Correio Braziliense, n. 21262, 11/08/2021. Brasil, p. 6

Ribeiro: universidade deve ser "para poucos"
Maria Eduarda Cardim
Gabriela Chabalgoity
11/08/2021



Para ministro da Educação, instituições federais de ensino superior não são "tão úteis" para a população. E considera que há "muito advogado, muito engenheiro" trabalhando como motorista de aplicativo por não conseguir se colocar no mercado profissional

O ministro da Educação, Milton Ribeiro, acredita que a universidade federal "deveria ser para poucos". Ele defendeu esta posição em entrevista ao programa Sem Censura, da TV Brasil, na última segunda-feira. Para ele, as universidades não são "tão úteis para a sociedade" e que vê nos institutos federais — entidades eminentemente técnicas — o papel de protagonista da educação no futuro do Brasil. Além disso, ele acusou os reitores das universidades federais de serem "esquerdistas".

"Com todo o respeito que tenho aos motoristas, uma profissão muito digna, mas tem muito engenheiro, muito advogado dirigindo Uber porque não consegue a colocação devida. Mas, se ele fosse um técnico em informática, estaria empregado porque há uma demanda muito grande", disse Ribeiro, que citou a Alemanha como exemplo de país que investe mais em ensino técnico.

"Acho que o futuro são os institutos federais, como é na Alemanha hoje. Na Alemanha, são poucos os que fazem universidade. A universidade, na verdade, deveria ser para poucos, nesse sentido de ser útil à sociedade", completou.

Ribeiro disse, ainda, que viu avanço no diálogo com os reitores e que há conversas com todos os 69 das universidades federais. "Como eu vim da área da educação, aprendi que não é no meio da guerra que a educação pode progredir. Se a gente quiser discutir com professores a ideologia deles, a gente talvez nunca chegue a um consenso. Cada um tem a sua. Foi essa a primeira conversa que eu tive com alguns reitores das universidades federais", justificou-se.

Apesar de assegurar que respeita a posição ideológica dos gestores universitários, Ribeiro se contradisse ao afirmar que reitor de uma entidade pública não pode ser "esquerdista" ou "lulista". "Tenho pelo menos uns 20 a 25 reitores com que converso plenamente. Dez deles eu trouxe para visitar o presidente da República. Não digo que precise ser bolsonarista, mas não pode ser esquerdista, lulista. As universidades federais não podem se tornar comitê político de um partido, nem de direita e muito menos de esquerda", apontou.

Nomeações

A nomeação de reitores durante o atual governo tem sido alvo de críticas de instituições acadêmicas, já que o presidente da República nomeou, mais de uma vez, como reitor, candidatos não escolhidos pela comunidade e pelos conselhos da universidade. Em setembro do ano passado, Bolsonaro nomeou o terceiro colocado da consulta pública da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) como reitor. Em novembro, o presidente nomeou o terceiro colocado da lista tríplice para o comando da Universidade Federal da Paraíba (UFPB).

Para a professora Maria Beatriz Luce, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e diretora da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped), o conceito do ministro sobre para quem as universidades se destinam "evidencia preconceitos, desrespeito e contradição". "Não é respeitosa de preceitos fundamentais da democracia como a liberdade de pensar e de manifestação; afronta princípios constitucionais que regem a Educação como liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar, e pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas", avaliou.

Ela salientou, ainda, que "para nós, que compreendemos a educação como um 'bem público' que contribui para a promoção da equidade e da justiça social, edificada na ética, no respeito às culturas e ao meio-ambiente, é ultrajante o que foi dito (pelo ministro) sobre os profissionais da educação, as universidades federais e os reitores".

Frase

"Não digo que (o reitor) precise ser bolsonarista, mas não pode ser esquerdista, lulista. As universidades federais não podem se tornar comitê político"

Milton RIbeiro, ministro da Educação