Correio Brasiliense, n. 20609, 26/10/2019. Política, p. 2

Demora afeta sistema de Justiça



A demora do Supremo Tribunal Federal (STF) para concluir o julgamento sobre a constitucionalidade da prisão em segunda instância, além de aumentar as expectativas sobre o resultado, dividem especialistas quanto às repercussões que podem ter na sociedade e no sistema de Justiça. Pedro Paulo Castelo Branco Coêlho, ex-juiz federal e professor aposentado de direito penal e processo penal da Universidade de Brasília (UnB), afirmou que se sente “constrangido” com as incertezas e a demora na conclusão de um julgamento que, dependendo do resultado, poderá revogar várias prisões decretadas em todo o Judiciário.

“Eu fui juiz federal, na área criminal, atuei na época das investigações sobre o ex-presidente Fernando Collor, e confesso que me sinto constrangido e desorientado com a demora na conclusão desse julgamento”, disse Castelo Branco, que é favorável à prisão após a condenação em segunda instância. “Essa incerteza traz insegurança no ordenamento jurídico, os juízes ficam sem saber o que fazer”, disse o ex-magistrado, que leciona na Faculdade de Direito da UnB há 36 anos.

Segundo ele, a indefinição do julgamento provoca também uma crescente tensão na sociedade. “O Supremo está julgando a matéria a conta-gotas, para que a população vá se acostumando com um possível resultado contra a antecipação da execução da pena. Mas não acredito que isso funcione, porque as pessoas já têm opinião formada sobre o tema e, certamente, irão se manifestar caso o resultado não as agrade”, concluiu o ex-juiz.

Discussão

Já o advogado criminalista Thiago Turbay, coordenador adjunto do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais do Distrito Federal, disse ser importante haver a conclusão do julgamento, mas ponderou que o tema exige uma discussão bastante aprofundada. “É necessário haver uma conclusão pela Corte, o que se aproxima. Não acredito que haverá pedidos de vista com o claro intuito protelatório. Os julgamentos não devem receber pressão com intuito de tolher ou minorar os debates. O tema exige uma discussão jurídica funda. A Corte deve priorizar o julgamento técnico, se afastando de aclamações populistas e que não encontram ancoragem na racionalidade jurídica”, afirmou Turbay, que é contrário à prisão em segunda instância.

“Nesse sentido, a insegurança jurídica ocorrerá exclusivamente se houver ações visando impedir o julgamento, o que não parece que ocorrerá. Vale lembrar, o STF não serve a apelos tacanhos e violentos. Ele protege a cidadania e o povo quando cumpre a Constituição, o que lhe assegura estabilidade institucional”, acrescentou o advogado.

O julgamento no STF foi suspenso mais uma vez na quinta-feira, quando o placar estava em 4 a 3 em favor da prisão após a condenação em segunda instância. O Julgamento deve prosseguir no dia 6 ou 7 novembro, segundo o presidente Dias Toffoli. Ainda falam as manifestações de quatro ministros.

A eventual mudança na atual jurisprudência do STF — caso o tribunal decida contra a prisão após condenação em segunda instância — poderia beneficiar quase 5 mil presos, segundo levantamento do Conselho Nacional de Justiça. (JV)