O Estado de São Paulo, n. 46512, 20/02/2021. Economia, p. B1

Bolsonaro pede saída de presidente da Petrobrás e indica general para o cargo
20/02/2021



Petróleo. Em interferência direta na estatal, presidente Bolsonaro aponta o nome de Joaquim Silva e Luna, general da reserva e atualmente presidente de Itaipu, para a vaga de Roberto Castello Branco; ontem, petroleira perdeu R$ 28,2 bilhões em valor de mercado

Depois de sinalizar seu descontentamento com o presidente da Petrobrás, Roberto Castello Branco, o presidente Jair Bolsonaro anunciou formalmente sua intenção de tirá-lo da empresa. Ontem, indicou o general da reserva Joaquim Silva e Luna para o cargo, em substituição a Castello Branco, cujo mandato atual se encerra em 20 de março. Silva e Luna é atualmente o presidente de Itaipu.

O conselho de administração da Petrobrás ainda precisa aprovar o nome indicado, podendo barrar essa indicação. O governo, porém, tem maioria no colegiado de 11 membros. O presidente da estatal tem um mandato de dois anos, podendo ser reconduzido três vezes. No caso de Castello Branco, tudo indicava que seria reconduzido pelo conselho em uma reunião que será realizada na terça e na quarta-feira. Mas o anúncio de Bolsonaro muda o rumo dessa discussão.

O temor de interferência política na Petrobrás, com as ameaças do presidente Bolsonaro ao comando da estatal, já havia feito ontem, ao longo do dia, um enorme estrago nas ações da petroleira. Os papéis ON (ordinários, com direito a voto) caíram 7,92%, enquanto os PN (preferenciais, sem direito a voto) recuaram 6,63%. No total, a empresa perdeu R$ 28,2 bilhões em valor de mercado.

Reações. O anúncio provocou reações fortes. Salim Mattar, ex-secretário de desestatização do governo federal, classificou como "lastimável", em seu perfil no Twitter, a indicação do general Silva e Luna para a estatal. "Lastimável a decisão do governo de tirar Roberto Castello Branco do comando da Petrobrás. Roberto é um profissional extremamente qualificado que tirou a empresa literalmente do fundo do poço após o maior escândalo de corrupção do planeta. Em seu lugar será nomeado mais um militar", disse Mattar.

Marcelo Mesquita, que é conselheiro da Petrobrás, disse que ações como a do presidente Bolsonaro acabam prejudicando o valor de mercado da companhia. "O mandato dos presidentes da Petrobrás duram, em média, dois anos desde o governo de Getúlio Vargas. Alguém acha isso normal? Dois anos é muito pouco para se desenvolver uma estratégia de longo prazo", disse. Mesmo assim, Mesquita afirmou que o conselho deve analisar o nome de Joaquim Silva e Luna sem preconceito, com base no currículo.

A pressão de Bolsonaro sobre Castello Branco ficou evidente na quinta-feira, durante a live semanal nas redes sociais. Ele anunciou que, a partir de 1.° de março, não haverá mais incidência de PIS e Cofins sobre o preço do óleo diesel. O presidente disse ter considerado o aumento anunciado pela Petrobrás na quarta-feira, o quarto do ano, "fora da curva" e "excessivo". Ele reforçou que não pode interferir na estatal, mas ressaltou que a medida iria "ter consequência".

A redução do Pis/cofins no óleo diesel atende a uma demanda de caminhoneiros, base de apoio do presidente que tem pressionado o governo por causa do aumento de preços. Em ameaça indireta a Castello Branco, o presidente chegou a citar que o comandante da estatal chegou a dizer, há alguns dias, que não tinha "nada a ver com os caminhoneiros". "Como disse o presidente da Petrobrás, há poucos dias: 'Eu não tenho nada a ver com caminhoneiro'. Foi o que ele falou. Isso vai ter uma consequência, obviamente", disse Bolsonaro.

Ontem, reiterou as ameaças. "Anuncio que teremos mudança, sim, na Petrobrás. Jamais vamos interferir nessa grande empresa na sua política de preço, mas o povo não pode ser surpreendido com certos reajustes", declarou durante evento em Sertânia (PE).

Para o lugar de Silva e Luna em Itaipu foi indicado o general de Exército da reserva João Francisco Ferreira.

Lástima

"Lastimável a decisão do governo de tirar Roberto Castello Branco do Comando da Petrobrás."

Salim Mattar

EX-SECRETÁRIO DE DESESTATIZAÇÃO