Título: Rumos
Autor: Olivia Hirsch
Fonte: Jornal do Brasil, 05/04/2005, Internacional, p. A12

Direção que Igreja vai tomar com eleição de novo papa gera expectativas

O processo de escolha do novo papa só vai terminar com a realização do conclave, realizado entre 15 e 20 dias depois da morte de João Paulo II, quando ocorre a votação em si. Enquanto isso, cardeais participam de várias reuniões nas quais discutem os rumos da Igreja Católica. Fora do Vaticano, a questão gera expectativas. Para o sociólogo Ivo Lesbaupin, do Iser Assessoria, centro de pesquisa em religião, o debate sobre o futuro da Igreja deve levar a um pontificado menos marcado pela centralização. Segundo ele, durante o papado de João Paulo II houve uma preocupação ¿excessiva¿ com a desintegração e a dispersão da religião, o que gerou uma busca pelo reforço da identidade católica.

¿ Esse esforço centralizador provocou um fechamento em relação à discussão de novas idéias, principalmente no campo da moral. Foi um período muito duro e bastante sentido pelas igrejas em todo o mundo ¿ afirma, por telefone, ao JB. ¿ A tendência é que se volte a um sistema no qual as conferências episcopais tenham mais autonomia e liberdade.

Lesbaupin conta que antes do polonês Karol Wojtyla havia uma tendência de abertura e aceitação do mundo moderno, que acabou sendo rompida em seu papado. Ele cita como exemplo um documento crítico à produção bélica mundial, redigido pela conferência episcopal dos EUA, que foi proibido pelo Vaticano de ser publicado.

¿ Entre os documentos produzidos nos últimos 20 anos, nota-se a necessidade de citar o papa para fundamentar idéias que possam ser consideradas um pouco mais inovadoras. Com isso, buscava-se evitar que os papéis fossem vetados ¿ explica. ¿ Há casos em que frases de João Paulo II foram mais citadas até do que trechos da própria Bíblia.

A Igreja Católica também deve se direcionar mais às questões ambientais e às que concernem aos países de terceiro-mundo, como a pobreza e o desemprego, afirma. O papado de João Paulo II foi muito marcado pela resistência ao socialismo, questão latente em 1979, quando eleito.

¿ Hoje em dia este já não é mais um dado relevante, ao passo que a desigualdade social e a degradação ambiental cresceram de maneira fortíssima. Quem quer que seja o novo papa, não poderá deixar de lado estes temas, que estão de certa forma associados ¿ opina o pesquisador.

Menos seguro para fazer previsões até que o novo pontífice seja eleito ¿ por ser a ¿Igreja a única e última monarquia do Ocidente¿ ¿, o teólogo Frei Betto acredita que o fato de os cardeais com mais de 80 anos não terem mais direito ao voto ¿ alteração que se confirmou no último papado ¿ serve de ¿alento¿.

¿ Esses cardeais costumam ser mais conservadores ¿ explica. ¿ Mas só participam da reunião prévia ao conclave, não são eleitores.

Na opinião de Frei Betto, seria um ¿grande retrocesso¿ escolher um novo pontífice ¿mais conservador¿ do que João Paulo II. Segundo o teólogo, graves desafios foram evitados pelo último papa, como a questão da moral sexual, do celibato facultativo, do diálogo inter-religioso com o mundo africano e islâmico, do papel da mulher, da bioética, entre outros.

¿ Já passou do tempo para que esses assuntos sejam discutidos. Só espero que o Espírito Santo ilumine os cardeais na hora da votação.