Correio Braziliense, n. 21230, 10/07/2021. Política, p. 4

Erros em excesso no contrato da Covaxin
Bruna Lima
Sarah Teófilo
Luiz Calcagno
10/07/2021



À CPI da Covid, o consultor técnico William Santana diz ter se recusado a dar andamento à importação da vacina indiana por causa da série de inconsistências na documentação

O depoimento do consultor da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) que atua no Ministério da Saúde William Amorim Santana, ontem, à CPI da Covid reforçou a estranheza sobre os erros identificados na invoice (nota fiscal internacional) da vacina indiana Covaxin, assim como avalizou relato do servidor da pasta Luis Ricardo Miranda de que sofreu "pressões atípicas" para liberar a importação do imunizante. A vacina é produzida pelo laboratório indiano Bharat Biotech, representada no Brasil pela Precisa Medicamentos, alvo da CPI.

Santana atua na Divisão de Importação, chefiada por Miranda. À CPI, ele relatou ter identificado erros na invoice. "Não é comum. Não nessa quantidade (de erros)", frisou. O consultor afirmou que Miranda relatou ter sofrido pressões por parte da "chefia dele" — no caso, o tenente-coronel Alex Lial Marinho, então coordenador-geral de Aquisições de Insumos Estratégicos para Saúde.

A oitiva foi quase completamente sobre a análise da invoice, um dos pontos de maior questionamento na CPI. Isso porque, mesmo com os erros, a vacina teve autorização para ser importada, concedida pela fiscal do contrato de compra, Regina Célia Oliveira. Ela, no entanto, nega ter respaldado o documento.

Segundo Santana, a área onde atua recebeu o primeiro e-mail da Precisa em 16 de março, pedindo providências para a abertura da licença de importação, com o contrato em anexo. No dia 18, um segundo e-mail foi recebido, com a invoice. Nos erros apontados por Miranda e confirmados pelo consultor estão o pedido de pagamento antecipado de US$ 45 milhões; o número incorreto de imunizantes (três milhões, em vez de quatro milhões, como constava no contrato); e o nome de uma terceira empresa para receber o pagamento, Madison Biotech, sediada em Cingapura, que não estava no documento.

Amorim relatou que, em 18 de março, encaminhou o e-mail para a área de fiscalização, da servidora Regina Célia. No dia 22, Santana disse que submeteu novamente os documentos à área de fiscalização. "Até aquele momento, eu pontuei que a primeira parcela já se encontrava em atraso", afirmou, uma vez que a primeira entrega de vacinas deveria ter sido enviada no dia 17.

Mesmo com os problemas, Regina Célia permitiu a continuidade do processo. À CPI, ela afirmou que o seu aval foi apenas em relação ao quantitativo de vacinas. Segundo ela, em relação à divergência do nome da empresa, a análise caberia ao setor de importações. Santana e Miranda, entretanto, sustentaram que alertaram Regina Célia sobre divergência e a submeteram à servidora.

O primeiro e-mail enviado pela Precisa Medicamentos, em 16 de março, chamou a atenção dos senadores. O conteúdo diz: "Com a anuência da Secretaria-Executiva, peço auxílio na solicitação da primeira LI (liberação de importação) de embarque aéreo". Questionado se esse procedimento é normal em outros processos de importação dos quais ele participou, Santana disse que não. "Não, eu nunca recebi um e-mail de um fornecedor nesses termos", destacou. As apurações da CPI mostram que todas as negociações de vacinas contra covid-19 passavam pelo então secretário-executivo, coronel Elcio Franco.