Título: Terrorista culpa Vaticano por ataque
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 01/04/2005, Internacional, p. A9
Em entrevista a jornal italiano, autor de atentado de 1981 afirma que contou com a ajuda de sacerdotes e cardeais
ROMA - O turco Mehmet Ali Agca, autor do atentado contra o papa João Paulo II em 13 de maio de 1981, sustenta que a Santa Sé foi responsável por sua decisão de tentar assassinar o pontífice, embora assegure que organizou e cometeu o ataque sozinho. Em uma entrevista ao jornal italiano La Repubblica, Agca insiste, de dentro da prisão turca de Kartel Maltepe (Istambul), que ''o diabo está dentro do Vaticano''.
- Sem a ajuda de sacerdotes e cardeais não poderia realizar aquele gesto - disse, referindo-se aos dois disparos que estiveram a ponto de matar Karol Wojtyla na praça de São Pedro.
O terrorista turco, que já deu várias versões contraditórias do ocorrido, lembra os momentos que antecederam os tiros:
- Tinha renunciado a disparar e estava decidido a ir à estação para voltar a Zurique (...) e viver em paz. Mas naquele momento aconteceu um milagre, improvisadamente voltei atrás e atirei.
Depois de insistir que tudo ''foi decidido por Deus santíssimo'', Agca denuncia que em torno do ocorrido existe uma ''desinformação sistemática''.
Ele admite ter mentido em várias ocasiões, ''com minhas distintas versões, contraditórias sob o ponto de vista jurídico e político'', mas alega que ''era muito difícil atuar de outra maneira em um ambiente e circunstâncias particulares, em uma situação na qual os serviços secretos de meio mundo se intrometeram''.
Em entrevista à rádio do Vaticano, o cardeal Roberto Tucci, que cuidava da organização das viagens do pontífice à época, negou todas as acusações.
- Agca sempre preferiu despistar a contar o fato verídico. Temos que suspeitar do que ele diz - desdenhou. - Ele é um assassino profissional.
Mas para deixar registrada sua versão, o autor do ataque contra o papa prepara um livro, do que já tem cerca de 150 páginas. A finalização está prevista para daqui a dois meses e Agca promete relatar ''a verdade''.
A entrevista com o turco foi publicada após a reabertura das investigações sobre a chamada ''pista búlgara'' do atentado, surgida em 1982 a partir de outras declarações do próprio terrorista, que ligava o ataque aos serviços secretos da Bulgária, da ex-União Soviética (KGB), à máfia turca e aos terroristas dos Lobos Cinzentos, a organização à qual pertencia.
O governo búlgaro anunciou na quarta-feira que uma série de documentos procedentes dos arquivos da Stasi - os serviços secretos da antiga Alemanha Oriental - nos quais haveria informação relativa ao atentado serão postos à disposição de uma comissão parlamentar italiana de investigação.
Mas tanto representantes da Stasi quanto da ex-URSS negaram qualquer envolvimento de seus países em um plano para matar Wojtyla.
''Dos documentos revisados até agora, não apareceu qualquer elemento que montre a relação da Stasi, dos serviços secretos búlgaros e da KGB com o atentado em 1981'', reagiu ontem o responsável pelo arquivo da Stasi, Christian Booss.
O presidente russo, Vladimir Putin, também duvidou da existência de documentos autênticos da Stasi que comprovem que o extinto serviço secreto soviético conduziu o episódio. Por anos, Putin trabalhou para a KGB na Alemanha.