Correio Braziliense, n.20579, 26/09/2019. Política. p.6

Nova derrota no pacote anticrime
Alessandra Azevedo 


Depois da derrubada de 18 vetos do presidente Jair Bolsonaro à lei de abuso de autoridade, no plenário, o Congresso impôs mais uma derrota ao governo. Por nove votos a cinco, os deputados do grupo de trabalho que avalia o pacote anticrime do ministro da Justiça, Sérgio Moro, retiraram do texto o dispositivo que aumentaria a lista de situações nas quais o juiz poderia diminuir a pena de policiais que matam em serviço.

A proposta de Moro encaminhava uma das promessas de campanha de Bolsonaro, ao ampliar o conceito de excludente de ilicitude previsto no Código Penal para permitir a redução ou até isenção da pena para agentes que matassem por “escusável medo, forte emoção ou surpresa”. Hoje, o juiz pode diminuir ou até perdoar a pena em atos cometidos “no estrito cumprimento do dever legal, em casos de legítima defesa e em estado de necessidade”.

A pressão para retirar os novos casos aumentou nos últimos dias, devido à repercussão do caso da menina Ágatha Félix, de oito anos, morta durante tiroteio da polícia com traficantes, no Rio de Janeiro, na última sexta-feira. Diante da comoção nacional sobre o caso, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), manifestou-se algumas vezes a favor de rever essa parte do projeto. “É um tema com o qual a gente precisa ter muito cuidado, se merece ou não ser modificado”, comentou, na última segunda-feira.

Entre os cinco votos contrários à ampliação do excludente de ilicitude, o líder da bancada da bala e relator do pacote anticrime, deputado Capitão Augusto (PL-SP), resistiu à mudança no texto. Até a votação, ele argumentava que a medida proposta por Moro não seria “uma licença para matar”, como afirmam analistas e parlamentares críticos da matéria. “É para quem agiu em legítima defesa, que é a vítima, que ele não seja punido pelo excesso”, defendeu.

O Código Penal já trata da legítima defesa nos casos previstos, que não foram flexibilizados na nova versão do projeto. Ontem, inclusive, o colegiado aprovou parcialmente proposta do deputado Lafayette de Andrada (Republicanos-MG) que amplia as hipóteses em que o policial pode atuar nessas situações. Os deputados trocaram a palavra “previne” por “repele” no trecho que trata como legítima defesa situações em que “agente de segurança pública repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes”.

Próximos passos

Autor da emenda aprovada para suprimir o trecho sobre o excludente de ilicitude, o deputado Marcelo Freixo (PSol-RJ) comemorou a manutenção da lei atual, mas afirmou que “a luta, agora, será no plenário da Câmara”. A avaliação por todos os deputados é a próxima fase pela qual o texto precisa passar, antes de ir ao Senado.

Nas próximas etapas, os parlamentares ainda podem mudar o texto e incluir qualquer outro dispositivo — até mesmo o que prevê a ampliação do excludente de ilicitude. O texto não precisa passar por comissões, como explicou o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). “Eu prometi ao ministro que não haveria comissão especial, para não atrasar a tramitação da proposta”, afirmou, na última terça-feira.

Na próxima semana, o grupo de trabalho que tem discutido a proposta ainda se reúne para avaliar outros pontos. Nas reuniões, que acontecem desde março, os deputados já fizeram outras mudanças no texto original, como a retirada da  prisão após condenação em segunda instância, deixando o caso para deliberação do Supremo Tribunal Federal (STF).

Votação

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse que a Casa votará na próxima semana o pacote anticrime proposto pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro. Maia ressaltou que tem dialogado com Moro sobre o projeto, que atualmente é analisado por um grupo de trabalho da Câmara. “Está na hora de dialogar. Queremos aproveitar a experiência do ministro no combate à lavagem de dinheiro, por exemplo”, disse Maia. “Vamos votar semana que vem. A gente deve ter uma última reunião; vamos tentar introduzir o Senado nesse debate”, acrescentou.