Correio Braziliense, n.20564, 11/09/2019. Política. p.4

Filho 02 provoca um turbilhão.

Rodolfo Costa

Maria Eduarda Cardim 


Declarações antidemocráticas de Carlos Bolsonaro, postadas em rede social, provocam uma enxurrada de críticas de políticos e autoridades

As declarações do vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ) sobre a transformação lenta do Brasil por vias democráticas gerou repercussão e repúdio nacional. O presidente em exercício Hamilton Mourão se posicionou. Os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), também. O comentário abriu espaço para críticas de potenciais candidatos à corrida pelo Planalto. O governador de São Paulo, João Doria (PSDB-SP), e Ciro Gomes (PDT), ex-governador do Ceará, também se manifestaram.

A declaração do filho do presidente Jair Bolsonaro foi feita na noite de segunda, no Twitter. Ao defender os feitos do governo, destacando que a gestão “vem desfazendo absurdos que nos meteram no limbo” para “nos recolocar nos eixos”, o vereador disse que, “por vias democráticas”, “a transformação que o Brasil quer não acontecerá na velocidade que almejamos”. “E se isso acontecer”, emendou.

O desabafo repercutiu mal, com interpretações de que ele estaria defendendo o retorno do regime militar. Ontem, o parlamentar se defendeu, dizendo ter dito uma obviedade, não um comentário que atente contra a democracia. “O que falei: por vias democráticas as coisas não mudam rapidamente. É um fato. Uma justificativa aos que cobram mudanças urgentes. O que jornalistas espalham: Carlos Bolsonaro defende ditadura”, criticou.

Ontem de manhã, Mourão manifestou que “(é) fundamental (a democracia), são pilares da civilização ocidental”, frisou. “Vou repetir: pacto de gerações, democracia, capitalismo e sociedade civil forte. Sem isso, a civilização ocidental não existe”, ponderou.

Presidente do Senado foi mais contundente nas críticas. “Uma manifestação ou outra em relação a esse enfraquecimento tem da minha parte o desprezo. Eu confio na democracia, acredito nas instituições e, por isso, cumpro meu papel tentando dar estabilidade a um país de 200 milhões de brasileiros, que aguardam as nossas respostas para emprego, mais saúde, mais educação”, destacou Alcolumbre.

Para Maia, o contexto empregado por Carlos “não cabe num país democrático”. “O Brasil não vai crescer 2,5%, vamos ter mais desempregados, mais fome, mais pobreza, e a conta das nossas frases, quem paga é o povo mais pobre. É por isso que a gente tem de refletir, cada um de nós, tendo alguma posição relevante ou sendo parente de alguém relevante, tem de ter muito cuidado com o que diz”, ressaltou. “A gente tem de compreender os motivos de uma redução tão drástica na nossa expectativa de crescimento neste ano. Frases como essa devem colaborar muito para a insegurança de empresários brasileiros e estrangeiros investirem no Brasil.”

No plenário da Câmara, houve diversos discursos condenando a postagem. Eduardo Bolsonaro saiu em defesa do irmão. “O que Carlos Bolsonaro falou não tem nada demais. Ele falou que as coisas na democracia demoram porque tem debate, só isso”, justificou.

Reflexão

Já o governador de São Paulo manifestou que “só com a democracia é que nós podemos ter um país soberano, livre e capaz de produzir políticas sociais e políticas econômicas”. “É só com a democracia, não há nenhum outro caminho possível para o país. E eu estarei ao lado dos democratas”, declarou. Ciro Gomes, por sua vez, adotou um tom mais firme. “Esse rapaz é um percevejo, desses que infestam a vida política brasileira, e não mereceria qualquer tipo de reflexão. O problema é que ele é um filhote do Bolsonaro, e ele só pode merecer alguma reflexão na proporção em que isso representar um pensar do Bolsonaro”, sustentou.

Do governo, o único a se posicionar favorável ao vereador foi o assessor especial da Presidência para Assuntos Internacionais, Filipe Martins. Próximo dos filhos de Bolsonaro, ele associou as gestões petistas a períodos de um ambiente político antidemocrático. Destacou que o Executivo prega o contrário. “Por isso mesmo, é preciso conscientizar a população sobre o ritmo inevitavelmente mais lento das reformas e das mudanças em um governo comprometido com a democracia liberal representativa e com os anseios populares, como o governo do nosso presidente Jair Bolsonaro. (...) Por isso mesmo, Carlos Bolsonaro está coberto de razão ao soar o alarme contra os falsificadores da realidade”, disparou.

O escritor Paulo Coelho escreveu que “mesmo sabendo que o Twitter não muda nada, simplesmente não podia se calar” diante dos recentes acontecimentos. Compartilhando matéria sobre a postagem do filho 02 de Bolsonaro, ele escreveu: “Flávio não tem coragem, Eduardo faz questão de mostrar arma para enfermeiros e Carlos assusta todo mundo”.

Frases

“Vou repetir: pacto de gerações, democracia, capitalismo e sociedade civil forte. Sem isso, a civilização ocidental não existe”

Hamilton Mourão, presidente em exercício

“O que Carlos Bolsonaro falou não tem nada demais. Ele falou que as coisas na democracia demoram porque tem debate, só isso”

Eduardo Bolsonaro, em defesa do irmão