Valor Econômico, n. 5237, 28/04/2021. Política, p. A10

 

Aceno de Bolsonaro tem efeito nulo no TCU

Murillo Camarotto

28/04/2021

 

 

Dos nove integrantes da corte, três compareceram ao encontroe outros três participaram por videoconferência

Ministros do Tribunal de Contas da União (TCU) que estiveram na manhã de ontem com o presidente Jair Bolsonaro classificaram o encontro como “dócil” e “respeitoso”, porém “inútil” e “irrelevante”. A ideia de Bolsonaro e de seus principais ministros era fazer um aceno ao tribunal, que está investigando temas sensíveis ao governo, como as políticas de enfrentamento à pandemia e o Orçamento de 2021.

Aos presentes, o presidente manifestou sua preocupação com os efeitos da pandemia sobre a economia e o desemprego. Também afirmou que eventuais erros cometidos ao longo da crise sanitária não foram intencionais, numa linha semelhante à que deve ser adotada pelos governistas na CPI da pandemia.

Foram ao Palácio do Planalto apenas três ministros: Jorge Oliveira, Augusto Nardes e Raimundo Carreiro. Os dois primeiros são os principais aliados de Bolsonaro na corte, enquanto que o último recebeu a proposta de assumir uma embaixada no exterior e, assim, ceder o cargo para alguém simpático ao presidente.

Carreiro chegou a topar a proposta do governo, mas, ao perceber que a indicação poderia ficar presa no Senado, sinalizou a colegas que não teria aceitado.

Outros três ministros do TCU acompanharam a reunião por videoconferência: Bruno Dantas, Benjamin Zymler e Walton Alencar. A presidente do tribunal, Ana Arraes, bem como os ministros Vital do Rêgo e Aroldo Cedraz, não participaram.

Impressionou mal o formato do convite feito pelo Planalto, que soou como uma tentativa de constranger o TCU e evitar punições mais severas. O governo vem descumprindo uma série de determinações para o envio de informações sobre o combate à pandemia.

Uma delas, revelada no ano passado pelo Valor, foi o uso da Advocacia-Geral da União (AGU) para um recurso contra a determinação de encaminhar um cronograma detalhado do Programa Nacional de Imunizações.

“Não adianta ser cordial e não responder às demandas da área técnica. O tribunal são os auditores, os ministros e o Ministério Público", disse um participante do encontro com Bolsonaro.

Durante a reunião, representantes do governo chegaram a dizer que o Ministério da Saúde enfrenta problemas operacionais e de pessoal históricos, que dificultam o processo de coleta e disponibilização de dados.

Acompanharam Bolsonaro os ministros Luiz Eduardo Ramos (Casa Civil), Marcelo Queiroga (Saúde), Paulo Guedes (Economia), Fábio Faria (Comunicações), General Heleno (GSI) e Onyx Lorenzoni (Secretaria-Geral).

Um dos articuladores da defesa do governo na CPI, Onyx disse aos ministros do TCU que o Supremo Tribunal Federal tolheu os poderes de Bolsonaro para combater a pandemia, o que também foi criticado nos bastidores.

Há duas semanas, o plenário do TCU se preparava para aprovar uma ampla investigação contra gestores do Ministério da Saúde, entre os quais Eduardo Pazuello, quando pedidos de vistas apresentados por Nardes e Oliveira adiaram a votação.

O ex-ministro de Bolsonaro, recém-nomeado, chegou a dizer que temia que o TCU extrapolasse as suas atribuições na fiscalização do governo. O caso deve voltar à pauta no dia 12 de maio.