Correio Braziliense, n. 21232, 12/07/2021. Política, p. 3

Foco nas negociações com intermediação
12/07/2021



É a partir dos depoimentos a serem realizados esta semana que os senadores da CPI pretendem dar robustez à hipótese de que vacinas negociadas com o Ministério da Saúde a partir de uma empresa intermediadora no processo são parte de um bilionário esquema de propina que beneficiou empresários, lobistas, políticos e membros da alta cúpula da pasta, incluindo militares.

Amanhã, os parlamentares ouvem a diretora técnica da Precisa Medicamentos, Emanuela Medrades. Representante oficial da Bharat Biotech, fabricante da vacina indiana Covaxin, a Precisa virou alvo da CPI por ter sido contratada pelo governo federal, mesmo com o preço mais caro entre as candidatas e sem qualquer aval da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), à época. Com o avanço das apurações, verificou-se que a empresa aumentou o faturamento em 6.000% nos três anos de governo Bolsonaro e que pertence ao empresário Francisco Maximiano, também sócio da Global. Em 2017, a Global fechou acordo de medicamento com o Ministério da Saúde e não honrou o contrato. O calote provocou um rombo de aproximadamente R$ 20 milhões aos cofres públicos.

Também convocado, Maximiano conseguiu habeas corpus no Supremo Tribunal Federal (STF) com direito a permanecer em silêncio durante o depoimento. Diante disso, os senadores priorizaram Emanuela, responsável oficial pela troca dos emails com o governo federal. A convocação de Emanuela Medrades foi requerida pelos senadores Otto Alencar (PSD-BA) e Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e aprovada pela CPI em 30 de junho, com transferência de sigilo telefônico e telemático da diretora da Precisa. O objetivo da convocação, segundo o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), é "esclarecer os detalhes de potencial beneficiamento da Bharat Biotech, representada no Brasil pela Precisa Medicamentos, na negociação de compra de vacinas pelo Ministério da Saúde".

Reverendo
Outra negociação suspeita na mira dos senadores diz respeito à oferta de 400 milhões de doses da AstraZeneca feita pela empresa Davati Medical Supply, que não apresentou comprovação de ser representante da farmacêutica. Após o depoimento do cabo da Polícia Militar Luiz Dominghetti, representante comercial que relatou pedido de propina de US$ 1 por dose de vacina, agora é a vez do reverendo Amilton Gomes de Paula, apontado como intermediador entre a Davati e o ministério e quem teria introduzido Dominghetti ao grupo.

Amilton dirige a Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários (Senah), uma entidade privada. Ele esteve presente em várias reuniões para negociar a vacina, sendo o responsável pelo envio da proposta, como afirmou o ex-diretor de Logística da Saúde Roberto Dias. O servidor saiu preso da sessão na última semana e é apontado como responsável pelo pedido de propina, versão dada por Dominghetti e negada por Dias.

Autor do pedido de convocação do reverendo, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) aponta que o valor apresentado pelo religioso, de US$ 17,50, era superfaturado. "Três vezes mais do que o Ministério da Saúde pagou em janeiro a um laboratório indiano. O valor também é bem maior do que o mencionado pelo policial militar Luiz Paulo Dominghetti, que se identifica como intermediário entre a Davati e o Ministério da Saúde na mesma negociação de 400 milhões de doses. Ele informou que o valor da vacina vendida era de US$ 3,50", argumenta.

Para encerrar a semana, a CPI deve ouvir o coronel Marcelo Blanco, ex-diretor-substituto de Logística do Ministério da Saúde, que também seria uma das figuras envolvidas nas negociações junto à Davati. Ele também estava presente no jantar da propina.