Correio Braziliense, n. 20594, 11/10/2019. Brasil, p. 5

DNA venezuelano

Thaís Moura


Pesquisadores do Instituto de Geociências da Universidade Federal da Bahia (UFBA) analisaram o óleo derramado recentemente em diversas praias nordestinas, e chegaram à conclusão de que a substância tem origem em uma bacia petrolífera da Venezuela. Um dia depois de o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, afirmar que os vazamentos "provavelmente" vinham do país vizinho, a diretora do Instituto, Olívia Oliveira, confirmou a "extrema similaridade" entre a substância que contamina o litoral brasileiro e a produzida lá. O governo venezuelano, em nota, negou relação com a matéria.

Segundo a pesquisadora, nove das 27 amostras coletadas nos litorais da Bahia e de Sergipe foram analisadas pelas universidades federais dos dois estados e pela Universidade Estadual de Feira de Santana (BA). Foi feita a separação física e a desidratação do material, e injetada num equipamento que fornece uma espécie de "impressão digital".

Porém, a professora salientou que, apesar de uma possível origem venezuelana, não é possível apontar responsáveis pela contaminação das praias brasileiras.

"Quando falamos de Venezuela, temos que separar a questão geográfica do país em si. Esse óleo que analisamos apresentou extrema similaridade com um óleo que é produzido, formado e originado na bacia da Venezuela. Porém, pode ter sido qualquer um que contaminou, que comprou o óleo e carregou até aqui".

Após avaliar as amostras, os pesquisadores compararam os resultados com as análises de petróleo disponíveis na literatura e no banco de óleos já cadastrados. As pesquisas também não afastam a hipótese de o material se tratar de combustível de navio.

 

Ação “criminosa”

Já o presidente Jair Bolsonaro disse, também ontem, ter "quase certeza" de que o derramamento de óleo é criminoso. A suspeita foi lançada no Fórum de Investimentos Brasil 2019, em São Paulo, do qual participou.

O Ministério do Meio Ambiente também confirmou, em nota, que a indicação de origem venezuelana do petróleo se baseia em "análise técnica laboratorial da Petrobras". A pasta enfatizou que a hipótese considerada no momento é de que o óleo teria sido derramado "a partir de navios que trafegaram ao longo da costa brasileira, e não necessariamente de campos do governo ditatorial venezuelano".

O governo da Venezuela, por sua vez, negou qualquer relação com o óleo. Em comunicado, a estatal Petróleos de Venezuela S.A. (PDVSA) rechaçou "categoricamente" as suspeitas "infundadas".

"Não existe evidência alguma de derrame de óleo cru dos campos petroleiros da Venezuela que pudessem haver gerado danos no ecossistema marinho do país vizinho", afirma a nota. A estatal acrescentou que não recebeu relatos de clientes ou filiais sobre uma possível desagregação ou derrame nas proximidades da costa brasileira.

Independentemente de qual seja a origem do óleo, o professor do Departamento de Engenharia Florestal da UnB, Humberto Angelo, vê o incidente como uma "tragédia ambiental". Ele esclarece que, além de ter um impacto significativo na fauna aquática e na microfauna, o derramamento também gera um custo social.

“É preciso pagar para retirar esse óleo. Os municípios e praias afetados vão sofrer um impacto imenso no turismo", lamentou Angelo.

 

*Estagiária sob supervisão de Fabio Grecchi