Título: Ritual
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Fonte: Jornal do Brasil, 06/04/2005, Internacional, p. A8

Corpo ficará no local onde estava João XXIII. Conclave terá fumaça e sinos

AFP O Santo Padre será enterrado em três caixões, com o rosto coberto por um véu de seda branco

CIDADE DO VATICANO - Os papas podem ser mortais, mas não são meros mortais. O funeral e o enterro de João Paulo II, na sexta-feira, seguirão um ritual elaborado envolvendo três caixões, um dentro do outro, além de antigas tradições. O papa será enterrado sob o lugar antes ocupado pela tumba de João XXIII, na cripta embaixo da Basílica de São Pedro. João XXIII, que iniciou o Concílio Vaticano II, responsável por introduzir várias reformas importantes na Igreja, foi um dos mais amados da história moderna e ainda é conhecido como ¿o bom papa¿ pelo sorriso e pela natureza amigável. O pontífice morto em 1963 foi colocado em uma tumba de mármore no chão da cripta, conhecida como as Grutas do Vaticano. O corpo foi removido em 2001 para uma capela no nível do altar da basílica e o local onde estava ficou vazio. É sob essa alcova que João Paulo II será enterrado. Na quinta-feira, quando a visitação pública ao corpo do papa terminar, o pontífice, morto no final de semana, será colocado dentro de um caixão de madeira de cipreste. O secretário pessoal de João Paulo II e uma outra autoridade do Vaticano colocarão um véu de seda branca sobre o rosto dele. O papa usará suas roupas litúrgicas, estará com o rosário nas mãos e o chapéu de bispo será colocado sobre seu peito. Um pequeno saco com as medalhas comemorativas de seu pontificado e um breve resumo de sua vida, selado dentro de um tubo de chumbo, também serão depositados no caixão.

Ainda não se sabe se um pouco de terra da Polônia, país onde nasceu karol Wojtyla, será enterrado junto com ele. Uma autoridade do Vaticano, o arcebispo Piero Marini, ao responder uma pergunta sobre o assunto, disse ter havido ¿milhares¿ de pedidos para colocar objetos junto ao corpo. Uma oração especial para o repouso da alma do papa será lida antes de o primeiro caixão ser fechado. O pontífice será colocado no primeiro caixão em algum momento da quinta-feira à noite, antes do funeral da sexta-feira, cuja liturgia deve durar ao menos três horas, disse o arcebispo Piero Marini, Mestre de Cerimônias do Vaticano.

O caixão de cipreste será colocado sobre as escadas de pedra da Basílica de São Pedro durante a missa fúnebre. Depois disso, ele será levado para dentro da igreja. Ali, segundo as tradições, o caixão será colocado dentro de um segundo, de zinco, hermeticamente fechado. Este, por sua vez, ficará dentro de um caixão de carvalho. Os três serão enterrados sob uma pedra de mármore. O objetivo do uso dos materiais é retardar a decomposição do cadáver. Joaquin Navarro-Valls, porta-voz do Vaticano, disse que o corpo do papa não tinha sido embalsamado, mas ¿preparado¿ para a exposição na basílica.

Os funerais de João Paulo II também despertam a atenção dos supersticiosos. Isso por que justamente na sexta-feira haverá um eclipse solar. Os astrônomos dizem que o fenômeno, chamado ¿eclipse híbrido¿, de um tipo raro e intrigante, estava previsto há muito tempo e é um movimento simples da coreografia entre a Terra, a Lua e o Sol. Sua visibilidade será maior no sul do Pacífico e na América do Sul, já que no na hora da ocorrência será noite em Roma. Em alguns locais o Sol ficará totalmente oculto. Em outros, terá em seu entorno um halo de luz. A duração será de 3h.

A palavra eclipse vem do original grego, ekleipsis, , que significa falhar ou ser abandonado. Dois fenômenos semelhantes foram registrados na Palestina, nos anos de 29 d.C e 33 d.C. Para os cristãos, seriam a prova astronômica dos dizeres bíblicos segundo os quais o céu ficou escuro quando Jesus Cristo morreu na cruz. O próximo eclipse híbrido será no ano de 2023.