O Estado de São Paulo, n. 46510, 18/02/2021. Internacional, p. A13

Biden quer Bolsonaro em fórum do clima
Felipe Frazão
André Borges
18/02/2021



John Kerry, czar dos EUA para o meio ambiente, conversa com ministros brasileiros e espera que o País participe de debates sobre tema

Os ministros das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, e do Meio Ambiente, Ricardo Salles, mantiveram ontem a primeira reunião de trabalho com John Kerry, enviado especial do governo dos EUA para as mudanças climáticas. De acordo com uma fonte presente na reunião, Kerry afirmou que o presidente americano, Joe Biden, gostaria de ter Jair Bolsonaro no fórum sobre o meio ambiente, marcado para 22 de abril.

Os americanos querem fazer da reunião, batizada de "Fórum no Dia da Terra", um preparativo para a cúpula do clima, agendada para novembro, em Glasgow, na Escócia. O secretário de Estado dos EUA, Anthony Blinken, já havia indicado a Araújo, em telefonema na semana passada, que Biden gostariam de contar com a presença do Brasil na reunião, algo que foi enfatizado por Kerry na conversa de ontem.

Os EUA planejam apresentar um plano de conservação da Amazônia, a ser criado em colaboração com os países que abrigam parte da floresta. A ideia consta do pacote climático lançado recentemente por Biden. Os americanos devem esboçar as propostas sobre comprometimento com a preservação da floresta nas próximas reuniões com o Ministério do Meio Ambiente.

Nos últimos dez dias, os americanos têm tentado dissipar a ideia de que há ruídos na relação com o Brasil. Tanto o Departamento de Estado como a Casa Branca têm ressaltado a parceria entre os dois países e destacado que, apesar de divergências com Bolsonaro, a ideia é manter o diálogo, mas sem abrir mão da cobrança pelo compromisso com a agenda ambiental e proteção de direitos humanos.

Na conversa de ontem, segundo fontes, Kerry ressaltou que planeja trabalhar em parceria com o Brasil na questão ambiental. Em nota, os ministérios brasileiros disseram que examinam "possibilidades de cooperação" em ações contra as mudanças do clima e no combate ao desmatamento. Ficou acertado que os dois países aprofundarão o diálogo e manterão encontros frequentes "em busca de soluções sustentáveis e duradouras para os desafios climáticos comuns".

Kerry, Salles e Araújo conversaram por videoconferência. Foi a segunda reunião entre equipes de alto escalão dos governos Bolsonaro e Biden. Fontes diplomáticas afirmaram que a conversa foi longa e "produtiva". Durante cerca de 40 minutos, eles combinaram de manter conversas semanais entre técnicos da área ambiental. Essas reuniões poderão contar, eventualmente, com a participação de Kerry e de Salles. Na semana passada, o chanceler havia mantido uma conversa telefônica com Blinken. Na ocasião, Araújo disse que a agenda entre os dois países foi "100% positiva".

Apoiador do ex-presidente Donald Trump, Bolsonaro fez oposição e contestou a eleição de Biden. Agora, tenta construir uma aproximação desde a posse do democrata, em janeiro, quando enviou uma carta em tom "construtivo", segundo análise de diplomatas americanos.

Biden já havia anunciado que a pauta ambiental seria colocada como prioridade na relação entre os dois países. Na campanha, ameaçou impor sanções econômicas ao Brasil, caso não houvesse ações para conter a alta no desmatamento.

Biden acenou com uma oferta de U$ 20 bilhões para a Amazônia e prometeu "reunir o mundo" para cobrar ações e participar da iniciativa, numa abordagem multilateral. Bolsonaro reagiu mal. Disse que a fala foi "lamentável" e a soberania brasileira era "inegociável".