O Estado de São Paulo, n. 46523, 03/03/2021. Política, p. A10

Flávio afirma que comprou casa com 'recursos próprios'
Marcio Dolzan
03/03/2021



Senador diz que usou dinheiro da venda de outro imóvel e de uma franquia para dar entrada na aquisição de propriedade de R$ 6 mi

Vista. Casa adquirida pelo senador Flávio Bolsonaro e por sua mulher; imóvel fica no setor de Mansões Dom Bosco, no Lago Sul, bairro nobre de Brasília, e tem 1,1 mil metros quadrados

O senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-rj) afirmou ontem que a casa de R$ 6 milhões adquirida por ele e por sua mulher, a dentista Fernanda Antunes Bolsonaro, em Brasília, foi comprada com "recursos próprios" somados a um financiamento imobiliário. O filho mais velho do presidente Jair Bolsonaro disse que o negócio se deu de forma "absolutamente transparente e dentro da lei".

"A casa foi comprada com recursos próprios, em especial oriundos da venda de seu imóvel no Rio. Mais da metade do valor da operação ocorreu por intermédio de financiamento imobiliário", afirmou Flávio em nota, que complementa. "Tudo registrado em escritura pública. Qualquer coisa além disso é pura especulação ou desinformação por parte de alguns veículos de comunicação."

Em vídeo divulgado mais tarde, o senador citou, além da venda de um imóvel, negócio envolvendo uma franquia também no Rio como fonte do dinheiro. Diz também que obteve o financiamento "como qualquer cidadão comum". O senador criticou o que chamou de "exploração" do caso pela imprensa.

"Não vou deixar de fazer nada por medo de a imprensa explorar ou distorcer isso", afirmou Flávio. De acordo com ele, a venda desse imóvel no Rio está, em breve, disponível para consulta pública em cartório. Ainda na gravação, o parlamentar disse que pediu ao Gabinete de Segurança Institucional (GSI) que reforce a segurança de sua família.

A compra da casa de R$ 6 milhões foi revelada anteontem pelo site O Antagonista. O imóvel fica no setor de Mansões Dom Bosco, no Lago Sul, bairro nobre da capital federal. A propriedade tem 1,1 mil m², com quatro suítes, academia, piscina  e spa com aquecimento solar. O anúncio de venda informava que se tratava da "melhor vista de Brasília da suíte master". Um vídeo com detalhes da casa fazia parte da publicidade para a venda do imóvel, de propriedade da RVA Construções e Incorporações. O material foi tirado do ar após a divulgação do caso.

Conforme registro no 1.º Ofício de Registro de Imóveis do Distrito Federal, no dia 2 de fevereiro, a casa foi comprada pelo preço de R$ 5,97 milhões. Flávio registrou o imóvel em um cartório de Brazlândia, município de perfil rural localizado a 50 km do Plano Piloto.

O salário bruto de um senador é de R$ 33.763, que, após descontos, cai para R$ 24,9 mil. O valor do novo imóvel é mais que o triplo do total de bens declarados por Flávio à Justiça Eleitoral em 2018, quando disputou vaga no Senado. Na ocasião, ele declarou um total de bens de R$ 1,74 milhão, incluindo um apartamento na Barra da Tijuca, no Rio, no valor de R$ 917 mil.

As condições do financiamento do novo imóvel de Flávio no Banco de Brasília, no valor de R$ 3,1 milhões, foram vantajosas na comparação com simuladores de outras instituições financeiras. O banco, no entanto, informou que a operação foi "normal".

Investigação. Flávio e sua mulher foram denunciados pelo Ministério Público do Rio. A Promotoria acusa o senador de peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa envolvendo um esquema de "rachadinha" na Assembleia Legislativa do Rio, quando ele era deputado estadual. Segundo o MP fluminense, a organização criminosa "comandada" pelo filho do presidente desviou R$ 6,1 milhões dos cofres da Alerj.

Na denúncia, os promotores citam transações imobiliárias como forma de lavar dinheiro obtido nas "rachadinhas". Segundo as investigações, Flávio e sua mulher compraram, em novembro de 2012, dois apartamentos em Copacabana. Os preços foram mais baixos do que os que tinham sido pagos pelos proprietários. Em dois anos, os imóveis foram vendidos pelo casal com lucros pouco usuais.

Um dos apartamentos fora comprado pelo primeiro proprietário por R$ 200 mil, em março de 2011. Tinha sido vendido ao casal em novembro de 2012 por R$ 140 mil, afirma a denúncia. Em fevereiro de 2014, o então deputado e sua mulher repassaram o imóvel por R$ 550 mil, uma valorização de 292,85%. "Essa prática de subfaturamento de registros imobiliários na compra possibilita a simulação de ganhos de capital em patamares expressivos na ocasião da revenda, razão pela qual são instrumentos corriqueiramente utilizados para lavagem de capitais", afirmam os promotores.

Flávio nega as acusações e diz ser vítima de uma investigação ilegal que busca atingir seu pai.