Correio Braziliense, n. 21209, 19/06/2021. Brasil, p. 6

Queiroga desconfia da vacina; de Bolsonaro, não
Maria Eduarda Cardim
19/06/2021



Ao contrário daquilo que disse na CPI, ministro faz "ginástica" retórica e concorda com presidente ao dizer que não "se tem ainda todas as evidências científicas" sobre o alcance das vacinas. E se justifica afirmando que é necessário "contestar tudo"

Depois de contradizer Jair Bolsonaro durante depoimento na CPI da Covid, ressaltando ineficácia dos medicamentos do chamado "kit covid" no combate ao novo coronavírus e incentivando a vacinação da população, Marcelo Queiroga defendeu as dúvidas lançadas pelo presidente sobre as evidências científicas de que os imunizantes são a arma mais eficiente contra o novo coronavírus. O ministro da Saúde disse que Bolsonaro tem razão quando fala que "não se tem ainda todas as evidências científicas" dos imunizantes.

"O presidente Jair Bolsonaro fala que não se tem ainda todas as evidências científicas e se interpreta que o presidente está questionando as vacinas. Nós temos que questionar tudo. Ainda não se tem todas as evidências científicas mesmo não", afirmou Queiroga, durante evento no Rio de Janeiro, que divulgou o novo calendário da vacinação na cidade.

Para exemplificar, Queiroga citou que ainda não se sabe "se podemos vacinar um indivíduo com a vacina de uma marca e dar a segunda dose com outra". "E como nós vamos saber disso? Fazendo pesquisa. E é por isso que essas pesquisas avançam. As crianças devem ser vacinadas? Como é a vacinação com gestantes? Então, são respostas que precisam ser dadas", completou.

Contestação

Bolsonaro permanentemente põe em dúvida a credibilidade das vacinas, contestando a segurança e eficácia dos fármacos, já comprovadas por estudos clínicos e, pelo menos no caso da Pfizer, aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) — as demais estão autorizadas para aplicação por meio da permissão para uso emergencial. Em janeiro, ao falar com jornalistas em frente ao Palácio da Alvorada, Bolsonaro disse que ainda não está comprovado cientificamente que os imunizantes podem prevenir a população de contrair o novo coronavírus.

Na semana passada, o presidente voltou a questionar a eficácia das vacinas ao compará-las com os medicamentos do chamado "tratamento precoce", que não têm eficácia cientificamente comprovada contra a covid-19. "(Remédios do chamado tratamento precoce) não têm comprovação científica. Eu pergunto: a vacina tem comprovação científica ou está em estado experimental ainda? Está (em estado) experimental", disse.

Apesar de defender os questionamentos e a posição de Bolsonaro em relação à vacina, Queiroga ressaltou que elas são a esperança, já que o momento da pandemia que o país vive ainda inspira cuidados. "Hoje, a média móvel de óbitos está abaixo de 2 mil, ainda é um número alto, que temos que reduzir. E nós temos, hoje, uma esperança, que são as vacinas", disse.

O ministro reforçou o compromisso de imunizar toda a população brasileira adulta com as duas doses até o fim do ano. "Nós já anunciamos que, até o final do ano, toda a população brasileira acima de 18 anos estará vacinada e podemos anunciar isso por, conta do nosso Programa Nacional de Imunização", reforçou.

A meta de Queiroga é aplicar pelo menos a primeira dose em todos os adultos até setembro. Assim, a população conseguiria receber a segunda dose até o final de 2021, pois o maior prazo entre a primeira e a segunda doses são 12 semanas.

Queiroga brincou, ainda, sobre a "corrida das vacinas", que vem sendo disputada por alguns governadores e prefeitos. "O Oswaldo Cruz enfrentou a Revolta da Vacina, (na qual) as pessoas não queriam se vacinar. Hoje, nós vivemos a 'guerra das vacinas'. Tem a boa guerra e a má guerra", brincou.