Correio Braziliense, n. 21215, 25/06/2021. Política, p. 2

Empresa atuou em embaixada por Covaxin
25/06/2021



Alvo da CPI da Covid, o empresário Francisco Maximiano, sócio da empresa Precisa Medicamentos, representante no Brasil do laboratório indiano Bharat Biotech, se reuniu com o embaixador do Brasil na Índia, André Aranha Corrêa do Lago, em 6 de janeiro deste ano, com a Associação Brasileira das Clínicas de Vacinas (ABCVAC), para discutir, entre outros pontos, a aquisição de doses para clínicas privadas. O telegrama, enviado ao colegiado e obtido pelo Correio, menciona que a parceria com a Bharat ajudaria a romper "oligopólio" de empresas no Brasil e cita até conversas no Ministério da Economia para uma possível linha de crédito destinada a clínicas privadas para a compra da vacina.

O governo brasileiro assinou um contrato com a Precisa, em 25 de fevereiro, no valor de R$ 1,6 bilhão para aquisição de 20 milhões de doses da Covaxin, sem que a Bharat Biotech sequer tivesse estudo clínico (fase 3) aprovado no Brasil. E desde janeiro, o Executivo considerava a vacina para o Programa Nacional de Imunização (PNI).

A reunião entre a Precisa e a comitiva da ABCVAC com representantes do Itamaraty se deu, inclusive, dois dias antes de o presidente Jair Bolsonaro enviar uma carta ao primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, afirmando que a candidata estava "entre as vacinas selecionadas pelo governo brasileiro", mesmo sem qualquer aprovação na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e sem estar entre os imunizantes cujos estudos eram realizados no Brasil.

O contrato é alvo de investigação na CPI devido à insistência do governo em obter a vacina, enquanto outras, com estudos avançados no país, foram deixadas em segundo plano.
Na reunião, segundo o embaixador, integrantes da "missão da ABCVAC" relataram um programa de visita a empresas indianas produtoras de vacinas, "com a intenção de viabilizar a aquisição de doses para clínicas privadas". Maximiano dialogou com André Aranha Corrêa do Lago como representante da delegação.

"Maximiano salientou que uma parte das vacinas será adquirida por clínicas privadas, que atendem a convênios e, em sua opinião, acabam por desonerar o sistema público de saúde. Aludiu a conversas com o Ministério da Economia sobre a eventual abertura de linhas de crédito para que clínicas privadas pudessem adquirir vacinas contra a covid-19", relata o embaixador.

Conforme descrição do telegrama, Maximiano também criticou um "oligopólio" de empresas tradicionais, citando a Pfizer. O empresário disse, segundo o embaixador, que "cerca de 90% do fornecimento para o mercado de vacinação privada no Brasil é dominado por três companhias tradicionais (GSK, Pfizer, Sanofi)". O empresário ainda sustentou que "a missão à Índia e a parceria com a Bharat ajudariam a romper esse oligopólio".

Conforme a ABCVAC, a viagem foi feita "a convite da Precisa Medicamentos" com o intuito de "conhecer as instalações da Bharat Biotech e dar início às tratativas para viabilizar a importação da Covaxin direcionada ao mercado privado".

A diretoria da associação ressaltou não ter "nenhuma ligação com os trâmites entre a empresa e o governo, e que os acordos firmados para o mercado privado têm andamentos completamente distintos das compras governamentais". Procurada, a Precisa não comentou o assunto até o fechamento desta edição.