Correio Braziliense, n 20613, 30/10/2019. Cidades, p. 22

Pressão pela CPI do Feminicídio
Darciane Diogo
30/10/2019



Mais de 20 mulheres reuniram-se na Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) ontem para reclamar da demora na abertura da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Feminicídio. Durante o ato, as manifestantes se concentraram em frente ao plenário, gritaram palavras de indignação e levantaram cartazes que diziam, entre outras coisas, “Parem de nos matar” e “CPI já”.

Proposta em 17 de setembro pelos deputados Fábio Félix (Psol) e Arlete Sampaio (PT), a CPI do Feminicídio contou com 21 assinaturas dos 24 deputados distritais para o requerimento de criação. O prazo para que os blocos indicassem os cinco componentes da comissão era de cinco dias, porém, 43 dias se passaram desde a data de aceitação da CPI pela presidência da Casa, e nada foi feito.

O deputado Fábio Félix acredita que há uma pressão do Executivo para que a comissão não seja instaurada. “Existem ações na CLDF que têm atrapalhado o andamento do processo, do ponto de vista regimental. Mas o fato é que temos uma motivação política e vamos lutar por isso. Acreditamos que o feminicídio é um fenômeno grave e complexo, que precisa da intervenção de diversos setores”, argumentou.

Segundo o distrital, a CPI seguirá um cronograma de trabalho que durará seis meses. “Nesse período, vamos visitar os serviços de atendimento às vítimas de violência doméstica, apurar as condições de investigação dos casos de feminicídio, fiscalizar o sistema judiciário e saber quais medidas o governo têm adotado para proteger as mulheres”, elencou.

Ao Correio, o chefe executivo de Assuntos Parlamentares do gabinete do governador Ibaneis Rocha (MDB), bispo Renato Andrade, disse que o governo tem interesse em resolver a questão de violência contra a mulher, mas que não considera necessária a instalação da CPI do Feminicídio. “A Secretaria de Segurança Pública tem desenvolvido um ótimo trabalho. Estamos oferecendo todo o suporte, tanto que todos os assassinos das vítimas estão presos”, justificou.

Questionado sobre a possível intervenção do Executivo na indicação dos nomes para compor a comissão, Renato Andrade garantiu que o governo não está fazendo movimentos para tirar nem colocar pessoas, mas que está aguardando apenas a publicação da mesa diretora da Câmara Legislativa.

Impasses

A princípio, os nomes indicados pelos blocos para compor a CPI do Feminicídio seriam: Arlete Sampaio (PT), Fábio Félix (Psol), Leandro Grass (Rede), Roosevelt Vilela (PSB) e Telma Rufino (Pros). Entretanto, o GDF não teria gostado da formação. Nesse contexto, os blocos teriam trocado os nomes de Arlete Sampaio, Leandro Grass e Telma Rufino pelos de João Hermeto (MDB), Cláudio Abrantes (PDT) e Rodrigo Delmasso (Republicanos), respectivamente.

As modificações geraram uma discussão entre os movimentos femininos, que alegaram a falta de representatividade da mulher na CPI. Por conta disso, os blocos recuaram e pediram mais tempo.

O presidente da CLDF, Rafael Prudente (MDB), prometeu uma reunião ainda nesta semana com os líderes de governo para começar, de fato, a indicação dos nomes que farão parte da equipe. “Estamos gerenciando, junto aos líderes, a participação feminina, porque precisamos de uma comissão que dê frutos, resultados e sugestões ao Executivo”, frisou.

Na luta

A professora de sociologia Ayla Viçosa, 25 anos, integra o movimento feminista Juntas e participou da manifestação na Câmara. Para ela, a instalação da CPI é um passo importante para diminuir as taxas de feminicídio no DF. “Muitas mulheres não conseguem sair da situação de violência por falta de infraestrutura do Estado. Várias delas foram mortas por homens com os quais não tinham vínculo familiar, então vemos mais necessidade de estrutura, como questões de iluminação, mobilidade urbana, entre outras”, destacou.

A produtora cultural Natália Stanzioni, 33, considera absurda a demora na instauração da comissão. “Nós, mulheres, temos de andar em estado de alerta 24 horas. Sabemos que não temos o direito de acordar às 5h e ir para uma parada de ônibus, por exemplo, pois estamos vulneráveis a qualquer ataque. Se essa CPI vai para frente, é um grande avanço no resguardo à integridade feminina.”

*Estagiária sob supervisão de Marina Mercante

Casos no DF

Até o momento, 27 mulheres foram vítimas de feminicídio em 2019 no Distrito Federal, segundo dados da Secretaria de Segurança Pública (SSP). Em 2018, o número de assassinatos desse tipo durante todo o ano foi de 28. O caso mais recente foi o da vendedora Noélia Rodrigues de Oliveira, 38 anos, assassinada em 17 de outubro com um tiro no rosto. O principal suspeito está preso, mas não confessou o crime. Almir Evaristo Ribeiro era vizinho da vítima, e a suposição da polícia é de que ele e Noélia tinham um relacionamento havia quatro meses.