estado de S. Paulo”. Onyx foi visto entrando e saindo do Hotel de Trânsito de Oficiais, onde Pazuello está hospedado, no final da manhã. A agenda do ministro, entretanto, previa naquele horário uma reunião com o secretário executivo da pasta, Vicente Santini.

Onyx é um dos integrantes do Palácio do Planalto que comanda a estratégia do governo para enfrentar a CPI e há uma expectativa, inclusive, de Pazuello ser nomeado para um cargo em seu ministério.

Na terça-feira, Pazuello disse ao comandante do Exército, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, que não poderia comparecer à CPI, argumentando que teve contato com duas pessoas que testaram positivo para a Covid-19. Um ofício foi encaminhado pela instituição informando o fato à CPI. A oitiva, então, foi remarcada para o dia 19, após o término da quarentena informada pelo ex-ministro.

Entretanto, segundo o jornal, Pazuello foi visto circulando pelas áreas comuns do hotel neste período. O GLOBO questionou a Secretaria-Geral, o Ministério da Defesa e o Exército sobre o episódio, mas não recebeu retorno de nenhum dos órgãos.

A revelação do encontro repercutiu no Senado. Vice-presidente da CPI, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) disse que quer saber por que Pazuello continuou recebendo visitas em casa após dizer que não poderia comparecer à CPI por suspeita de Covid-19:

— Nós podemos requisitar o exame do senhor Eduardo Pazuello. É um episódio lamentável e triste. É muito triste um ex-ministro da Saúde, general do Exército, se prestar a uma situação dessa. No mínimo, é infração à ordem sanitária. No máximo, é obstrução à investigação.

Ao final da sessão, o senador reiterou a visita e a interpretação sobre uma possível infração sanitária.

Neste momento, o senador Fabiano Contarato (sem partido-ES) reiterou a posição:

— Colega Randolfe, em processo penal, isso é condução coercitiva.

O senador Jean Paul Prates (PT-RN) perguntou o que a CPI poderia fazer a respeito. O presidente da comissão, senador Omar Aziz (PSDAM), contemporizou:

— Não foi o ex-ministro Pazuello que foi a Onyx. Foi Onyx que foi a Pazuello. Ninguém pode proibir alguém de fazer a visita, mesmo com Covid. Não temos poder para isso.

O relator, Renan Calheiros (MDB-AL), destacou que Pazuello não é acusado de nada nem investigado, mas vai depor como testemunha.

— A sutileza da vinda dele como testemunha é uma coisa muito mais digna. Se ele quiser vir na condição de acusado, aí é uma outra questão — disse Renan, acrescentando. —Eu confio no bom senso dele, mas ele precisa colaborar e deixar de usar o Exército de biombo para não vir à CPI.

 

IRRITAÇÃO EM TREINAMENTO

Antes de adiar seu depoimento, Pazuello passou dias no Palácio do Planalto com auxiliares se preparando para o interrogatório com os senadores. A ida dele ao Senado é considerada um dos pontos-chave da CPI, uma vez que o exministro liderou o Ministério da Saúde por onze meses e já é alvo de investigações no Ministério Público Federal e no Tribunal de Contas da União.

Durante as sessões de treinamento, Pazuello demonstrou nervosismo, segundo assessores que acompanharam a preparação. O temperamento explosivo do general é uma das principais preocupações de integrantes do governo. Para evitar um comportamento hostil no Senado, Pazuello assistiu a uma série de vídeos de momentos em que demonstrou irritação em público durante entrevistas coletivas e em audiências no Congresso. O ensaio envolveu também uma simulação de confronto com parlamentares, com perguntas espinhosas.