Correio Braziliense, n. 21198, 08/06/2021. Política, p. 2

No rastro do gabinete paralelo
Bruna Lima
08/06/2021



CPI ouve novamente o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, na expectativa de obter mais elementos sobre colegiado que assessorava Bolsonaro no enfrentamento à pandemia. Comissão votará pedido de convocação de Osmar Terra e de médico, que integrariam o grupo

A CPI da Covid ouve hoje, pela segunda vez, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga. Apesar de o gestor avaliar que não há informações novas a serem prestadas, o depoimento promete trazer mais elementos sobre o gabinete paralelo — grupo que prestaria assessoria ao presidente Jair Bolsonaro no enfrentamento à pandemia. Os senadores devem votar, também, quebra de sigilos e convocações para aprofundar as investigações sobre o assunto.

Apesar de a confirmação do Brasil como sede da Copa América ter sido o estopim para antecipar o novo depoimento de Queiroga, o tema não deve ser foco da nova oitava, mas corrobora a tese de que falta autonomia para o ministro gerir a própria pasta. "Esse episódio, em que ele se calou como ministro da Saúde e preferiu ser ministro do silêncio, demonstrou, de uma outra forma, que a autonomia realmente não existe", afirmou o relator, Renan Calheiros (MDB-AL).

O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), apontou outros indícios da falta de comando de Queiroga no ministério: o titular da pasta não pôde nomear a médica infectologista Luana de Araújo para chefiar a Secretaria Extraordinária de Enfrentamento à Covid-19. O nome dela foi vetado pelo Palácio do Planalto. "Ele (Queiroga) não consegue nomear a doutora Luana, que é uma infectologista, mas mantém a doutora Mayra, que tem pensamento contrário ao dele", lembrou Aziz, em entrevista exclusiva ao Correio, referindo-se à secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro, conhecida como Capitã Cloroquina.

Aziz enfatizou, ainda, que há novos questionamentos a serem sanados por Queiroga, sobretudo em relação à recomendação do uso de cloroquina em pacientes com covid-19, apesar de o medicamento não ter eficácia comprovada contra a doença. Na primeira oitava, o ministro alegou não poder se posicionar porque o assunto estava sendo deliberado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec). "A gente quer saber do ministro Queiroga por que, até hoje, a Conitec não se posicionou em relação à cloroquina. Se ele não tem autonomia, alguém está mandando a Conitec não se posicionar. Temos de saber o porquê", disse Aziz (leia mais declarações do senador na página ao lado).

Na semana passada, ao Correio, Queiroga afirmou que os protocolos de tratamento já estão sendo deliberados na comissão. "Pelo decreto que regulamenta a Conitec, o ministro é uma instância recursal. Então, se houver um questionamento acerca de algum desses protocolos, aí o ministro pode ali, fundamentando a sua decisão, fazer algum tipo de observação. Neste momento é prematuro", frisou, indicando que manterá a alegação do primeiro depoimento. Na avaliação do titular da Saúde, já foram feitos "os esclarecimentos devidos". "Se os parlamentares acham que eu posso contribuir neste momento, estou à disposição", acrescentou.

Assessoramento

Na investigação sobre o gabinete paralelo, a CPI votará as convocações do deputado federal Osmar Terra (MDB-RS), ex-ministro da Cidadania, e do médico Paolo Zanotto. Isso porque, em setembro de 2020, ambos participaram de um encontro no Palácio do Planalto em que se defendeu o uso da cloroquina como tratamento precoce, colocando a vacinação em segundo plano.

Para o vice-presidente a CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Terra atuava como um "mentor intelectual do grupo", enquanto Zanotto teria uma "certa intimidade com o presidente Bolsonaro", o que justificaria a oitava, já que o médico aconselha o mandatário a ter "extremo cuidado com as vacinas".

São 24 requerimentos na pauta, incluindo a convocação de seis testemunhas. Na lista, está a médica Ludhmila Hajjar, que chegou a ser chamada para assumir o Ministério da Saúde, após a demissão do general Eduardo Pazuello, mas desistiu do convite.