Valor Econômico, n. 5243, 06/05/2021. Política, p. A6

 

Governo apoia, mas CCJ rejeita impeachment no STF

Raphael Di Cunto

Marcelo Ribeiro

06/05/2021

 

 

Placar foi apertado contra projeto que torna crime de responsabilidade a “usurpação de competência do Congresso” por ministros do Supremo

Apesar do apoio do governo Bolsonaro, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados rejeitou ontem, por 33 votos a 32, projeto de lei que torna crime de responsabilidade - sujeito a impeachment - a “usurpação de competência do Congresso” por ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

A proposta foi apresentada pelo deputado Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ) junto com outros integrantes da bancada religiosa e da segurança pública após o STF flexibilizar o entendimento sobre o porte de drogas, ampliar as hipóteses de aborto legal, permitir a união estável de casais do mesmo sexo, proibir o ensino doméstico e autorizar o uso de embriões para pesquisas com células-tronco.

O texto ganhou apoio do governo Bolsonaro, que teve uma série de medidas suspensas pelo STF, como os decretos para ampliar o porte de armas e a tentativa de impedir as restrições sanitárias para combater a covid-19.

A presidente da comissão, deputada Bia Kicis (PSL-DF), aliada dele, colocou o projeto na pauta de votações e o governo apoiou a proposta. “Sei que o Judiciário às vezes é demandado, mas é demandado pelos que perdem no plenário da Câmara. Não é justo que se vá ao STF, Poder que não se elegeu para legislar”, disse o deputado Giovani Cherini (PL-RS), que orientou pelo Executivo.

Caso o projeto fosse aprovado, qualquer cidadão poderia pedir ao Senado o impeachment dos ministros do STF quando considerasse que uma decisão “usurpou competência do Congresso”. Os parlamentares favoráveis defenderam que não haveria retaliação porque o julgamento seria feito pelos senadores. Já existem hipóteses para isso, como o ministro atuar em processo no qual a lei o declarar suspeito, quando quebrar o decoro ou se exercer atividade político-partidária.

O entusiasmo dos bolsonaristas com a aprovação, contudo, arrefeceu quando PSD e PP orientaram contra o projeto, grupo que se somou a oposição e ao PSDB. “O que estamos acompanhando hoje é uma tentativa de criminalização da atuação contramajoritária do Supremo Tribunal Federal e esse tipo de limitação irá recair sobre os ombros das partes mais fracas”, afirmou a deputada Margarete Coelho (PP-PI). No caso do PSD, deputados relataram que o presidente do partido, Gilberto Kassab, ligou pessoalmente para pedir que evitassem embate com o Supremo.

Deputados de oposição acusaram os aliados do presidente Jair Bolsonaro de tentarem cercear a atuação do STF. “Imaginei que seria na CCJ que iríamos conter essa sanha que tenta intimidar a Corte Constitucional do Brasil”, disse Orlando Silva (PCdoB-SP). “Isso é uma vingança”, concordou a deputada Sâmia Bomfim (Psol-SP).

A votação acabou com uma derrota apertada e o deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS) elaborará um parecer pela inconstitucionalidade da proposta. A votação desse parecer alternativo ficou para a próxima semana e bolsonaristas afirmaram que votarão contra essa versão, mas que há outros PLs na manga. “Tem outro projeto pronto para ser votado na CCJ que limita o Supremo em ações de inconstitucionalidade por omissão, que é justamente onde eles estão impondo suas convicções por normas abstratas”, disse o deputado Carlos Jordy (PSL-RJ).