Correio Braziliense, n. 21260, 09/08/2021. Política, p. 2

Voto impresso entra em semana decisiva
Luiz Carlos Azedo
09/08/2021



Presidente da Câmara, Arthur Lira, define com colégio de líderes a votação da proposta defendida pelo Planalto. Expectativa é de que o plenário se posicione amanhã, com provável rejeição da PEC. Governo deve apresentar MP do Auxílio Brasil e PEC dos Precatórios

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), terá um encontro na manhã de hoje com o presidente Jair Bolsonaro, no Palácio do Planalto. Na agenda oficial, o assunto é a Medida Provisória do Auxílio Brasil, o novo programa social do governo, que substituirá o Bolsa Família, no valor de R$ 300. Nos bastidores, porém, Bolsonaro pressiona Lira para aprovar a PEC 135/19, que propõe a volta do voto impresso, de autoria da deputada Bia Kicis (PSL-DF).

À tarde, Lira também terá uma reunião do colégio de líderes, no qual pretende marcar a votação em plenário da proposta, que já foi rejeitada na Comissão Especial encarregada de examiná-la. A expectativa é de que a votação ocorra amanhã. Na sexta-feira, o presidente da Câmara sinalizou a disposição de definir o assunto. "Para que possamos trabalhar em paz até janeiro de 2023, vamos levar o voto impresso para o Plenário, para que todos os parlamentares possam decidir, estes que foram eleitos pelo voto eletrônico, diga-se de passagem", disse.

Arthur Lira é um dos responsáveis pela polêmica. Defendeu a proposta em Alagoas, durante visita do presidente Jair Bolsonaro, e anunciou que a colocaria em votação na Casa, formando uma comissão especial para isso. Desde então, o presidente da República faz sucessivos ataques à urna eletrônica e, numa escalada, entrou em rota de colisão com o Supremo Tribunal Federal, especialmente os ministros Luís Roberto Barroso, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, e Alexandre de Moraes, relator do inquérito das fake news, no qual Bolsonaro passou a ser investigado. Lira nunca se pronunciou contra o voto impresso, embora saiba que a maioria dos partidos já decidiu derrubar a emenda constitucional.

A deputada Bia Kicis, autora da proposta de voto impresso, lidera a mobilização dos bolsonaristas no Congresso para aprovação de sua emenda constitucional. Reverbera as acusações sem provas de Bolsonaro, de que o sistema eleitoral possibilita fraudes. "O povo não confia nas urnas eletrônicas sem o registro físico do voto e sem a contagem pública do voto. Alguns agora chamam de golpe, de falcatrua, mas, na verdade, o Congresso sempre foi favorável a isso", argumenta Kicis. Contrária à proposta, a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) fez as contas da logística necessária para viabilizar o voto impresso: "Os votos serão apurados por 1 milhão e 800 mil mesários, em 500 mil sessões, transportados por agentes de segurança, transportados em carros. Isso é ridículo!". É esse debate que vai reverberar no Congresso nesta semana.

Fora das prioridades
A PEC do voto impresso determina que, independentemente do meio empregado para o registro dos votos em eleições, plebiscitos e referendos, será "obrigatória a expedição de cédulas físicas conferíveis pelo eleitor". Na quinta-feira, porém, a proposta foi rejeitada por 23 a 11, ficando o deputado Raul Henry (MDB-PE), novo relator escolhido pela Comissão Especial, de elaborar um novo parecer contra a proposta, que foi aprovado por 22 a 11, na sexta-feira. "A população brasileira, depois de 25 anos da utilização da urna eletrônica, reconhece e testemunha a conquista que ela representa", justificou Henry. "Diferentemente do período em que o voto era em papel, não há nenhuma confirmação de uma única fraude nesse período", acrescentou.

Segundo o parlamentar, a proposta de voto impresso é um assunto completamente fora das prioridades do país. "O Congresso deveria discutir as reformas tributária e administrativa, para modernizar o país e atrair investidores estrangeiros. O presidente Bolsonaro desperdiçou a oportunidade de aprová-las e está criando uma crise político-institucional", escreveu o emedebista.

Em circunstâncias normais, o parecer de Raul Henry seria o suficiente para o arquivamento da proposta. Em nove páginas, o parlamentar mostrou o risco potencial de fraudes devido à manipulação de comprovantes em papel; os empecilhos derivados do acoplamento de impressoras às atuais urnas eletrônicas; e os efeitos diversos sobre o processo eleitoral e os partidos, entre outros. Mesmo assim, o novo relator avaliou que o presidente da Câmara agiu corretamente ao levar o assunto para o plenário. "É uma polêmica sem sentido, mas que tomou conta das redes sociais e desperta radicalismos e ódios. Precisamos encerrar esse assunto logo", alegou.

Pressionado por Bolsonaro, Arthur Lira (PP-AL) pretende negociar com os líderes de bancada a data da votação. O líder do Cidadania, deputado Alex Manente, avalia que o colégio de líderes proporá que a votação seja realizada nesta terça-feira. "Existe ampla maioria na Câmara contra a proposta do voto impresso, precisamos enterrar esse assunto. A votação na Comissão Especial reflete o posicionamento da maioria dos partidos, que será confirmado em plenário", afirma. Em sua manifestação oficial sobre o tema, Lira disse que a decisão de levar a PEC do voto impresso para o Plenário garante a tranquilidade para as próximas eleições.

Auxilio e precatórios
No encontro com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), nesta manhã, o presidente Jair Bolsonaro fará a entrega da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que parcela os precatórios e da Medida Provisória do Auxílio Brasil, o programa social do governo que substituirá o Bolsa Família. Entretanto, ainda se não chegou a um acordo em relação ao valor do Auxílio. A equipe econômica quer limitar a R$ 300, para não romper o teto de gastos. Mesmo assim, o governo precisará parcelar os precatórios, cujo montante chega a R$ 89 bilhões neste ano.