Título: Descaso também com os mortos
Autor: Waleska Borges
Fonte: Jornal do Brasil, 23/03/2005, Rio, p. A15

Prefeitura não detalhou causas de mortes em hospitais em 2004. Especialistas dizem que sem dados não há planejamento

A Prefeitura do Rio ainda não sabe o número e as causas das mortes nos hospitais e unidades de saúde da cidade em 2004. Sem esses dados, segundo integrantes do Conselho Municipal de Saúde, o planejamento das ações na saúde fica às cegas. Representantes da classe médica denunciam que a morosidade no levantamento dos óbitos está relacionada à falta de pessoal. A estática é feita anualmente pela Coordenação de Programas de Epidemiologia da secretaria municipal de Saúde. O último levantamento, em 2003, mostra que 50.083 pessoas morreram no município. - Pedimos os números dos óbitos ao setor de epidemiologia, mas a informação era que os dados seriam disponibilizados apenas em julho, por falta de pessoal. Uma firma estaria sendo contratada para fazer o trabalho - indigna-se Getúlio Gomes, integrante do Conselho Distrital de Saúde de Santa Cruz.

Segundo Adelson Alípio, diretor do Conselho Municipal de Saúde, na sexta-feira, o órgão pediu ao Ministério Público estadual que cobrasse do município mais agilidade no levantamento das mortes.

- A demora na divulgação dos dados é um ato irresponsável. Com o levantamento, temos uma diagnóstico das mortes e podemos prever o planejamento das ações - explica Alípio.

De acordo com Getúlio Gomes, por meio do levantamento das mortes também pode-se traçar medidas sanitárias para evitar doenças como tuberculose e hanseníase que, segundo ele, têm crescido na Zona Oeste.

- Esperar até julho pode ser tarde demais. A ausência dos números prejudica a qualidade do atendimento - avaliou Gomes.

Segundo o deputado estadual Paulo Pinheiro (PT), presidente da Comissão de Saúde da Alerj, o atraso na divulgação dos números vem ocorrendo há dois anos. De acordo com o deputado, a comissão recebeu o levantamento de 2003 em outubro de 2004. Já os números de mortes de 2002 só foram divulgados em julho de 2003.

- Em 2003, morreram 1.369 menores com menos de um ano de idade, 920 deles não tinham completado um mês e deste total 671 morreram na primeira semana de vida - lembra Pinheiro.

Para o deputado, as mortes dos menores com menos de um ano revelam a má qualidade dos serviços de pré-natal e parto. Um outro dado de 2003, que chama a atenção, segundo o deputado, é o percentual do número de mortos residentes no município: 97,2%. Somados os mortos dos municípios de Duque de Caxias e São João de Meriti chegam a 0,8%.

- O número de mortos que moram no Rio desmente a informação da prefeitura que as internações de fora do município representa 35% - analisa Pinheiro.

Em 2003, o levantamento da prefeitura mostrou que a principal causa dos óbitos de residentes do município foi por doenças do aparelho circulatório. Foram registradas 13.965 mortes.

- Este dado aponta a falência do tratamento preventivo da hipertensão arterial - alerta o deputado.

Para o presidente do Sindicato dos Médicos do Rio, Jorge Darze, os números de mortes em 2004 podem apontar índice superior à média dos anos anteriores.

- A ausência do levantamento das mortes reflete a crise no gerenciamento da rede municipal de saúde - explica Darze.

A secretaria municipal de Saúde afirma que não há falta de funcionários para o trabalho de levantamento das mortes. Segundo o município, a demora na divulgação dos dados é por causa do grande volume de trabalho. Ainda segundo a prefeitura, desde janeiro, foram contratados quatro digitadores para auxiliar o trabalho de 12 funcionários. O levantamento é feito através dos registros de óbitos repassados ao município pelas unidades hospitalares e o Instituto Médico-Legal. O material deve ser concluído até o mês de abril.