Correio Braziliense, n. 21254, 03/08/2021. Política, p. 3

Presidente faz acusações a Barroso
Jorge Vasconcellos
03/08/2021



O presidente Jair Bolsonaro voltou a dirigir ofensas ao presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso. Ele acusou o magistrado de se opor à proposta de emenda à Constituição (PEC) do voto impresso na intenção de fraudar as eleições de 2022. O chefe do Executivo também disse que Barroso precisa "baixar a crista" porque não é "intocável".

"O que o Barroso quer? Ele quer as eleições que possam ser manipuladas, ou, no mínimo, gerar dúvidas no futuro. Nós não queremos isso. Nós queremos o voto democrático, eleições democráticas, em que a vontade popular passe a valer de fato", disse Bolsonaro, em entrevista, ontem, à Rádio ABC, do Rio Grande do Sul.

O chefe do Planalto também voltou a usar informações falsas, entre as quais a de que a urna eletrônica não é auditável. "Não pode meia dúzia de servidores, com o presidente do TSE, o ministro Barroso, contar os votos numa sala secreta, onde ele anuncia o resultado que achar que é o verdadeiro, porque as urnas não são auditáveis, e fica por isso mesmo", afirmou. "O povo brasileiro não vai aceitar uma eleição, realmente, sob suspeição", acrescentou, sem, mais uma vez, apresentar provas da vulnerabilidade do sistema eletrônico de votação.

Bolsonaro voltou a acusar o presidente do TSE de interferir na tramitação da PEC do voto impresso na Câmara. A proposta, de autoria da deputada bolsonarista Bia Kicis (PSL-DF), deve ser derrotada na comissão especial da Casa, em votação marcada para quinta-feira. Dos 34 membros do colegiado, pelo menos 20 são contra mudanças no sistema de votação.

"Estava tudo certo para aprovar (a PEC) na comissão especial, o senhor Barroso vai para dentro do Parlamento brasileiro, se reúne com vários líderes e, depois da reunião, a maioria desses líderes troca os integrantes da comissão por aqueles que vão votar contra a PEC do voto impresso. É uma interferência clara no que está acontecendo", sustentou.

O presidente disse, também, que Barroso precisa compreender os limites de sua atuação. "Ele virou semideus? Acha que é intocável? Quem o seu Barroso pensa que é?", questionou. "Todos os poderes têm limites, eu tenho limites. Por que alguns do Supremo acham que são donos da verdade e que podem tudo, e ninguém pode reclamar de nada? Ele tem que baixar a crista dele um pouquinho e se adequar à realidade."

O chefe do Executivo que insiste ter havido fraudes nas eleições de 2014 e 2018, mas não apresenta provas, agora passou a jogar suspeitas sobre o pleito municipal de São Paulo no ano passado. Na disputa, o então prefeito Bruno Covas (PSDB) se reelegeu — o político tucano morreu em maio deste ano.

"O pessoal me cobra prova de fraudes. Olha, os indícios que levam à prova. Em São Paulo, as eleições do ano passado na capital, com 0,39% (de urnas apuradas), o sistema travou e ficou parado por mais de uma hora. Quando parou, tinha uma classificação do primeiro ao oitavo com um percentual de votos. Quando destravou, esses mesmos, nessa ordem, foram mantidos e, mais ainda, com os mesmos percentuais. Isso é impossível acontecer. Quer indício maior do que esse de que as eleições de São Paulo foram mais do que suspeitas?", argumentou.

Bolsonaro vem intensificando o discurso contra o sistema eleitoral em um momento de grandes dificuldades para o seu projeto de se reeleger em 2022, incluindo baixos índices de popularidade. Além disso, as pesquisas de intenção de voto mais recentes apontam para o favoritismo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), seu principal adversário político. Nos ataques ao ministro Barroso, o presidente tem acusado o magistrado de fazer parte de um complô para levar o petista de volta ao governo.