Título: Transição demográfica
Autor: Rubens Vaz da Costa
Fonte: Jornal do Brasil, 29/03/2005, Outras Opiniões, p. A11

A história do crescimento da população no mundo é dividida em quatro estágios: o primeiro - denominado pré-moderno - marcado por taxas de natalidade e de mortalidade entre 35 e 50 por mil habitantes, subsistiu até o fim do século 18. O segundo - urbanização e industrialização - caracterizado por gradual redução da taxa de mortalidade de 35 para 15 e lenta queda na natalidade de 35 para 30 até meados do século passado no qual ocorreu o que se convencionou chamar de ''explosão populacional''. O terceiro - industrialização madura - com a queda da natalidade e da mortalidade para taxas em torno de 10, começou no fim do século passado e o quarto - pós-industrial - com taxas de fecundidade iguais ou inferiores a 2,1 e de mortalidade superiores às de natalidade; com a conseqüente diminuição da população.

Esta divisão é esquemática, sendo preciso entender que os estágios não são atingidos ao mesmo tempo em todos os países. Enquanto no presente várias nações já ingressaram no quarto estágio, outras ainda estão no segundo. Convém esclarecer ainda que a taxa de fecundidade - número de filhos por mulher - quando baixa a 2,1 a população tende à estabilização, - crescimento zero - que só será alcançada vários anos depois.

Em números o panorama é o seguinte: o primeiro bilhão de habitantes foi atingido por volta do ano 1800, o segundo em 1930, o terceiro em 1960, o quarto em 1974, o quinto em 1987 e o sexto em 1998. Daí a ''explosão populacional'', aumento de um bilhão de pessoas em pouco mais de uma década.

Os países industrializados apresentam fecundidade igual ou inferior a 2,1. Isto significa que estão entrando na fase final da ''transição demográfica'', ou seja, no declínio natural de sua população. O mesmo está acontecendo em vários paises emergentes. No Brasil, por exemplo, a fecundidade caiu para 2,1 no ano passado. Mas nossa população aumentará cerca de dois milhões este ano. O IBGE estima que continuará crescendo até 2062, quando começará a declinar. Vale ressaltar que a fecundidade das famílias de baixa renda é da ordem de cinco, nas de alta renda de 1,1. As conseqüências desta disparidade são fáceis de imaginar, inclusive na distribuição da renda.

A Rússia é o país onde o declínio populacional é maior em números absolutos. Em 2004, foi de 800 mil pessoas. Na Ucrânia 312 mil. Na Alemanha 143 mil, sem considerar a imigração da qual resultou ligeiro aumento da população residente. Na Itália 53 mil.

Com fecundidade inferior a 2,1 é inevitável a diminuição da população - a revolução do século 21 - compensada, em parte, por fluxos migratórios. As conseqüências previsíveis do declínio populacional são preocupantes. Nas finanças públicas, menor número de contribuintes, mais aposentados, maiores gastos com saúde. Na estrutura da produção menos crianças e jovens e mais idosos. Na política o crescente poder dos idosos; após 65 anos somos todos eleitores, mas é preciso completar 16 ou 18 anos para votar. E este será um grupo que diminuirá com o passar do tempo enquanto o dos idosos aumentará. No mercado de trabalho já está ocorrendo mudança qualitativa. Empregos de pouca remuneração não atraem muitos candidatos. Abrem-se oportunidades de trabalho para imigrantes do terceiro mundo como vem ocorrendo nos Estados Unidos e noutros países aumentando a imigração ilegal.

Como a transição demográfica leva tempo, não é instantânea, há como fazer tempestivamente os ajustes necessários nas políticas governamentais e nas empresas para enfrentar os desafios do mundo pós-industrial do século 21.

A dicotomia entre os países que completaram a transição demográfica e o terceiro mundo, África sub-Sahara, países asiáticos e da América Latina aumentará até que estes cumpram o ritual da transição, o que tomará muito tempo. Como será a convivência até lá?