Título: Desafio
Autor: Gregory Viscusi
Fonte: Jornal do Brasil, 07/04/2005, Internacional, p. A8

Novo papa vai herdar contas no vermelho e a obrigação de gerar receita

O sucessor de João Paulo II não terá de enfrentar apenas a queda do comparecimento nas igrejas e o envelhecimento dos sacerdotes: ele também terá de encontrar novas fontes de receita para equilibrar o orçamento do Vaticano.

Depois de registrar lucros por 8 anos seguidos, a Santa Sé, a administração central da Igreja católica, apresentou déficits no período de três anos encerrado em 2003, segundo os relatórios do Vaticano. O orçamento da Cidade do Vaticano, administrado separadamente, também ficou no vermelho em 2003, o último ano para o qual há dados disponíveis.

O papado depende dos rendimentos de aproximadamente US$ 1 bilhão investido em ações, bônus e imóveis para complementar as doações realizadas pelos católicos de todo o mundo. Embora a Santa Sé tenha tirado proveito, na década de 1990, do auge dos mercados de ações e da valorização do dólar, as perdas cambiais levaram-na a registrar um prejuízo de 9,6 milhões de euros (US$ 12,4 milhões) sobre uma receita de 204 milhões de euros em 2003.

- Os administradores do Vaticano, da mesma forma que muitas outras pessoas, ficaram acostumados a equilibrar o orçamento com os grandes lucros obtidos no mercado - disse Joseph Harris, 64 anos, contador de Seattle, nos EUA, que realizou estudos financeiros para várias dioceses americanas e escreve uma análise anual sobre as finanças do Vaticano.

A não ser que encontre novas fontes de renda, o papado terá cada vez menos dinheiro, diz Francis Butler, presidente da Foundations and Donors Interested in Catholic Activities Inc., uma associação de Washington que reúne instituições de caridade católicas laicas. A Santa Sé prevê o equilíbrio das finanças em 2005.

As igrejas católicas do mundo todo doam cerca de 80 milhões de euros por ano ao Vaticano. Pessoas físicas católicas deram 49 milhões de euros extras em 2003, quantia destinada ao Vaticano para ser utilizada em instituições de caridade, segundo o balanço anual.

- Eles não recebem muitas contribuições e não há muito que possam fazer para cortar seus gastos - diz Butler. - Essa questão só depende de quão generosos os católicos do mundo serão no futuro.

Como o Vaticano adota a política de nunca vender as obras de arte que possui, o novo papa não poderá usar os tesouros artísticos inestimáveis da Igreja para aumentar a receita.

O governo italiano impediria a exportação de qualquer obra pertencente à coleção dos Museus do Vaticano, que inclui 460 pinturas de mestres como Giotto, Caravaggio e Rafael.

Ao se tornar papa, em 1978, João Paulo II herdou uma Igreja que não divulgava qualquer resultado financeiro e estava perdendo dinheiro. Ele introduziu os balanços financeiros e encontrou novas fontes de receita. Quando os mercados financeiros caíram, os prejuízos voltaram.

A Santa Sé e a Cidade do Vaticano devem anunciar seus resultados de 2004 no próximo mês de julho.

Em 2003, a Santa Sé disse que havia transferido, recentemente, a maior parte dos ativos do portfólio do mercado de ações para os bônus de curto prazo. A administração não respondeu a uma carta enviada por fax este ano solicitando informações sobre a atual estratégia para os investimentos.

A Santa Sé inclui a Cúria Romana, cujos 20 conselhos e congregações definem a doutrina e as políticas da Igreja, os 118 corpos diplomáticos de embaixadores, a estação de rádio do Vaticano e imóveis romanos utilizados para abrigar o clero.

Em 2003, os resultados da instituição incluíram um lucro de 22,4 milhões de euros gerado pelo aluguel de imóveis e um prejuízo de 11,6 milhões de euros referente a ativos financeiros. O prejuízo com as transações de câmbio, sozinho, ficou em 32,8 milhões de euros.