Correio Braziliense, n. 20600, 17/10/2019. Política, p. 4

Temperatura sobre dentro do PSL

AugustoFernandes
Ingrid Soares
Jorge Vasconcellos


O clima está cada vez mais quente no PSL, apesar das tentativas de alguns parlamentares, e do próprio presidente Jair Bolsonaro, de minimizar as divisões e confrontos. Depois de jogar álcool na fogueira, ao admitir que o partido utilizou candidaturas laranjas nas eleições de 2018, ontem a deputada Soraya Manato (PSL-ES) voltou atrás ao constatar a repercussão do discurso feito no plenário da Câmara na terça-feira, ao perceber que o vídeo com sua fala viralizou.

Em entrevista ao Correio, ela disse não ter provas da prática ilegal e que se baseou em notícias da imprensa para fazer as declarações. Segundo a parlamentar, o noticiário dá conta de que pelo menos 17 legendas estão na mira do Ministério Público por indícios do uso da cota de candidaturas femininas, de 30%, para fraudar as eleições.

“Ninguém aqui é Santo”, havia dito na terça, conforme vídeo gravado pelo jornalista George Marques.  A gravação também registra o momento em que a deputada acusou outras legendas de terem usado candidatos fantasmas. “Isso aí eu peguei de coisas divulgadas pela imprensa. Foi isso que eu peguei. Então, é isso que eu tinha para falar. Não tenho mais nada para falar”, recuou.

“Eu tenho que responder por mim. Tenho que responder pelo meu estado. É difícil. Como alguém vai controlar o estado, o Brasil todo? É muito complicado isso. Não é o PSL. Todos os partidos pregam a bandeira da transparência, da honestidade, mas, às vezes, têm determinadas coisas que devem fugir ao controle do partido. Numa empresa, num hospital e tudo mais. Quantas coisas que fogem do controle?”, disse ao Correio.

Na terça-feira, de posse de uma lista com 17 partidos, ela citou cada um e o respectivo percentual de possíveis candidaturas laranjas: PROS (40%); PSC (37,5%); Podemos (35,5%); PTB (34,8%); PCdoB (31,1%); PR (28,5%); PRB (22,7%); DEM (22,4%); PDT (16,8%); Solidariedade (16,6%); PSL (15,9%); PPS (15,7%); PSDB (15,6%); MDB (14,6%)); PT (11%); PP (10,5%); Novo (2%).

Transparência

Enquanto isso, no Planalto, o presidente Bolsonaro continua sem declarar de forma oficial a sua intenção de se desfiliar da legenda e afirmou que, por enquanto, “está tudo em paz” e que não “quer tomar partido”, mas cobrou transparência do PSL. “Ah, o presidente falou em transparência. Eu falei, sim, em transparência. Então, vamos mostrar as contas e não ficar, como a gente vê notícias por aí, expulsa de lá, tira da comissão, vai retaliar”, ponderou. “Não defendo nada, não quero saber de nada. Eu só quero transparência”, reforçou Bolsonaro.

O partido dá sinais de abalo e a situação se torna insustentável a cada dia, com ataques públicos entre os parlamentares que apoiam Bolsonaro e os que discordam do presidente. “Chega um momento em que não dá para ficar aguentando aborrecimentos infantis. Não temos família imperial no Brasil, não temos dinastia”, afirmou o senador Major Olímpio (PSL-SP), líder do PSL na Casa.

“Não foi a direção do partido e nenhum de nós quem desencadeou essa crise. Que se responsabilize ou responsáveis que deram causa.  Nós tivemos pessoas de dentro do partido que insuflaram até o presidente com informações que não são procedentes sobre o dia a dia do partido causando um tremendo de um mal-estar”, criticou Major Olímpio.

Segundo ele, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) estariam entre os culpados. “Nós votamos no presidente e comportamentos principescos aí, achando que pode tudo, quem quiser que suporte, eu não. É preciso haver um pouco de resignação. Todo mundo voltar atrás um pouquinho”, disse.

Integrante da ala que defende os interesses do PSL, o deputado federal Coronel Tadeu (PSL-SP) atacou os correligionários que pensam em se desligar do partido. “Eles querem sair, mas querem levar o fundo partidário, o dinheirinho para a campanha, o mandato”, afirmou. “É um despreparo completo. Eles não podem sair nessas condições que eles querem. A lei é clara: ou espera uma janela partidária ou espera fusão de um partido com outro, ou seria expulso e brigaria na Justiça”, criticou, em entrevista à Rádio Eldorado.

O deputado Francisco Francischini (PSL-PR), presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, também tentou minimizar a fervura do partido. “Eu acredito que essas brigas de partido são um amadurecimento. Todos os partidos constituídos no Brasil já passaram por esse amadurecimento, e o PSL, por ser uma bancada nova, que está no primeiro ano de sua primeira legislatura, ainda vai ter, com certeza, um pouco de bate cabeça. É algo normal, que ainda dá para superar, por meio do diálogo”, disse o presidente da CCJ.