Título: Quando o barato acaba saindo caro
Autor: Natalie Geller e Eduardo Shor
Fonte: Jornal do Brasil, 21/03/2005, Caderno B, p. B3

A pirataria atinge, no Brasil, diversos segmentos do comércio, usurpando do país US$ 30 milhões em impostos e 4,5 milhões em empregos, segundo a Federação do Comércio do Estado do Rio de Janeiro (Fecomércio-RJ). De acordo com dados da International Intellectual Property Alliance (IPPA), a indústria brasileira de software perde, por ano, US$ 400 milhões; a fonográfica, US$ 300 milhões; e a cinematográfica, US$ 130 milhões com a pirataria.

A questão da pirataria é cada vez mais séria, pois sua prática pode determinar o fim da cultura artística musical, literária e científica do país. Sua punição está prevista no artigo 184 do Código Penal, que caracteriza prática de crime contra o direito autoral a reprodução ilícita de obra intelectual; ou seja, reprodução sem autorização expressa do autor ou de quem o represente, com finalidade lucrativa.

Além disso, em seu inciso dois, pune a distribuição desses produtos ao consumidor, preservando o interesse público e as relações de consumo. De fato, a falsificação, a duplicação, a sonegação, o contrabando e o descaminho trazem efeitos altamente nefastos para o Brasil, como aumento da criminalidade, queda da arrecadação tributária, desvio de impostos, prejuízos à atividade econômica lícita, estímulo à lavagem de dinheiro e desemprego.

A pirataria de software, por exemplo, não só causa um impacto econômico negativo em sua própria indústria, como também na economia internacional, pois reduz os fundos disponíveis para pesquisas e desenvolvimento de novos produtos. Segundo a International Data Corporations (IDC Corp.), a taxa mundial de pirataria nesse ramo de atividade é de 39%, o que reflete uma perda de US$ 13 bilhões para os desenvolvedores de software comerciais.

Em 2003, foi publicada no Diário da Justiça uma decisão do STJ condenando duas pessoas ao pagamento de multa equivalente a três mil vezes o valor do software pirateado, conforme previsão existente no artigo 103 da Lei nº 9.610/98 - Lei de Direitos Autorais (Resp 443119/RJ, publicado no Diário da Justiça de 30/6/2003). Foi uma decisão inovadora, já que as decisões anteriores estipularam indenizações bem abaixo desse valor.

Outro ramo afetado é o da indústria fonográfica, que, desde 1995, vem investindo milhões de reais em atividades de investigação e denúncia de casos de pirataria. Nos últimos quatro anos, houve cerca de 3.500 ações, com apreensão de cerca de 36 milhões de CDs pirateados, entre gravados e virgens. Nessa indústria, os índices de pirataria ultrapassam 95% das fitas cassetes e 35% dos compact disc. Isso quer dizer que, a cada cem fitas vendidas, 95 são pirateadas.

Devido à magnitude do problema, foi criada, em 2004, a CPI da pirataria. Segundo números de institutos de pesquisa remetidos à CPI, se o índice de falsificação fosse reduzido pela metade, ou seja, 27%, o mercado legalizado de CDs cresceria 38%, gerando 30 mil novos postos de trabalho e mais de R$ 90 milhões em impostos.

No entanto, instituiu-se, no Brasil, a prosélita justificativa dessa prática. A pirataria é uma forma de gerar trabalho e atender a um mercado de consumo, facilitando o acesso do consumidor a produtos mais baratos. Por esse motivo, a sociedade não reclama. Concomitante à falta de engajamento do poder público, o não-desenvolvimento de um sistema legal que coíba a ação dos produtos piratas e a falta de valorização do direito intelectual são fatores que aumentam o lucro nas mãos de poucos e desestabilizam o mercado, desintegrando o social.

A pirataria, no entanto, ainda é vista em nossa sociedade como um delito pequeno. Muitos indivíduos a ela ligados o fazem por não encontrarem outra forma de sustento ou, muitas vezes, por falta de conhecimento de que se constitui em crime previsto no Código Penal Brasileiro. Enquanto os consumidores reclamam dos altos preços dos produtos em lojas e departamentos, as empresas legalmente constituídas alegam que os custos de aluguel, os operacionais e os royalties encarecem os produtos. Além disso, com as perdas que sofrem pela movimentação no mercado negro, não possuem alternativa, senão a de repassarem os prejuízos para o preço final do produto, o que leva a um ciclo interminável.

Portanto, é necessária uma política mais eficaz no combate à pirataria. Isso porque a proteção dos direitos de propriedade intelectual garante a continuação de um mercado rico, diversificado e competitivo. Deve-se minimizar esse flagelo nacional através de uma política socioeconômica, com educação e leis a serem obedecidas, para que sejam resgatados as proteções do direito de autor e da concorrência e os valores éticos e morais do cidadão.