Título: Conselho cristão discutirá aborto
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Fonte: Jornal do Brasil, 12/03/2005, País, p. A4

O governo venceu a resistência interna e emplacou na comissão que revisará a legislação do aborto a participação religiosa do Conic (Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil), que engloba sete igrejas, inclusive a católica, e será a única voz resistente a que o aborto deixe de ser crime. A escolha, uma concessão do governo à forte pressão por um assento religioso na comissão, visa a enfraquecer o lobby direto da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), que se opõe até a abortos permitidos por lei (estupro ou risco de vida para a mãe).

O Conic tem sete igrejas: Católica Romana, Cristã Reformada, Episcopal Anglicana, Evangélica da Confissão Luterana, Metodista, Presbiteriana e Católica Ortodoxa.

A organização não chegou a um consenso interno sobre a questão:

- Mas todos concordamos com o princípio de defesa da vida - disse o secretário-executivo do Conic, pastor Ervino Schmidt.

Das outras 5 entidades da sociedade civil indicadas, os representantes de 4 são favoráveis à descriminalização do aborto: Associação das Mulheres do Brasil, CUT, Fórum das Mulheres do Mercosul e Rede Feminista de Saúde. A Febrasgo (Federação de Ginecologia e Obstetrícia) não tem posição oficial, mas apóia liberar o aborto de feto anencefálico (sem cérebro). Os seis indicados do Executivo encampam também a mudança. Faltam definir seis parlamentares.

O presidente da Câmara dos Deputados, Severino Cavalcanti (PP-PE), criticou ontem a norma editada pelo Ministério da Saúde que autoriza médicos do Sistema Único de Saúde (SUS) a fazer aborto em mulheres que aleguem ter engravidado em conseqüência de estupro, mesmo que não tenham boletim de ocorrência ou outro documento que comprove a violência.

Na opinião de Severino Cavalcanti, não é possível aceitar que ''um simples atestado médico'' possa contestar a legislação brasileira.

- Quem está legislando é o ministro da Saúde. Temos que ver isso. De acordo com a posição que ele tomou, eu irei analisar se ele está fazendo uma interferência indevida no Legislativo, ou não. Se tiver, tomarei as providências necessárias.

O artigo 128 do Código Penal não exige que a mulher violentada notifique o fato à polícia. Em 1998, no entanto, o então ministro da Saúde José Serra editou norma técnica que exigia boletim de ocorrência como documento obrigatório para a realização de aborto legal no SUS.

Em 1998, diversos movimentos em defesa da vida e religiosos protestaram contra a medida. Na época, o deputado Severino Cavalcanti não teve sucesso ao liderar correntes no parlamento para a derrubada do dispositivo.