Título: Espanha cala em reverência silenciosa
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Fonte: Jornal do Brasil, 12/03/2005, Internacional, p. A7
País pára em aniversário de um ano dos atentados contra trens que deixaram 191 vítimas em Madri MADRI - Silenciosamente, com velas e flores, milhões de pessoas se reuniram ontem durante todo o dia para recordar os ataques que há um ano mataram 191 pessoas e feriram mais de 1500 em trens de Madri.
Ao meio-dia, o rei Juan Carlos e a rainha Sofia fizeram cinco minutos de silêncio e participaram, junto com líderes governamentais, da inauguração do Bosque dos Ausentes, o principal memorial aos mortos no 11 de março. No Parque El retiro, no coração da capital espanhola, foram plantados 192 ciprestes e oliveiras, representando cada uma das vítimas. A homenagem inclui um policial que foi morto quando militantes islâmicos se suicidaram em um prédio nos arredores de Madri.
Também estiveram presentes o rei do Marrocos, que foi ao país especialmente para a ocasião, e vários chefes de Estado que participavam da Cúpula Internacional sobre Democracia, Terrorismo e Segurança.
- O mundo inteiro chora com as famílias das vítimas - disse o secretário-geral da ONU, Kofi Annan.
O sóbrio e curto ato se encerrou com a interpretação no violoncelo de ''O canto dos pássaros'', peça que o violoncelista espanhol Pau Casals dedicou à paz. Mas houve quem criticasse a homenagem:
- Nós, madrilenos, estivemos no ano passado muito perto dos afetados e hoje não deixaram que nos aproximássemos - lamentava um dos presentes.
No mesmo horário, trens fizeram paradas não previstas nas estações, o comércio foi interrompido, carros pararam nas ruas e uma multidão tomou o Paseo de la Castellana, a principal artéria que une o Norte e o Sul de Madri. As portas das prefeituras e de outras instituições oficiais, de sindicatos de trabalhadores e as praças da cidade também foram pontos de concentração de pessoas, entre elas vários imigrantes.
- Me sinto tão triste. Foi tão injusto - comentou Bakea Goitia, de 48 anos, lembrando o ''catastrófico dia, em que tudo pareceu ficar fora de controle''.
As estações atingidas pelos ataques e onde os atos em memória das vítimas começaram pouco depois das 7h - no momento em que ocorreram os atentados - ficaram cobertas de flores e cartas. Numa das paredes da estação El Pozo, uma mensagem assinada por uma mulher perguntava quem trará de volta sua vontade de viver, ''que morreu um ano atrás''?
Representando a comunidade islâmica de Madri, 30 estudantes muçulmanos fizeram minutos de silêncio diante da entrada da maior mesquita da capital, ao lado de duas coroas de flores brancas e vermelhas. Nas mãos, as crianças carregavam um cartaz no qual se lia: ''Todos contra o terrorismo''.
Dentro, o imã Cheij Moneir dedicou o sermão de sexta-feira a reflexões sobre a vida e a morte e em especial a explicar que o Islã não tem qualquer relação com os atentados.
- Se Deus quisesse nos teria feito todos iguais. Mas não foi assim e nos encomendou que convivêssemos de forma pacífica - disse o imã. - Esperamos que não se tente pagar uma injustiça com outra.
A Associação de Vítimas ao Terrorismo também se manifestou. Antes, chegou-se a dizer que ela não participaria das cerimônias de ontem.
- Estas homenagens devem ser um motivo de união, sem fronteiras de nenhum tipo, pois a ameaça é global - disse o presidente Francisco Alcaraz.
As homenagens na capital se encerraram com uma cerimônia na catedral de Almudena, no centro de Madri. Mais de mil pessoas, metade delas parentes das vítimas, assistiram à missa.
- O terrorismo não tem nem terá nunca a última palavra. Nem na vida dos povos nem na determinação de seus destinos - disse o cardeal e arcebispo de Madri, Antonio María Rouco.