O Estado de São Paulo, n. 46531, 11/03/2021. Metrópole, p.A16

 

 

 

País relata 2.349 mortes em 24 h; média de óbitos salta 43% em duas semanas

 

 

 

 

Comparado com o inicio do ano, o aumento é superior a 130%; especialistas veem risco crescente, considerando as variantes do vírus mais transmissíveis e a dificuldade cada vez maior de manter as pessoas em casa. Brasília reportou ontem 100% de ocupação de UTIs

 

Marco Antônio Carvalho

Luiz Carlos Pavão

André Borges / BRASÍLIA

 

O Brasil registrou ontem 2.349 mortes pela covid-19 em 24 horas. A marca, recorde na pandemia, aprofunda a crise do País, que conta com sistemas de saúde cada vez mais pressionados e ritmo lento de vacinação. O Distrito Federal, por exemplo, reportou ontem à tarde 100% de ocupação dos leitos de UTI. O total nacional de óbitos chegou a 270.917, segundo dados reunidos pelo consórcio da imprensa.

Nas últimas duas semanas, o Brasil viu a média diária de óbitos saltar 43%. Há 14 dias, em 25 de fevereiro, o número estava em 1.150. Agora está em 1.645, o maior da pandemia. A média móvel leva em consideração dados dos últimos sete dias e capta melhor a tendência de variação nos registros. No País, essa curva tem crescido em um ritmo cada vez mais acelerado.

Em 1.º de janeiro, por exemplo, a média diária de mortes estava em 704. Na época, especialistas alertaram para efeitos de aglomerações das festas de Natal e réveillon, além de viagens de verão. Comparado com o número atual, o aumento é superior a 130%, mais do dobro. Em janeiro, a crise se alastrou por Manaus e o interior do Amazonas, chegando a causar desabastecimento de oxigênio para pacientes. Agora, a crise está em todas as regiões.

O total de óbitos foi mais alto ontem em São Paulo (469). Os números de Goiás (267), Rio Grande do Sul (250), Paraná (243) e Minas (219) também ficaram acima das duas centenas.

As altas consecutivas têm feito Estados adotarem novamente medidas de restrição na tentativa de frear a propagação da doença. Em São Paulo vigora a fase vermelha, na qual atividades não essenciais foram fechadas, e o governo avalia ampliar ainda mais as restrições.

No Rio, o Estado cogita barrar a entrada de turistas – o secretário da Saúde, Carlos Alberto Chaves, manifestou incômodo com praias cheias e disse que a restrição é discutida pelo governo. No Rio Grande do Sul, todas as cidades estão sob bandeira preta, de risco altíssimo. Apesar das medidas, ainda são registrados flagrantes de desrespeito às regras de isolamento e aglomerações.

“Temos distribuição mais uniforme do momento pandêmico e justamente quando a população está cansada dessas medidas de isolamento, com o auxílio emergencial suspenso (a liberação do dinheiro está em discussão entre Congresso e Executivo), o que impossibilita a muitos dos brasileiros ficar em casa”, diz o infectologista Renato Kfouri, da Sociedade Brasileira de Imunizações (Sbim). Ele também destaca o risco de variantes do vírus, como a de Manaus (P.1). Estudos preliminares já mostraram que essa nova cepa é mais transmissível.

“Acho que nossa população, por questões políticas, não está atendendo a essas normas (de restrição). Por isso, infelizmente temos de ser mais rigorosos com as fiscalizações, a proibição de festas e aglomerações. Isso resulta em falta de leitos, mortes desnecessárias. As mesmas pessoas que querem se aglomerar vão chorar depois porque o pai ou a mãe morreu à espera de atendimento”, diz Mônica Levi, também da Sbim. “Falta um governo federal que tenha responsabilidade de orientar quais as diretrizes que deveriam ser tomadas em todas as regiões e com ações pontuais em locais que precisem de atenção maior”, aponta ela, que também critica falhas do planejamento da gestão Jair Bolsonaro para a compra de vacinas.

“Houve sérias negligências sanitárias após o curto tempo de ‘respiro’ que a epidemia deu no fim do ano passado. Vemos a expansão da doença em todo o Brasil, colapsando até a rede privada”, diz Anderson Sena Barnabé, doutor em epidemiologia pela USP e professor da Universidade Cruzeiro do Sul.

O recrudescimento da doença tem feito governadores pressionarem o Executivo federal por mais vacinas – ontem, o número de imunizados com a primeira dose chegou a 9 milhões, 4,2% da população, segundo o consórcio da imprensa. Os líderes estaduais se mobilizam com a intenção de negociar por conta própria a aquisição de doses junto aos laboratórios. Em reação, Bolsonaro tenta acelerar acordos com mais farmacêuticas. Ontem, em mudança de postura, apareceu em evento público usando máscara.

 

Brasília. Na capital federal, mensagens enviadas por trabalhadores dos principais hospitais dão conta de que há filas de mais de 20 horas para conseguir atendimento. Ontem, ao menos 214 pessoas esperavam por vaga em UTI no DF, segundo dados obtidos pelo Estadão, com base em levantamento da Secretaria de Saúde.

Apesar do quadro, o governador Ibaneis Rocha (MDB) afrouxou na sexta-feira, mais uma vez, as medidas de combate à doença que havia determinado no fim de fevereiro. Em novo decreto, liberou academias de esporte de todas as modalidades. Também permitiu aulas presenciais em todas as creches, escolas, universidades e faculdades da rede privada./ COLABOROU FÁBIO GRELLET

 

Tendência de alta

469 óbitos

foram relatados só em São Paulo. Os números de Goiás (267), Rio Grande do Sul (250), Paraná (243) e Minas (219) também ficaram acima das duas centenas, apesar do avanço de restrições.